Crítica de cinema - Cópia fiel

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    por Daniel Dalpizzolo @dandalpizzolo / [email protected]

    Ver Cópia Fiel, do cineasta iraniano Abbas Kiarostami, é presenciar em tempo real o nascimento do cinema. Não o surgimento da mídia em si, mas as origens da construção de um filme, de seu processo de encenação, de algumas questões essenciais que suscitam da tela enquanto o apreciamos – o que é verdadeiro para o filme, qual a proposta dele, ou a relação que os planos constroem uns com os outros para dar “sentido” à narrativa.
    Somos convidados a um jogo. Mas ao contrário do que pode parecer (e do que se vê por aí em tantos filmes que pretendem “ser” inteligentes), um jogo construído na mais absoluta discrição, em cenas que não nos cansam de surpreender e na cadência impecável dos planos compostos por Kiarostami para acompanhar a jornada de seus dois personagens: um homem e uma mulher.
    Durante um passeio pelas belas paisagens do interior da Itália, vemos diversos diálogos e situações casuais entre os dois personagens. Flertes, piadas, olhares, gestos, discussões e deboches. Mas afinal, quem são eles? De onde se conhecem? A quanto tempo? Qual a relação entre ambos? Cada sequência vista gera mais perguntas, que se empilham até que o filme se rompe, rasga ao meio, reparte-se para sugar o espectador ao mais prazeroso estado de dúvida e de contemplação.
    Kiarostami, por trás das imagens, faz de Cópia Fiel um ensaio sobre o processo de construção de realidades em um filme. O embate entre o verdadeiro e o falso, o original e a cópia, é discutido por seus personagens através das obras de arte que observam, e ao mesmo tempo também é proposto ao espectador quando, a partir de determinada cena, somos convidados a ressignificar tudo o que que vimos até então para, mais tarde, sermos colocados novamente contra a parede. Parece louco, eu sei; mas é deslumbrante.
    Deve ser tarefa estranha tentar decifrar o que é Cópia Fiel a partir de um texto sobre ele – talvez tanto quanto escrever a respeito. E é, a bem da verdade, uma experiência que só pode ser compreendida quando vivenciada – porque existe com o único propósito de ser vivenciada minuto a minuto. Uma compreensão que extrapola os limites da veracidade, da coerência e da realidade, ao menos como as vivenciamos do lado de cá. É um filme que filma processos, e o que realmente interessa é que, quando estamos vendo, o filme é – é o que Kiarostami propõe a cada cena, é o que acreditamos que possa ser.
    É um filme para ser visto de joelhos.

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