Camila Guidolin
Acadêmica do curso de História da UPF
A história só adquire significado através das pessoas que a compõem e das conexões que elas estabelecem, continuamente, entre si. Na torrente dos acontecimentos, o fluxo constante que vem das relações do homem envolto em seu meio, alcança sentidos diversos e cria, no movimento do tempo, os processos históricos. E assim, nesses processos que ultrapassam todos os seus pretéritos, novas realidades são criadas.
Para esse desfecho, o tempo se ramifica, no entanto deixa fossilizadas suas raízes pelos anos que seguem como um rio que ainda presencia correntezas. Dessa forma, desenvolve identificações e constitui memórias, colaborando com os traços da história.
Em 1965, Paul McCartney emocionava milhares de fãs com a letra de uma das músicas mais regravadas até hoje. Em uma das frases ele nos diz: "Yesterday came suddenley..." (o ontem veio de repente). Um ontem repentino e pulsante fiel aos dias e aos seres. O retorno necessário que prove e assegure aos que se julgam simples passageiros desse trem persistente e vivo, algum sentido.
Mas o que define essa seleção do ontem? O que merece ou não ser lembrado? Arrisco um palpite ao merecimento da lembrança: lembramos em primeiro lugar das situações que precederam diretamente as realidades de agora. O passado que ainda nos constitui. Nesse sentido e na tentativa de relembrar os primeiros passos do Curso de História na Universidade de Passo Fundo, abrimos a exposição História e Memórias: 40 anos de Graduação e 10 anos de Pós-Graduação em História da UPF. Essa tentativa exige não somente um juntar de fatos e fotos, compilados num amontoado de acontecimentos, mas, para além disso, sugere um repensar crítico desse processo, sua ligação com as necessidades de cada época, bem como as exigências e aspirações de cada indivíduo.
O curso de História tem suas raízes no ano de 1966 quando se inicia o curso de Estudos Sociais, Licenciatura Curta, acolhido junto a Faculdade de Filosofia. Seu reconhecimento é datado no ano de 1969, sendo que habilitava, em três anos, os acadêmicos para exercerem o magistério de Primeiro Grau nas áreas de História, Geografia e Ciências Sociais. Através de uma autorização do Conselho Universitário da Universidade de Passo Fundo, no início da década de 1970, o Curso de História começa a funcionar como Curso de complementação à Licenciatura Curta em Estudos Sociais. No entanto o seu reconhecimento acontece apenas em 02 de outubro de 1973 através do Parecer 1.736 com o encerramento da primeira turma. Porém, apenas em 1975 é publicado no Diário da União o decreto que autoriza o funcionamento do Curso de Licenciatura Plena em História, o qual continua desenvolvendo suas atividades até hoje.
Não é ao acaso que a necessidade de criar um curso que aprofundasse e ampliasse os espaços de estudo e pesquisa em História na região estivesse em lugar e hora certa, provocado pelas das novas exigências. Em vista do cenário criado ainda pelos reflexos da Segunda Guerra, o momento estava marcado por disputas ideológicas, políticas e econômicas. Um mundo bipolarizado e um Brasil abalado pela repressão desencadeada após o golpe de 1964 abrem alas para a década que chegava ainda debruçada nesses acontecimentos. Se o Milagre Econômico faz expandir a indústria, o governo de Médici cria os anos mais duros do período militar. Como resposta a essas iniciativas, surgem em vários países os movimentos da luta armada. Os "guerrilheiros" pegavam em armas, livros e violão, provocando e intensificando os movimentos sociais.
Os ruídos das agitações que criaram pleitos por todo o mundo ecoam também em Passo Fundo, onde os movimentos da marcha são vistos em suas reivindicações independentes. A ampliação dos setores socioculturais e o desenvolvimento econômico da região sugerem o espaço ideal para uma nova discussão. A Universidade de Passo Fundo expande-se e o Curso de História, já no início da década de 1980, sente necessidade de uma maior dinamização. Assim, são criados o Arquivo e o Museu Histórico Regional, dando suporte ao curso, que precisava agora de intensificação. Mais tarde, e também como consequência dessa consolidação, é instalado o Programa de Pós-Graduação em História, com área de concentração em História Regional.
E afinal, o que a História é capaz de fazer? A cada aula, encontro, ciclo, discussão, lançamento, simpósio, viagem, a cada ano, enfim, essa pergunta é formulada e respondida. Por aqueles que deixam sua "cara" nos quadros, suas ideias em artigos, sua discussão pelos corredores, sua trajetória em livros e salas de aula. O Curso de História é nosso, também ajudamos a constituí-lo. Por isso o 'Sejam Bem-Vindos a essa exposição' soa mais como um 'Sintam-se parte dela', pois é essa a relação que estabelecemos durante nossos anos de academia. Formamos porções dessa história e é por isso que adquirimos o esforço de renová-la sempre. Para ousar além do devido, mas não a mais dele, cito o pensamento seguinte na composição de McCartney: "I belive in yestarday" (eu acredito no ontem). Afinal, essa é a única condição que faz com que ele realmente exista.