Contabilizando os prejuízos no campo

Mais de 120 municípios gaúchos decretaram situação de emergência pela estiagem. A falta de chuva dos últimos três meses deve refletir na economia pelos próximos dois anos

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Mais de 120 municípios gaúchos já decretaram situação de emergência por perdas econômicas causadas pela falta de chuva. A Defesa Civil do Rio Grande do Sul já homologou 52 destes decretos, e a lista deve aumentar, já que outros processos seguem em análise, e a previsão é que o índice de chuvas continue baixo para os próximos dias.

O índice pluviométrico abaixo da média histórica está causando reflexos negativos em toda a economia, mas ela fica visível, e de forma mais imediata no meio rural, pois é a primeira fase da cadeia econômica de muitos municípios gaúchos.

Segundo dados da Emater, algumas regiões do Rio Grande do Sul estão registrando chuvas abaixo do necessário desde o final do ano passado, e o período de estiagem prolongado faz os produtores rurais acumularem perdas. Entre a última semana de fevereiro e a primeira semana de março, a entidade recebeu solicitação para realização de 221 perícias do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro) para a cultura da soja. Esta perícia garante a exoneração de obrigações financeiras relativas a operação de crédito rural de custeio, cuja liquidação seja dificultada pela ocorrência de fenômenos naturais, pragas e doenças que atinjam rebanhos e plantações.


Coxilha

Coxilha é um dos municípios da região norte do Rio Grande do Sul que teve sua situação de emergência homologada pela Defesa Civil. Segundo o prefeito Ildo José Orth, o município, essencialmente agrícola, deverá sofrer os reflexos desta estiagem pelos próximos dois anos. “A quebra na safra afeta inicialmente a arrecadação de ICMS, porém, há um problema que muitos investimentos dentro município são feitos pelos produtores rurais, que compram carros, terrenos ou constroem casas, por exemplo. Esses investimentos não vão deixar de acontecer pelos próximos dois anos, pois as lavouras não deram o lucro que era esperado”, comentou ele.


O prefeito disse ainda que os investimentos da prefeitura, como as obras nas estradas, ficaram limitados, já que os recursos foram canalizados para abastecer com água as propriedades rurais. As perdas registradas nas lavouras de soja do município variam entre 30% e 40%. Na lavoura de milho a produtividade, que em outros anos chegou a 180 sacas por hectare, nesta safra deve ser de 80. Entre as localidades mais afetadas estão Rincão das Quinas e Arroio Miranda. “As localidades formadas por pequenos agricultores sofrem mais, pois as chuvas acontecem de forma esparsa, assim, uma grande propriedade recebe chuvas com diferentes índices pluviométricos e uma parte lavoura que recebeu mais chuva, compensa a outra parte que choveu menos. Mas as pequenas propriedades que não recebem chuva, a perda é total”, explicou o prefeito.

A realidade é a mesma para pequenos agricultores de outros municípios da região. É o caso de Clauzir Rodrigues, que tem 47 anos e mora em uma propriedade rural de 2,7 hectares com sua esposa e os três filhos, de 3, 6 e 9 anos. Ele se dedica a produção de hortaliças e comenta que na sua propriedade, localizada no interior de Centenário, norte do Rio Grande do Sul, não chove forte desde o mês de dezembro.

“Houve apenas uma chuva forte, há aproximadamente 10 dias. Hoje está acontecendo um racionamento nas propriedades, para que a água do consumo humano seja suficiente para atender todas as propriedades da comunidade”, disse ele. A prefeitura de Centenário abastece essa região do município por meio de um caminhão-pipa, enchendo os reservatórios coletivos com água potável, que chega até as propriedades rurais pelo sistema de canalização.

Reflexo na produção

O produtor rural disse que a estiagem faz com que a produtividade das hortaliças caia, mas também há o problema da qualidade que fica comprometida. Com isso, o consumidor paga um preço menor pelo produto. Entretanto, há um fator fundamental que inviabiliza a produção em períodos de estiagem: o aumento do custo da produção causado pelo preço do combustível utilizado para o funcionamento das bombas de água, além da necessidade de mais mão de obra, utilizada para montar e desmontar os sistemas de irrigação. “O preço da hortaliça fica até 50% menor, e custo de produção fica mais elevado, hoje estamos torcendo para chover e conseguir recuperar o dinheiro que investimos, mas se seguir essa estiagem certamente teremos prejuízo”, disse ele.

O produtor destacou que é bastante normal períodos de estiagem na região onde se localiza sua propriedade. Segundo ele, todos os anos há um período sem chuvas, que geralmente acontece entre os meses de novembro e março. Porém, enfatizou que situações com mais de 90 dias sem chuvas fortes são bastante raras. “Lembro de uma estiagem semelhante a essa que aconteceu entre os anos de 2004 e 2005, de lá pra cá, sempre aconteceram chuvas em um volume suficiente para ter uma lucratividade na roça”, finalizou. 

Durante as últimas semanas não choveu em praticamente todo território gaúcho. Apenas em algumas localidades do Planalto, Serra do Nordeste e do Litoral Norte foram registradas chuvas fracas com valores entre dois e dez milímetros, e que superaram os 20 milímetros na região de Canela e Gramado. A previsão da Emater é que a baixa quantidade de chuvas permaneça, e com isso a produção agrícola fique abaixo do que estava sendo previsto pelos produtores rurais. Avaliando a média de todas as regiões do Rio Grande do Sul, o milho em grão deve ter uma produtividade 22,3% menor; o milho para silagem 20% menor, e o soja 16,4% menor.

Cadeia Leiteira

O prefeito de Coxilha ainda faz o alerta de que esta estiagem vai afetar diretamente a cadeia leiteira, já que a silagem que está sendo feita neste momento para alimentar os bovinos no futuro está com uma qualidade bastante baixa. “Os produtores optaram em colher o milho para fazer silagem com antecedência, e com isso o alimento estocado não tem a qualidade ideal, assim, os produtores deverão adquirir algum complemento para a alimentação do gado, e isso certamente afetará o custo de produção”, finalizou Ildo José Orth.

A Defesa Civil Estadual distribuiu reservatórios móveis para as comunidades mais afetadas com a falta de chuva. No total, 26 cidades já foram beneficiadas com o empréstimo 36 unidades de viniliq pipa, que são reservatórios de água móvel com capacidade de 4,5 mil litros cada. A entidade ainda informou que está monitorando os índices de chuvas e que nos últimos dias houve melhoras em áreas localizadas, mas não alteraram a situação de estiagem no Estado.

Confira a relação dos municípios que tem seu decreto de emergência homologado pela Defesa Civil:

Agudo
Arroio do Tigre
Barra do Rio Azul
Cachoeira do Sul
Camaquã
Camargo
Candelária
Canguçu
Cerro Branco
Chuvisca
Coxilha
Cristal
Dom Feliciano
Doutor Ricardo
Estrela Velha
Faxinal do Soturno
Guabiju
Herveiras
Ibarama
Itatiba do Sul
Jari
Júlio de Castilhos
Lagoa Bonita do Sul
Lagoão
Manoel Viana
Montauri
Nova Palma
Novo Cabrais
Paraíso do Sul
Passa Sete
Passo do Sobrado
Pinhal Grande
Ponte Preta
Restinga Seca
Rio Pardo
Salto do Jacuí
Santa Cruz do Sul
Santa Margarida do Sul
Santa Maria
São Domingos do Sul
São Gabriel
São Lourenço do Sul
São Martinho da Serra
São Pedro do Sul
Segredo
Sinimbu
Sobradinho
Soledade
Toropi
Tunas
Vanini
Venâncio Aires

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