Você já pensou em uma cidade sem notícias? Um município inteiro sem quem acompanhe as ações da Prefeitura, as decisões da Câmara de Vereadores e as demandas da população? Essa é a realidade de 58,9% dos municípios brasileiros, considerados Desertos de Notícia pelo levantamento Atlas da Notícia.
O cenário descrito mostra a importância de veículos de notícias locais, que acompanhem o cotidiano das cidades e regiões, mesmo fora das capitais e grandes centros urbanos. “O jornalismo impresso local é uma das principais fontes de informação da sociedade e responde às necessidades mais diretas dos cidadãos: saber o que se passa na prefeitura e nas secretarias, na câmara de vereadores, informações sobre contas públicas, educação, saúde, segurança e mobilidade. São os temas mais caros à sociedade”, explica a coordenadora do curso de Jornalismo da Universidade de Passo Fundo, Maria Joana Chaise. Esse jornalismo é chamado de hiperlocal, que além de prestar informações sobre serviços e repercutir problemas locais, ainda cobra os entes públicos.
Em um cenário de notícias falsas e desinformação, ela considera que esse jornalismo é ainda mais importante. “Enquanto o conteúdo de desinformação que circula em nível nacional é muito mais difícil de ser conferido pelas pessoas, as informações da sua cidade, do seu bairro, que repercutem nos veículos locais, geram mais sensação de credibilidade, proporcionam mais segurança aos leitores”, ressalta Maria Joana.
Impresso
Com o passar dos anos e com novas tecnologias, o jornalismo impresso segue presente. A edição deste ano do Atlas da Notícia mostra que 24,7% dos veículos mapeados são jornais impressos. Além disso, o segmento se reposicionou nos últimos anos, conforme avalia a professora. “Agora ele promove uma interpretação dos assuntos que proporciona uma compreensão mais elaborada dos fatos e acontecimentos. A análise aprofundada dos fatos e subsídios para a construção de uma opinião consistente fazem com que o bom e velho impresso siga fomentando o desenvolvimento da sociedade”, analisa Maria Joana.
E mesmo em um mundo digitalizado, “há uma grande parcela da população que busca consumir informação nos impressos, o que torna o jornal impresso um nicho de mercado”, como explica a professora. No entanto, o digital segue em crescimento e muitos leitores optam por esse meio. Nesse contexto, os jornais impressos passaram a contar também com páginas online. “Uma solução encontrada por boa parte dos periódicos na reestruturação dos seus modelos de negócio”, relata Maria Joana.
Pandemia
A pandemia da Covid-19 tem repercussões globais, mas afeta o cotidiano de cada cidade de forma diferente e os veículos regionais também se voltaram para o assunto, cobrindo a doença e seus efeitos. “A pandemia apresentou, de modo geral, um retorno de credibilidade para a imprensa como um todo. Diversas pesquisas, tanto no Brasil quanto no exterior, mostraram dados de ampliação de audiência e, também, de ampliação da credibilidade do jornalismo”, relata a professora.
O espaço dedicado ao tema, a disponibilidade de conteúdos para não assinantes e a abordagem de serviços de utilidade pública estariam relacionados a esse aumento da credibilidade. “Em virtude disso a atividade foi considerada serviço essencial pelo governo federal e foi excluída das restrições de distanciamento social, quando este esteve em vigor”, lembra Maria Joana.
Sobrevivência
Uma pesquisa americana destaca o papel do jornalismo local na reinvenção do jornalismo. “O jornalismo local surge como alternativa para os dilemas atuais da profissão na medida em que está claro que o modelo de negócios dos grandes jornais metropolitanos já não é mais sustentável”, afirma o professor de jornalismo online e pesquisador em comunicação comunitária Carlos Castilho em artigo do Observatório de Imprensa. Essa reinvenção passa também pela relação com a comunidade, em um processo colaborativo de produção de notícias.