Nossa garota no Eisner

Colorista gaúcha indicada ao Eisner Awards - premiação americana mais importante dos quadrinhos -, Cris Peter conversou com o Segundo pouco depois de receber a notícia

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por Marina de Campos

A tarde do dia 4 de abril de 2012, uma quarta-feira de temperaturas amenas no sul do país, vai ficar marcada na história dos quadrinhos brasileiros e também na vida de Cris Peter. A jovem artista gaúcha levou um susto quando abriu a lista dos indicados ao Eisner Awards 2012 e leu seu próprio nome entre os nomeados na categoria de melhor colorista. Apesar do país já estar se acostumando a ter representantes - e vencedores - na premiação norte-americana que é considerada o Oscar dos quadrinhos, o fato é um marco histórico: pelo que se sabe, essa é a primeira vez que uma mulher brasileira é indicada a esse seleto grupo que reúne os melhores do ano, contando com nomes célebres como Darwyn Cooke, Mark Waid, Craig Thompson, Dan Clowes e Grant Morrison. Indicada pelo trabalho em Casanova, título da Marvel escrito por Matt Fraction e ilustrado pelos irmãos Fábio Moon e Gabriel Bá, ela é responsável pela elogiada colorização digital da obra, que se destaca justamente pela exuberância de suas cores que variam em todos os tons possíveis entre o rosa e o azul. Em êxtase, a artista conversou com o Segundo por e-mail, pouco depois de receber a grande notícia. Em entrevista, falou da indescritível sensação de ser indicada, a sua visão a respeito da mulher nos quadrinhos e o trabalho de colorista em Casanova.
Cris Peter concorre ao Eisner Awards na categoria melhor colorista ao lado de Laura Allred, mulher do lendário Michael Allread, Bill Crabtree, Ian Herring e Ramón K. Pérez e Victor Kalvachev. A votação acontece online, em www.eisnervote.com, mas somente para convidados da indústria de quadrinhos, e o resultado é revelado no dia 13 de julho, durante a convenção San Diego Comic Con.

ENTREVISTA COM CRIS PETER

Segundo - Então, qual a sensação de ser indicada à premiação mais importante do mundo dos quadrinhos?
Cris Peter - Sensação? Eu não sei! Estou meio dormente ainda! Parece um sonho simplesmente porque é uma surpresa muito grande! Eu realmente não esperava essa indicação. É tudo muito surreal. Eu realmente não achava que a minha carreira estava neste patamar.

Você é a primeira artista brasileira a entrar nessa lista, e acaba sendo inevitável falar do espaço da mulher hoje em dia. O que você pensa disso? Acredita que há abertura e respeito para todos nos quadrinhos? Isso demonstra uma evolução nesse sentido ou o sexo não importa nessa hora?
Eu desconfio que eu seja a primeira mulher brasileira a ser indicada, sim... uau! Muito louco isso. Quanto ao espaço da mulher, não acho que seja tão restrito assim. Entrar nesse mercado é difícil pra qualquer gênero do jeito que ele está hoje. Acredito que existam alguns gêneros de histórias onde seja mais difícil ver uma mulher atuando, mas se você quer muito uma coisa é só ir lá e “meter o pé na porta”. Na internet, hoje em dia, é muito difícil saber o sexo da pessoa, os editores estão mais preocupados com o seu talento do que com o seu sexo.

Os quadrinhos são um daqueles universos conhecidos pelo grande público como masculino, mas há um público feminino grande e muitas artistas nos bastidores, isso sem falar da própria importância da figura feminina nas histórias, com tantas grande heroínas. Como você vê a mulher nos quadrinhos e qual é sua heroína preferida?
Realmente... aí o negócio é diferente. Uma coisa é discutir a abertura do mercado de quadrinhos para profissionais mulheres, outra é a maneira como a mulher é retratada nos quadrinhos. Neste quesito, acho que ainda temos sérios problemas. A maioria do público ainda é masculino, e por isso as heroínas ainda tem sua figura muito exposta em uniformes apertados e saltos altos impossíveis de correr e perseguir bandidos. Destas heroínas mais populares, devo admitir, não admiro nenhuma. Pra mim, a melhor heroína é a Hit-Girl do KickAss. Ela veste roupas confortáveis. E mesmo assim existe muita fan art pervertida por aí! Aff!!

Como surgiu a parceria com os gêmeos Moon e Bá e Matt Fraction em Casanova, e como foi desenvolver esse trabalho?
Nós nos conhecemos em convenções, batíamos papo! Falávamos de trabalho, mas nunca cheguei a mostrar meu portfolio pra eles avaliarem nem nada. Quando dei por mim, estava recebendo um telefonema do Gabriel me convidando para fazer o projeto. Conversamos muito até chegar a um estilo para a revista.

Matt Fraction afirmou que você se tornou parte da família. Como é esse trabalho de colorista digital? Somos como uma família mesmo! Todo mundo se ama! Estamos sempre trocando emails. A minha troca de emails é mais com os gêmeos. A gente se entende melhor no nosso português pra deixar as páginas redondinhas pro pessoal. Normalmente o processo é, no caso deste arco que estamos fazendo agora, o Gabriel desenha e me envia os P&Bs, então repasso as páginas pra minha assistente, que coloca a cor base. Depois disso, faço a composição de cores, usando uma paleta guia enviada pelos gêmeos para combinar cores e começo a trabalhar iluminação, recortes de cores, misturas etc. Depois de pronto, envio pra eles, de vez em quando eles sugerem uma ou outra alteração, eu ajusto e enviamos pro pessoal todo dar uma olhada. Depois de mim o Dustin Harbin faz a parte dele, ele faz os balões de fala todos à mão e depois compõe as falas nas páginas e fica tudo lindo!

Você começou a ler quadrinhos na adolescência e foi se envolvendo cada vez mais com esse mundo através da colorização. Como foi decidir seguir essa profissão pouco comum e como você vê esse caminho agora?
Foi estranho, pois já trabalho com isso desde muito cedo, desde o segundo ano do segundo grau!!! Mas nunca encarei como uma profissão, e sim como um bico. Quando entrei na faculdade e comecei a comparar os mercados de publicidade e quadrinhos, que eu percebi que era uma possibilidade. Depois de um estágio horrível de uma semana em um estúdio de design, estava decidido, eu seria colorista de quadrinhos!

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