Um grupo de aproximadamente 70 Índios caingangues da reserva de Votouro acampou em frente ao prédio da Funai, em Passo Fundo, durante a sexta-feira. Eles pedem justiça pela morte do índio Vitor Hugo dos Santos Refey, de 22 anos, ocorrida em março passado, e também segurança dentro da reserva.
Os índios chegaram por volta das 2h da madrugada em Passo Fundo e se instalaram na calçada. Diversas faixas de protestos, cobrando agilidade na apuração do caso, foram fixadas na parede do prédio. Uma delas continha a seguinte inscrição "60 dias se passaram. Queremos justiça pelo assassinato de Vitor Hugo. Lutaremos até o fim".
Uma das lideranças dos indígenas, Neusa Lopes, afirma que a tensão dentro da aldeia se estabeleceu há cerca de 60 dias. Segundo ela, um grupo coordenado pelo cacique Eliseu Garcia passou a exigir a saída do índio Neri Francisco, pai do jovem assassinado. "Ele era uma pessoa trabalhadora, apenas por ciúmes começaram a perseguir ele e acabaram matando o filho", revela.
Conforme Neusa, o grupo que defende a permanência de Neri na Reserva passou a sofrer pressäes e ameças. Nos últimos dias, algumas casas foram atingidas por disparos de arma de fogo. Com medo e para evitar mais problemas, na segunda-feira eles deixaram o local. Levando apenas a roupa do corpo, acamparam ao lado do prédio do Ministério Público Federal de Erechim. "Temos uma vida lá, precisamos cuidar dela. Como as casas estão abandonadas, estão retirando nossas coisas e levando para outros lugares. Nossa briga não é pelo poder dentro da Reserva, estamos aqui para pedir segurança e a paz", observa.
Represália
Integrando o grupo de manifestantes, o índio Neri Francisco, 38 anos, acredita que as perseguições e pressões para expulsá-lo de Votouro iniciou a partir do momento em que cobrou das lideranças a prestação de contas das plantações da comunidade. "Depois disso não me deixaram mais em paz", lamenta.
Proprietário de aproximadamente 70 cabeças de gado, e de uma área de aproximadamente 12 hectares, Neri comercializa a carne dentro da própria reserva. Este ano, teve de desistir de plantar na safra da soja porque o grupo da liderança negou o empréstimo das máquinas de uso coletivo dentro da aldeia. Votouro abriga aproximadamente 340 famílias.
No dia do crime, ele contou que estava em casa, carneando uma rês, juntamente com os filhos e outros familiares. "Quando o grupo chegou, o Vitor e primos já haviam terminado o trabalho. Estavam descansando na sombra. Disseram que estavam ali para prender um sobrinho meu, o qual já estava preso. Depois de alguns momentos, receberam uma ordem, e atiraram contra os meninos. Eles tentaram correr, mas foram atingidos. Agora nós é que estamos pagando pelos criminosos", lembra.
Baleado nas costas, Vitor foi levado pelo pai ao posto médico na cidade de Benjamim Constant e, em seguida, transferido para o hospital de Erechim, onde já chegou sem vida. Outras quatro pessoas ficaram feridas. O caso está sendo investigado pela Polícia Federal de Passo Fundo. Algumas testemunhas já foram ouvidas.
Negociação
Ainda pela manhã os índios participaram de uma reunião com a coordenação regional da Funai. A patir de um acordo, eles seriam instalados provisoriamente no acampamento da antiga Ceasa, às margens da BR 285, em Passo Fundo. O grupo que vive naquela área aceitou receber os índios até‚ a próxima terça-feira.
Também foi acionada a secretaria de Cidadania e Assistência Social para providenciar alimento aos índios. Entre os 70 caingangues que participam das manifestações, pelo menos 25 deles são crianças, além de uma gestante.
Representante do grupo, o advogado Abdias Franco pretende ingressar com um pedido de reintegração de posse na Justiça Federal de Erechim, para garantir o retorno e a segurança das famílias dentro da aldeia.