Será que alguém esqueceu um livro aberto por aí? Talvez, na pressa de chegar no horário e achar um bom lugar no agora chamado Portal das Linguagens para assistir ao espetáculo de abertura que já estava começando, alguém tenha cometido a besteira de deixar um livro aberto. Tem noção de tudo que pode escapar dali? Para quem tem um pouco de imaginação, foi mais ou menos isso que aconteceu na abertura da 15ª Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo.
Um menino, lá no alto, lendo, imaginando, adormecendo... e quem sabe um livro aberto, esquecido por ali. De repente o palco é tomado por tudo que se possa sonhar: bruxas, fadas, piratas, rainhas, príncipes, magos, personagens mais que conhecidos como um jovem aprendiz de bruxo ou um chapeleiro maluco, até que os olhos passem a ver coisas espetaculares, leões selvagens, dragões ameaçadores, cavalos alados... e o som de uma gaita de boca comece a soar ao fundo, anunciando que chegou a hora de despertar para uma nova jornada.
Em outras palavras, o espetáculo que marcou o pontapé inicial desta 15ª edição buscou trazer para o público a imensidão da literatura, especialmente aos olhos do jovem que acaba de a descobrir. Como não se traduz facilmente um momento tão visual como este, o importante aqui é dizer que a apresentação quase que inteiramente realizada por artistas locais foi um verdadeiro show, sem ficar devendo a nenhuma das aberturas anteriores. Comandados pelo maestro Fernando Montini, artistas de diversos grupos artísticos da Universidade de Passo Fundo e de outros núcleos de dança e música da cidade encarnaram de verdade a missão de abrir o evento mais importante do ano. Nesse caso, foram santos de casa a fazer milagres.
Além de um figurino bem composto e rico em detalhes, que recorreu aos símbolos clássicos do mundo da fantasia para encher o palco, a cenografia também impressionou com seus grandiosos bonecos que entraram pelo corredor, subiram rampas e desceram dos céus, servindo como o elemento surpresa que show pedia. A trilha sonora foi um espetáculo à parte: cumprindo seu papel de criar a atmosfera certa para cada momento, a música ao vivo embalou as viradas que se davam em cena, ajudando a mostrar as muitas faces que a literatura pode ter. Ópera, samba, tango, música medieval... e a voz potente de Montini sempre presente, – como fez ele em um de seus grandes momentos – de tirar o chapéu.
A entrada discreta de um ruivo de cabelos longos talvez nem fosse notada, se não viesse acompanhada pela gaita de boca e o início da música tema da Jornada. Assim que Humberto Gessinger começou a cantar seus versos, todo o espetáculo ganhou sentido. Pois literatura se lê com os olhos, com a boca, com os ouvidos, de corpo inteiro, de corpo e alma. E se um livro, uma vez aberto, nunca mais volta a ser o mesmo, aquele que o abre não volta a ser o mesmo, pelo contrário, passa a ser inteiro.
Registro de uma ausência
A Jornada recomeçou e tudo continua aparentemente igual. Mas falta algo... E não é a lona do circo, nem mesmo a antiga segunda-feira tradicional. O que falta é Alcione Araújo. O escritor que passou a ser parte das Jornadas Literárias faleceu na madrugada de 15 de novembro de 2012, deixando aqui uma lacuna irreparável. E um dos momentos mais emocionantes da noite foi a pausa no protocolo para “registrar sua ausência” com a bela homenagem ao escritor transmitida pelo telão. E não foi preciso que ninguém mais falasse, apenas uma coleção de trechos de suas entrevistas foi suficiente para dizer tudo. Incansável em sua luta por anunciar ao mundo o que é feito aqui, Alcione voltou à vida por alguns minutos para uma verdadeira declaração de amor à Jornada. E vice-versa.
Um romance, um prêmio
Durante a abertura da Jornada, a expectativa era em conhecer o vencedor da 8ª edição do Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura. Apenas dez foram selecionados de 326 obras inscritas. A vencedora foi a obra "Infâmia" de Ana Maria Machado. Aos 72 anos, a escritora é capaz de dividir entre as cadeiras da Academia Brasileira de Letras, as páginas cujo os punhos escrevem e os prêmios que tais páginas conquistam. No palco, não pôde falar muito, Agradeceu aqueles que apostaram em seu trabalho e àqueles que leem cada linha que a mente coloca para fora.
Te conto um conto
Olavo Amaral, em primeiro lugar, e Mariana Salomão Carrara, em segundo, foram os vencedores da 13ª edição do Concurso Nacional de Contos Josué Guimarães. Olavo é gaúcho, tem 34 anos, é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde mora há três anos e meio. Ele receberá um prêmio de R$ 5 mil pela vitória com os contos Uok phlau, Quarto à beira d`água e Icebergs. Mariana mora em São Paulo e levará R$ 3.000,00 com a premiação dos contos Memória de pano, A voz e Descoloridos. Amaral também será presenteado com um estágio de 10 dias na Universidade de Santiago de Compostela, na Espanha, para onde deverá embarcar em outubro próximo.
Investimentos: a educação agradece
Dois anúncios relacionados a investimentos em bibliotecas animou quem esteve presente na abertura da Jornada. A nível de Estado, o Secretário de Cultura, Luiz Antônio de Assis, informou que será aberto edital no valor de R$ 1 milhão para a modernização de bibliotecas em cidades de até 10 mil habitantes. As inscrições serão abertas no dia 2 de setembro. O dinheiro será utilizado para a compra de novos livros e equipamentos.
Já o prefeito Luciano Azevedo disse que Passo Fundo terá nos próximos anos 35 bibliotecas. Dessas, 30 já existem e serão reformadas e outras cinco serão construídas. Segundo o Prefeito, o projeto já está pronto e 12 modelos foram criados.
Atualizada às 23h55