As experiências de um voluntário no Médico Sem Fronteiras

No próximo dia 15, conquista do Prêmio Nobel pela ONG completa 20 anos

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Médico psiquiatra passo-fundese, Alberto Machado Hexsel já atuou como voluntário da ONG por vários lugares no mundoMédico psiquiatra passo-fundese, Alberto Machado Hexsel já atuou como voluntário da ONG por vários lugares no mundo
Médico psiquiatra passo-fundese, Alberto Machado Hexsel já atuou como voluntário da ONG por vários lugares no mundo
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O ano de 1999, especialmente o dia 15 de outubro, representou um divisor de águas na organização humanitária internacional, Médicos Sem Fronteiras (MSF). O recebimento do Prêmio Nobel da Paz, em reconhecimento ao trabalho humanitário pioneiro em diversos continentes, simbolizou a independência da Organização em relação a Estados, Exércitos e influências econômicas. Conforme disse à imprensa na época, o presidente do Conselho Internacional da organização, o canadense James Orbinskyele. “O Nobel é um prêmio para a dignidade do homem, que nós perseguimos sem obedecer a nenhuma lei ou política".


A organização foi fundada por um grupo de médicos franceses, em dezembro de 1971, com o objetivo de tratar doentes e combater violações aos direitos humanos nos mais diversos países.


O médico psiquiatra passo-fundese, Alberto Machado Hexsel já atuou como voluntário da ONG em tantos países, que precisa de uns minutos para lembrar de todos. Afaganistão, Iraque, Ucrania, Uganda, Serra Leoa, Bangladesh foram alguns dos destinos do médico.


No ano de 1973, Alberto ingressou na faculdade de Medicina e conta que havia um ideal romântico em torno da organização. “Naquela epóca, já se falava e se conhecia o Médicos Sem Fronteiras, especialmente depois do prêmio nobel, mas naquele momento não pude participar, porque são necessários dois anos de prática médica. Assim, quando meus filhos ficaram independentes pude participar pela primeira vez, no ano de 2006.”
Após um ano de intercâmbio nos Estados Unidos, o médico entende que pode interagir com outra cultura e ter uma noção maior sobre a ideia de internacionalização, o que criou nele uma vontade de desfrutar de novas experiências.


Hexsel ficou durante um ano no Ubequistão, atuando no projeto de tuberculose múltipla resistente, pois um dos remédios usados no tratamento causavam surtos psicóticos, com altos índices de suicídio nos pacientes. “Essa primeira experiência foi fantástica e radical, porque era um lugar desértico que fazia cinquenta graus no verão e em torno de menos dez graus no inverno. Ali atuei como atendente, se necessário, mas tinha a principal função de capacitar os médicos dos países. Como o projeto não é para sempre, é necessário treinar o profissional para haver uma continuidade”, diz.


Dificuldades da Organização
Maior ONG Médica do mundo, com um orçamento anual de 1,5 bilhões de dólares, oriundos de doação individuais, Hexsel explica que quando se tem um grande orçamento em saúde, começam a ser criados problemas como os governos. “Éramos os primeiros a entrar, e quase que os últimos a sair, agora os nossos projetos estão ficando muito longos e os orçamentos são muito grandes. Por exemplo, os orçamentos dos projetos do MSF na República Centro Africana são maiores que o orçamento do Ministério da Saúde dos países. Isso começa a criar certos problemas, porque quando se tem uma mega estrutura de saúde para atender refugiados em condições primárias, cria-se uma instabilidade no sistema de saúde nacional, tanto que quando estivemos no Sudão o governo nos expulsou”, explica.


Em 2008, o médico psiquiatra conta que esteve em Garfur, país localizado no Sudão, antes de sua separação. “Foi uma experiência intensa, haviam morrido 300 mil pessoas, e eu estava num dos campos de refugiados para coletar depoimentos de mulheres que haviam sido estupradas por milícias e por forças armadas. E em função dessa nossa ação, com a intuição de denunciar o presidente Bashir, na Corte de Aia, formos convidados a sair do país”.


Bem longe do silêncio
Hexsel explica que a as ações humanitárias no início equivaliam ao silêncio. “Não se podia falar nada, era apenas trabalho, mas agora somos uma organização que denuncia e fala, posição que os médicos tem mantido, é uma atitude que nós difere de todas as outras organizações. Existem porta-vozes que falam sobre os problemas dos migrantes no mediterrâneo, isso representa uma possibilidade de veicular a situação nos países. Então, ajuda huminatária não quer dizer silêncio”, enfatiza.

 

Ele também acrescenta, que de acordo com os princípios da ONG, baseados na independência, imparcialidade, transparência e ética médica, é possível haver uma neutralidade na atuação. “Somos completamente idependentes de pressões políticos, não aceitamos doações de governos e empresas, o que vai muito ao encontro dos nossos princípios”.


A MSF é uma organização atuante em casos de emergências, e nos países onde existem guerras ou terremetos. Os voluntários brasileiros, como Hexsel se reunem uma vez por ano em assembleias para discutir e votar em que países serão organizadas as próximas ações e projetos.
Atualmente, todos os anos no período de férias da Universidade de Passo Fundo, onde atua como professor, ele repassa para a organização as datas em que possui disponibilidade para viajar. “Recentemente recebi uma proposta para ir até à Libéria para preencher uma lacuna na posição de psiquiatria até que alguém chegue, mas tive que declinar por estar dando aula”, explica.

 

“Posso resumir todas minhas experiências como um misto de sentimentos. Foi gratificante e ao mesmo tempo foi intenso, estressante e díficil, mas com certeza valeu e continua valendo a pena para participar”, finaliza o voluntário do MSF.

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