O século XX no seu traço

Há 60 anos morria aquele cujo o traço foi o responsável por abrigar toda uma história: Graciliano Ramos

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Outubro, final do século XIX, em meio aos detalhes marcados do parnasianismo, nascia um dos grandes nomes do romance moderno brasileiro. Graciliano Ramos, filho mais velho de um grupo de dezesseis, viveu, a vida inteira, sob o regime das secas do nordeste. Aprendeu, desde cedo, sobre violência e agressividade já que os pais, oriundos de uma relação de autoritarismo, utilizavam da inflexibilidade na educação dos filhos. Inflexíveis, também, foram os seus escritos: pessimismo, criticidade e angústia marcam a obra do autor.

Graciliano publicou seus dois primeiros livros, Caetés e São Bernardo, no início dos anos 30. O primeiro narra a história de um jovem que, quando na cidade, se deixa seduzir pela burguesia, apesar de sua origem pobre. O segundo conta a história da ascensão e decadência econômica e social de um fazendeiro. Sua ação, através da literatura, que denunciava e alertava para a minoria, não agradou a todos. Em 1936é acusado de ter conspirado no levante comunista de novembro de 1935, é demitido e enviado, ao lado de 115 presos, para o Rio de Janeiro. O país, sob a era Vargas, tentou calar Graciliano. Preso por dois anos, Graciliano escreveu e calou os acusadores. Publicou, ainda na cadeia o livro Angústia que mais tarde, recebeu o prêmio Lima Barreto concedido pela Revista Acadêmica.

Sempre atento, ao observar e vivenciar diferentes realidades construiu sua obra. Quando foi libertado, resolveu falar. Vidas Secas, por exemplo, seu livro mais conhecido, é um romance de 1938, ambientado no sertão brasileiro e que relata a condição sub-humana da população. Ainda que seja uma ficção, Vidas Secas é realista: ao retratar a fome, a pobreza, a miséria e o caleidoscópio de sentimentos que essas impõe, o livro fala da vida de uma parcela da população que durante anos ficou esquecida. O Mestre Graça, como era chamado, fez questão de lembrar. O livro conquistou, em 1962, o prêmio da Fundação William Faulkner, dos Estados Unidos, como livro representativo da Literatura Brasileira Contemporânea.

Além de Vidas Secas, sua obra compreende títulos clássicos como A Terra dos Meninos Pelados que, lá em 1939, já tocava no assunto da discriminação e do bullying ao contar a história de Raimundo, um menino com um olho de cada cor e careca e que, assim como Vidas Secas conquistou reconhecimento. Dessa vez, Graciliano recebeu o prêmio Literatura Infanto-juvenil, do Ministério da Educação.
Graciliano falou, também, de si. Em Memórias do Cárcere ele descreveu todo o contexto de sua prisão. Um livro de história, angústia e realidade. Nele, Graciliano fala de censura, da tortura sofrida e das injustiças da Ditadura de Vargas. Um câncer, no entanto, impediu a realização do capítulo final. O livro foi publicado, postumamente.

Março, metade do século XX. Há 60 anos morria aquele cujo o traço foi o responsável por abrigar toda uma história. Graciliano, ao deixar este mundo, deixa, também, a herança de uma escrita pesada. Entre conflitos pessoais opressão e dor, o autor gravou seu nome na história da literatura brasileira.

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