Mudanças na economia e no mercado de trabalho fizeram com que milhares de pessoas se reinventassem, seja para ter uma renda extra, ou para desenvolver novas habilidades buscando uma nova profissão. Iniciar um novo negócio, empreendendo e enfrentando desafios foi o caminho seguido por muitas pessoas no Brasil, e isso também se refletiu em Passo Fundo.
Segundo um levantamento feito pela Agência Brasil, o ano de 2020 apresentou um crescimento superior a 14% no número de Micro Empreendedores Individuais (MEI). Seja por vocação, realização de um sonho, ou por necessidade de complementação de uma renda, os brasileiros aproveitaram o momento de pandemia para se reinventar e se redescobrir profissionalmente. Um levantamento do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), mostra que 25% da população adulta está envolvida na abertura de um novo negócio com até 3,5 anos de atividade.
Mesmo com um contexto econômico adverso para alguns ramos de atividades, os empreendedores estão buscando inovação, e muitas das novas empresas têm nas plataformas digitais o foco dos seus negócios.
Duas razões para empreender
Analista de desenvolvimento territorial do Sebrae em Passo Fundo, Patric Strapasson, destaca que, em uma análise geral, as pessoas empreendem por duas razões. A primeira delas é a oportunidade, e a segunda é por necessidade. “Geralmente quem empreende por oportunidade busca muita informação e faz muita pesquisa. Isso vai deixá-lo mais preparado, e desta forma, as chances do seu negócio prosperar serão maiores. Por outro lado, há pessoas que vão empreender por necessidade. Elas vão tatear o mercado, que vai filtrá-las. As pessoas mais afoitas, muitas vezes, podem encontrar algum entrave no desenvolvimento do seu negócio”, explica ele.
Para Patric, em momentos de crise, onde há demissões, percebe-se uma gama de pessoas que vão buscar alternativas por meio do empreendedorismo. E dentro deste universo, há aquelas que já estavam pensando em empreender, e acabam aproveitando a oportunidade. Por isso, nestes momentos percebe-se um aumento no número de empreendedores, mas nem todos estão preparados para gerir um negócio. Para ele é perceptível que muitas pessoas sabem fazer um produto, mas não tem a expertise para fazer a gestão do negócio, resultando em uma parcela grande de empreendedores que não conseguem se manter.
Patric destaca que uma peculiaridade da crise gerada na pandemia, é que as pessoas passaram a trabalhar em home office, e perceberam que gerindo bem o tempo, é possível manter a produção como empregados e, paralelamente, conseguem iniciar uma segunda atividade para a chamada renda extra.
“Há muitos exemplos de pessoas que passaram a produzir máscaras neste período. Ou ainda, mães de família que começaram a vender viandas no último ano”, lembra ele. Muitas vezes elas não colocam neste trabalho uma fonte principal de renda, apenas um complemento, durante a pandemia, retornando às atividades anteriores quando essa situação passar.
Juventude e empreendedorismo
A jovem estudante de Educação Física, Mariana Barreto da Silva Santos, de 22 anos, buscava espaço no mercado de trabalho fazendo estágios dentro da área em que sonha atuar. Tudo se encaminhava para uma situação estável, até que chegou a pandemia para mudar seus planos.
Com a proliferação da Covid-19 no país, as academias e escolas precisaram interromper suas atividades, e não foi mais possível seguir seu estágio. Como o estagiário não tem as mesmas garantias de um trabalhador com carteira assinada, ela precisou encontrar uma alternativa rápida para não ficar sem dinheiro.
“Como estávamos em meio à pandemia, eu não tive outros locais para conseguir estágio, eu mandei alguns currículos, mas não tive sucesso. Foi aí que eu decidi fazer doces, pois as contas estavam vindo e eu não tinha fonte de renda”, conta.
Foi neste momento que Mariana colocou em prática algo que ela já fazia na faculdade. Sempre que havia uma atividade diferente, como semana acadêmica, palestras, ou aulas fora de horários, os professores encomendavam um bolo ou um doce, que ela fazia e levava para os colegas. E a aposta foi tentar capitalizar este seu talento com a “MB Confeitaria Artesanal”. Ela juntou as economias e pediu ajuda para a mãe e avó no desenvolvimento dos seus produtos, e começou a fazer doces para vender pelas redes sociais. O início das atividades foi algumas semanas antes da Páscoa de 2020.
O primeiro passo foi criar uma página no Instagram, em seguida ela começou a vender trufas. Já na sequência, iniciou a produção dos ovos de colher, pois a aposta era começar a receber encomendas para a Páscoa. O negócio emplacou e em poucos dias ela vendeu 70 ovos de Páscoa.
