xO Ministério Público Federal (MPF) investiga se houve irregularidades no ingresso de estudantes através do sistema de cotas raciais no curso de Medicina da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), no campus de Passo Fundo.
Há duas semanas, o órgão judicial recomendou à instituição universitária a criação de uma comissão permanente para compilar todas as denúncias recebidas sobre eventuais burlas aos critérios de seleção estabelecidos pela portaria normativa do Ministério da Educação (MEC). "A direção do campus Passo Fundo da UFFS deverá instruir cada caso com a documentação do aluno colhida nos arquivos internos a fim de obter a sua correta qualificação, verificação sobre se foi beneficiado com cota étnico-racial, curso em que está matriculado e ano em que iniciou os estudos, bem como o grau de evolução no curso”, menciona o documento.
A sugestão, afirma o MPF, foi apresentada após a constatação de que, desde 2017, a instituição conta com comissão de heteroidentificação, que tem a finalidade de aferir a autodeclaração de condição étnico-racial, entretanto não possui uma comissão permanente destinada à apuração de denúncias de irregularidades no preenchimento das vagas destinadas aos candidatos cotistas.
Histórico
Em junho de 2020, a universidade já foi alvo de acusação, filtradas nas redes sociais, sobre eventuais fraudes no ingresso realizado através do Sistema de Seleção Unificada (SiSU), que utiliza a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como critério para o acesso às 40 vagas abertas para a formação de novos médicos. De acordo com o edital vigente para o segundo semestre deste ano, a UFFS oferta nove modalidades de admissão. Duas delas, esclarece os anexos, são voltadas aos candidatos pretos, pardos ou indígenas de baixa renda e uma outra para os cotistas que tenham cursado o Ensino Médio na rede pública de ensino.
À época, a instituição afirmou que a comissão responsável pela homologação da matrícula pelo sistema de cotas observa as características físicas do candidato “verificadas obrigatoriamente na presença deste” para comprovar a cor da pele, textura do cabelo e traços faciais, dentre outras características observáveis, que podem ser combinadas ou não. “O candidato preto e pardo deverá possuir aspectos fenotípicos que o caracterize como negro. Antes do primeiro semestre de 2018, a UFFS somente solicitava a autodeclaração étnico-racial aos candidatos”, diz a nota de esclarecimento.
Na recomendação, o MPF lembrou, ainda, que “os editais para ingresso na universidade preveem a possibilidade de perda de direito à vaga, a qualquer tempo, se o candidato, mesmo que já matriculado, comprovadamente apresentar documento falso, fornecer informações inverídicas, utilizar quaisquer meios ilícitos ou descumprir normas neles previstas”.
O que diz a UFFS
Com 343 estudantes em situação ativa, a Universidade Federal da Fronteira Sul de Passo Fundo afirmou ao MPF ter recebido 14 denúncias sobre fraudes no ingresso pelo sistema de cotas desde 2017, onde apura potenciais irregularidades no ingresso de 13 estudantes neste ano.
No ofício, contendo 41 páginas ao qual o jornal O Nacional teve acesso na terça-feira (30), o centro universitário detalhou em um dos casos que, em 2019, uma candidata tentou burlar a comissão avaliadora utilizando bronzeamento artificial para escurecer a tonalidade da pele e conseguir efetivar a matrícula por meio das cotas reservadas aos negros, pardos e indígenas. Ao revisar a documentação e, em entrevista presencial com a estudante, a matrícula dela foi cancelada ao se constatar a tentativa de fraude.
No mesmo ano, relata a instituição, uma outra estudante ingressou na carreira de Medicina se declarando indígena. A denúncia anônima sugeria que ela, contudo, não pertencia a nenhuma etnia e o único parentesco que mantinha era por meio de uma tia que trabalhava na FUNAI do Maranhão. "Esta senhora possivelmente teria fornecido documentos falsos para a estudante", concluiu o inquérito aberto na UFFS.
Ao relatar os casos, a universidade sustentou que não considera, por ora, "oportuna e necessária" a criação da comissão "porque a instituição tem um sistema claro e detalhado por meio do qual faz a apuração das infrações nos processos seletivos, sejam elas detectadas diretamente pela instituição ou proveniente de denúncias".