A voz de Humberto Gessinger ressoa, ao fundo. Leio com os olhos... Leio com a língua... Leio com os olhos, boca e ouvidos, pele e nariz - todos os sentidos. Leio comovido todos os sentidos da vida. A canção, composta e melodiada especialmente para a 15º Jornada Nacional de Literatura pelas mentes de Paulo Becker e Gessinger é um aviso: ela está chegando.
A cada dois anos a lona ganha corpo e voz. Pelas mãos de quem lê e de quem escreve, essa lona torna-se um lar; ou um refúgio. Lar porque suporta tudo o que, de alguma forma, faz parte de quem passa por ali. Refúgio porque revela a calmaria em meio a uma rotina cuja rainha é a pressa. A cada dois anos, a lona ganha espaço na cidade e, mesmo que incrustada na Universidade de Passo Fundo, escondida entre árvores e prédios, ela é vista – como alguém que se engrandece torna-se, por cinco dias, dona – do espaço, da cidade, da palavra, da fala e da gente.
Como pode uma lona abraçar tanto? Pode porque é a leitura quem a comanda. Pode porque vem da página de um livro – ou do toque em um e-book – a força que a mantém. Pode porque a lona é abrigo da maior festa literária do Brasil - a Jornada Nacional de Literatura constrói seu palco ali, embaixo de uma lona que, em 2013, não assumirá a forma de um circo, mas ainda assim, será preenchida por gente que, entre malabarismos, entrega-se a um livro.
Ontem pela manhã o cheiro de Jornada Literária se espalhou pela cidade. O lançamento oficial aconteceu no saguão do Bourbon Shopping, contou com a presença da imprensa, dos Secretários da Cultura e da Educação e da professora Tânia Rösing que, com intensidade e força, proclamou a Jornada, a necessidade de incentivo à leitura e a extrema importância de uma biblioteca pública de qualidade. Além disso, a coordenadora das Jornadas anunciou o tema e as novidades que o evento vai trazer na última semana de agosto.
Em um universo onde Ipad, celular e computador entregam ao jovem – e não só a ele – um cenário de oportunidades e disponibilidade de informação, a Jornada Nacional de Literatura busca trazer a leitura para a tela e não só para a página. O tema escolhido, “Leituras jovens do mundo” coloca em pauta o uso da tecnologia aliado a literatura. “O e-book não vai tirar o lugar do livro”, comenta Tânia Rösing. “Estamos trabalhando com um jovem que não tem mais apenas a mão, mas tem extensões. Queremos que o jovem, no acesso às redes sociais, por exemplo, possa estar falando sobre literatura. Queremos aprofundar o que o jovem já domina”, explica a coordenadora.
Quanto à escolha do tema, Tânia ressalta que a dificuldade maior foi transformá-lo em uma linguagem e, então, poder atingir o jovem. Em um ano onde o Brasil sedia a Jornada Mundial da Juventude, com a presença de Bento XVI e, ainda, onde a Campanha da Fraternidade traz a juventude como centro, a Jornada não foge disso: o ano é do jovem e é nele que o evento vai se concentrar. “Nós temos o compromisso de entender os jovens e todo o seu comportamento, o seu pensamento e o que sente e, com isso, poder agir e trabalhar com a dimensão maior que o envolve”, enfatiza Tânia.
E, para tratar desse tema, o elenco de 2013 é de peso. As Jornadas Literárias sempre promoveram o intercâmbio entre culturas, mas desta vez, a presença de estrangeiros é um diferencial à parte. Espanha, Portugal, Estados Unidos, Itália, Chile, Colômbia – o globo debaixo de uma lona e em frente à livros. “É difícil achar especialistas que falem desse tema. E as pessoas perguntam: ‘quem é o grande nome?’. Não é escolher um ‘grande nome’, mas escolher um grande nome que vá trabalhar esse tema” destaca Tânia e completa: Nós não estamos preocupados com o que as editoras estão vendendo. Estamos preocupados com o processo educacional, cultural e tecnológico”.
De fato, o jovem é o centro: entre buscas por entender a literatura fantástica de Raphael Draccon e entender a intensidade do poema de Sérgio Vaz, a Jornada traz Jairo Bauer para falar sobre sexualidade e afeto, André Vianco para explicar o sobrenatural e o terror que emprega em sua escrita e, ainda, traz Elizabeth Savalla, Walcyr Carrasco e Ary Fontoura em um debate que coloca o jovem frente à ficção e à telenovela. Questões como trabalho e consumo serão tratadas por Marcelino Freire e José Castello.
Paralelamente ao palco central, a programação se estende no 12º Seminário Internacional de Pesquisa em Leitura e Patrimônio Cultural, no 4º Encontro de Escritores Gaúchos – que discute, entre outros temas, o poeta do passado e a cultura gaúcha na universidade -, o 3º Seminário Internacional de Contadores de Histórias que traz Argentina e Estados Unidos como convidados e ainda, o 2º Simpósio de Literatura Infantil e Juvenil e o Encontro Internacional de Bibliotecários.
Além de todos os encontros acontece, também, a 7º Jornadinha, direcionada para o público do ensino fundamental e, desta vez, sem a presença do Ensino Médio já que este ganhou, desde a última edição da Jornada, um espaço só para ele: a Jornight. A novidade deste ano fica por conta da Jornada UPF que é direcionada aos alunos de graduação e traz, além dos temas já expostos, meio ambiente e sustentabilidade.
Toda a programação é resultado de uma confirmação: o jovem, ao contrário do que grande parte pensa, lê. Basta, apenas, que se entenda o quê lê, porquê lê e como lê. “O jovem lê Harry Potter, lê Senhor dos Anéis, lê livros enormes. Por que ele gosta disso? É preciso entender o porquê disso para que possamos entender o jovem e trabalhar com ele”, conclui a coordenadora das Jornadas.
O jovem, mais intenso e rápido que um olhar, se desenvolve e desenvolve o mundo em que vive. Transforma, recicla e redesenha – a vida ou o contexto, não importa. Não há nada que seja tão fixo que, em poucos segundos, já não tenha sido transformado e é justamente desse dom – sim, porque a mudança é um dom – que a Jornada busca falar. O jovem é o presente, mas é dele, também, o futuro. Como viver em um futuro cujo cenário é ilegível? Impossível. Então, que venha a Jornada.