Mariana seguiu vendendo bolos, barras recheadas e outros produtos por aproximadamente cinco meses, foi quando apareceu outra oportunidade para um estágio. Mesmo se voltando novamente para a área da educação física, ela não deixou de lado seu empreendimento, pois no Natal, e em outras datas especiais as vendas. Agora ela se prepara para a Páscoa de 2021, onde espera receber muitas encomendas. “Foi um grande desafio, pois estava em uma área de conforto, que era dar aulas, e ir para outra área, empreendendo sem ter feito nenhum curso de culinária, além do conhecimento que eu aprendi em casa, foi arriscado. Mas conheci um lado meu que não conhecia”, diz ela.
Mais tempo com a família
A jornalista Silvânia Lemos sempre foi apaixonada pela sua profissão. Até 2020 ela dedicava seu talento para atuar na área de eventos e hotelaria, mas assim como milhares de pessoas, a pandemia pegou ela de surpresa. Casada, e com um filho de apenas dois anos, ela passou a dividir o tempo entre o trabalho e a família. No momento em que a escolinha do filho fechou, ela largou o emprego para cuidar do pequeno.
“É mágico e especial estar vivendo momentos de descobertas ao lado do meu filho, ser dona de casa e mãe ao mesmo tempo é mais cansativo do que sair todos os dias para trabalhar fora, pois, as tarefas duram 24h, mas como tudo é feito com muito amor e fé, o cansaço vai embora deixando somente apreciarmos as coisas boas e especiais que acontecem no dia-a-dia”, diz ela.
Passando mais tempo em casa, ela começou a pensar como poderia fazer para ter uma renda extra para ajudar nas despesas. “Com apoio da família e de um amigo, o qual sou muito grata pelas dicas, surgiu a “La Travessa Feito com Amor”. Silvânia criou uma página no Instagram e passou a vender palhas italianas artesanais, que ela mesmo produz. Logo, ampliou sua linha produtos com travessas de frios.
Ao trabalhar sob encomenda, ela consegue se programar para dar a atenção necessária para a sua empresa, sem comprometer a qualidade de tempo com sua família. Silvânia ainda aguarda o retorno seguro das atividades do seu filho na escolinha, para poder retornar a trabalhar na área da comunicação. Entretanto, para ela, a difícil decisão de deixar o seu emprego para ficar com seu filho fez com que ela abrisse uma nova oportunidade para se conhecer um pouco mais. “Se a gente escutar as pessoas, se a gente atender as pessoas, se a gente fazer algo para alguém como se fosse feito para a gente mesmo, ou para as pessoas que amamos, sempre teremos um saldo positivo na equipe e na vida”, disse ela.
Empreender pelas redes sociais é o melhor caminho
O empresário Ricardo Cattani trabalha com consultoria de vendas, tendo como um de seus principais focos os pequenos empreendedores. Ele analisa que a melhor forma de começar a empreender é dar atenção às redes sociais. “Qualquer pessoa que trabalha em um local público cria uma rede de contatos, e a melhor forma de empreender é atender as necessidades destas pessoas mais próximas”, diz ele. Cattani destaca que os clientes compram mais das pessoas que elas gostam e confiam, então os primeiros clientes dos novos empreendedores precisam ser pessoas com uma maior proximidade.
Ele enfatiza que a pandemia impulsionou os negócios feitos pelas redes sociais, por isso, o empreendedor precisa estudar estratégias para vender pela internet. Assuntos como métrica e engajamento são essenciais para quem busca vender por esses canais. Quem vende pela internet, precisa saber que um produto que é colocado em uma rede social atinge, em média, apenas 2% dos seguidores. E por isso é preciso ir além, e fazer algo a mais do que uma simples postagem dos produtos. “Eu aconselho fazer campanhas promocionais como aquelas de compre 1 e leve 2, ou para marcar amigos e ganhar descontos, pois isso aumenta o envolvimento orgânico. Saber usar as hashtags também é importante, pois colocar somente o seu produto não é o suficiente, é preciso usar como uma hashtags como a cidade que você atua, ou o seu bairro, pois isso vai te direcionar aos seus clientes”, explicou.
Ricardo comenta a importância de o empreendedor entender que o que ele fazia antes, não é mais suficiente. Agora ele precisa se reinventar. “Entenda o público que você quer atingir, é fácil vender para os amigos mais próximos, mas há pessoas que são apenas conhecidas, e você vai precisar convencê-las a comprar seus produtos. Além disso, há pessoas totalmente desconhecidas e o empreendedor vai precisar de uma boa estratégia de publicidade e marketing”. O consultor esclarece que uma boa estratégia é aprender a impulsionar corretamente nas redes sociais, pois com um valor pequeno, como R$ 10,00 ou R$ 15,00, é possível conquistar novos clientes.
Para o consultor, começar a estudar técnicas de vendas podem impulsionar qualquer negócio. “Por exemplo, você pode ter um bolo mais simples, e outro com uma cobertura especial, e cobrar dois preços diferentes por eles, desta forma o empreendedor pode vender para dois públicos diferentes”, finalizou.