Na lista tríplice encaminhada pelo colegiado eleitoral ao Ministério da Educação (MEC), no dia 27 de junho, o então diretor do campus Erechim e professor doutor em Física, Anderson Ribeiro, liderava a eleição para ocupar a cadeira da Reitoria da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) com 54,1% dos votos válidos. O Presidente da República, Jair Bolsonaro, no entanto, nomeou o terceiro colocado na lista tríplice, Marcelo Recktenvald, que tomou posse na quarta-feira (4), na sede do Ministério da Educação (MEC), em Brasília.
Em entrevista concedida ao jornal O Nacional, Ribeiro acredita que a nomeação do menos votado para a nova gestão se deu por caráter ideológico.
JORNAL O NACIONAL: Professor, como foi esse processo de aliança para a chapa ao lado da professora Lísia Regina Ferreira?
ANDERSON: Nossa aproximação, das pessoas que organizaram o coletivo UFFS PLURAL, iniciou pelas direções de alguns campi. Propus, logo em 2015, a criação de um fórum de articulação das Direções, para tratar de nosso trabalho cotidiano de gestão. Foi muito produtivo e fomos convergindo em propostas, em formas de fazer a administração e principalmente no que se considera prioritário para a gestão central da Universidade. Deste início o coletivo foi ampliando e agregando pessoas de todos os segmentos da comunidade acadêmica, culminando no anúncio público de convite para a debate "A UFFS que queremos" no dia 15 de fevereiro e lançamento do coletivo.
ON: O que vocês consideram prioritário para a gestão central da UFFS, professor?
ANDERSON: Além do compromisso com a Educação Pública e gratuita, com liberdade de cátedra, de pesquisa, de debate e que busque a plena autonomia universitária. A gestão central deve ser pautada, no nosso entendimento, em alguns princípios, que apresentamos na nossa campanha. Em suma, uma gestão democrática, participativa, que valorize as pessoas e seu capital intelectual
Que tenha como instrumento de gestão o próprio conhecimento acadêmico e seus métodos, com foco no pleno desenvolvimento das atividades fim: ensino, pesquisa e extensão.
ON: E como foi recebida a notícia da nomeação do professor Marcelo, mesmo sem ele ter chegado ao segundo turno?
ANDERSON: A comunidade recebeu com estarrecimento e perplexidade num primeiro momento, mas que logo se transformou em uma reação de defesa da autonomia e democracia universitária, pelo que a nomeação representa em termos do desrespeito arbitrário aos processos democráticos e participativos. A indicação de outro nome da lista tríplice que não o primeiro, injustificadamente, significa um projeto de gestão não aprovado pela comunidade acadêmica.
ON: Pode-se dizer, então, que essa indicação do menos votado foi ideológica?
ANDERSON: Recebemos, inicialmente, a notícia com certa surpresa, [como dito anteriormente] embora soubéssemos da possibilidade. Primeiramente, visto que recebemos contatos do MEC na quarta-feira, organizando a solenidade de posse para o dia 04/09, 17h em Brasília, mas principalmente porque o processo de consulta e de composição da lista tríplice foi um processo realizado dentro dos marcos legais, sem problemas judiciais, foi um processo democrático e participativo. Mas logo ficou claro que a indicação se deu por um suposto alinhamento ideológico entre o terceiro colocado na lista tríplice e o governo federal. Um comprometimento com pautas do governo que não são as pautas da Universidade, discutidas publicamente no processo eleitoral.
ON: O MEC contatou vocês? O que foi dito, especificamente, professor? Algo que confirmasse a nomeação da chapa?
ANDERSON: Sim, o MEC nos contatou na quarta e na quinta. Várias ligações e mesmo e-mail. Não houve confirmação explicita de nomeação, mas havia organização de preparativos protocolares.
ON: Já que estamos falando no Ministério da Educação, o professor Marcelo recebeu do ministro Abraham Weintraub o termo de posse e os estudantes organizaram uma ocupação do prédio da Reitoria. Eles ainda permanecem lá?
ANDERSON: Sim. Os estudantes em, geral, como professores e técnicos, ficaram indignados com a nomeação. Os estudantes encontraram na ocupação uma forma de protesto e mecanismo de exigir a restituição da democracia. Continuam, sim, ocupando a reitoria, em tentativas, até onde sei, de diálogo com o prof. Marcelo.
ON: Entre as pautas discutidas nessa mobilização de acadêmicos e docentes, existe a possibilidade de sugerir a destituição do novo reitor?
ANDERSON: Existe a previsão estatutária de destituição, que deve ser feita pelos conselheiros do Consuni [Conselho Universitário]. Mas, não sei se isso está em pauta. A pauta me parece superior, do próprio processo de nomeação.
ON: Nesse cenário de manifestações e repúdios, o que se pode esperar para o futuro da educação e da própria UFFS?
ANDERSON: O cenário nacional é muito preocupante. Tivemos muitos cortes esse ano, tanto na educação quanto no financiamento da ciência e tecnologia. A proposta orçamentária do próximo ano, encaminhada ao Congresso Nacional, apresenta uma forte diminuição das verbas de Assistência Estudantil e de custeio de nossas atividades. As manifestações são um alento, acendem uma esperança de defesa da educação e da ciência, que são fundamentais para o desenvolvimento do país e para o combate às desigualdades.
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