Mais pesados que a vida

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Pablo Morenno

Não é a primeira vez em jornais. Tem se tornado uma notícia sem importância o assassinato de jovens e adolescentes por causa de um tênis ou camiseta de marca. Já está parecendo falcatrua de políticos. Resolvi escrever esta crônica porque já ando sem vontade de ler essas notícias corriqueiras. Não quero que aconteça com você. Matarem meninos e meninas por causa de objetos da onda não pode ter o mesmo destino das notícias de corrupção. A gente dá de ombros e vai ver futebol ou aparar as unhas.

Ando confeccionando perguntas sem medo. Colho respostas desconcertantes. Não gostaria que dessem de ombro e fossem ver futebol ou aparar as unhas depois da morte de meu filho. Eu ficaria indignado, entende? Então, escrevo como um pai de amanhã. Desse modo, eu escrevendo e você lendo, poderemos pensar no assunto. Podemos evitar a morte dos filhos dos outros enquanto não chegarem os nossos.

Tome uma folha de papel e vá anotando razões para alguém matar por um tênis e uma camiseta. Nenhuma ideia? Mas, se as coisas acontecem, razões haverá. Pensemos no seguinte: o assassino toma uma balança, dessas nas mãos da justiça, põe o tênis ou a camiseta num prato e a vida de nosso filho no outro. O que pesou mais?
Puxa o gatilho. Friamente. Assim, depois de somar e diminuir. Isso acontece em instantes muito pequenos, menores que esse parágrafo.

Absurdo! Se a balança está correta, tornou-se a vida sem peso ou fazemos camisetas e tênis muito pesados?
A vida desvalorizou-se. Todos dizem o mesmo. A vida desvalorizou-se, pesa pouco. Desse modo se explica porque, quando na balança assassina, a vida de um filho não alcança dois quilos de material sintético.

Proponho novas explicações. Não há possibilidade alguma de alterarmos a massa da vida. Ela não está sob nosso domínio; as coisas, sim. São os tênis e camisetas que andam com seu peso inflacionado. Parece-me resposta mais convincente. Vendem-se na publicidade, e todo mundo acredita, que jovens vidas só tem valor ou sentido em "coisas iradas". Aí, fazemos de tudo para dá-las a nossos filhos para que eles não se sintam assim tão desprezíveis. Mas há meninos que não têm pais tão bons ou, sendo bons, pais sem dinheiro para comprar tais objetos com mágicos poderes. Esses meninos assassinos não matam por coisas. Matam por sua vida. Procuram a vida nas coisas de nossos filhos porque nossos filhos, antes e ingenuamente, nessas mesmas coisas puseram a sua.

É terrível resignarmo-nos à morte de nossos filhos por objetos de consumo. Não seria menos doloroso convencermos nossos herdeiros que a vida vale muito, mesmo sem nenhum acessório?

Só perde a vida por um tênis ou uma camiseta de marca quem, mesmo sem se dar conta, pôs neles mais vida do que na vida mesma. Ultimamente faço perguntas sem medo. Quem pergunta sem medo não se assusta nunca. Nem com respostas desconcertantes.

Que ninguém pague um preço tão alto por coisa tão pouca.



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