A fantástica fábrica de escritores

Na segunda noite da Jornight, fenômenos da literatura fantástica Raphael Draccon e André Vianco deram uma aula de como contar histórias e inspiraram futuros escritores

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Vinte minutos de atraso, quase mil jovens entediados, um bocejo e outro, olhares para os lados... E de repente um estouro ensurdecedor! Seguido de um automático sobressalto geral, o grito da plateia em uníssono, a natural sequência de risos. Foi só um daqueles picos da regulagem de som, mas serviu para despertar a plateia mais animada da Jornada e preparar o clima para a chegada das estrelas do debate. Numa noite onde o tempo pareceu não passar - e que poderia ter seguido madrugada adentro -, o carisma do mediador Marcelino Freire e dos convidados Raphael Draccon e André Vianco convenceu a plateia adolescente logo nos primeiros minutos e tudo entrou em sintonia.

Palmas, assovios e até alguns suspiros choveram entre uma e outra resposta de impacto, no que mais pareceu um duelo amigável para ver quem era capaz de inspirar mais o público com suas histórias. Se for assim, a batalha foi acirrada e terminou em empate! Jovem fenômeno da literatura fantástica por sua saga Dragões do Éter, o carioca Raphael Draccon começou lembrando de sua origem humilde, quando morava perto da linha do trem e tinha como herói seu avô, que mesmo com todas as dificuldades via poesia na vida. “Aos cinco anos, quando ele faleceu, precisei achar um novo herói, e então encontrei Bruce Lee”, disse arrancando gargalhadas da plateia. “Aí coloquei na cabeça que seria como ele: lutaria, faria filmes e escreveria livros. Quando cresci um pouco, ia quase todos os dias à mesma livraria e, como não podia comprar os livros, lia meio escondido, um pouquinho de cada vez. Levou quase 20 anos para eu realizar esses três objetivos, e um vez acabei voltando àquela mesma livraria como autor convidado”. A ironia da vida o levou a fazer um pedido: “se um menino vir aqui e ficar lendo os livros, mesmo que ele não compre, não incomodem ele não, deixem que a magia entre no coração dele, pois os sonhos se realizam e um dia ele pode estar aqui no meu lugar”. Aplausos e gritos efusivos, mas ainda era apenas o primeiro round.

Na sua vez, André Vianco começou perguntando: “Quem aqui gosta de ler? E quem gosta e escrever? Preparem seus ouvidos e seus corações, pois hoje à noite a vida de alguém pode mudar. Você tem que saber que ninguém vai te dizer isso, você vai começar a sentir dentro de você, e não vai precisar da validação de ninguém. Você só precisa ter todas aquelas histórias queimando na sua cabeça, louco pra que seus personagens nasçam no papel. Quando você escrever seu primeiro livro, vai achar a coisa mais fabulosa do mundo, e vai mandar pra todas as editoras, e todas elas vão dizer não, mas você vai mudar o título e começar a escrever tudo de novo. E então vai ter se tornado mesmo um escritor”. A plateia veio abaixo com a fala do autor de Os Sete, e não é de se duvidar que os olhos de alguns aspirantes a escritor tenham ficado com os olhos marejados de esperança.

Então Draccon voltou com toda força, e contou a história do lançamento de seu livro na Bienal do Rio, quando alcançou o estrelato. Seu pai, que nunca tinha acreditado na ideia de ser escritor, tinha finalmente enxergado o momento fantástico que estava acontecendo, e passou a ser o fã número um do filho. “No dia do lançamento, meu pai apareceu lá como a pessoa mais orgulhosa do mundo, me deu um abraço apertado e a chance de que eu dissesse ‘muito obrigado’. No outro dia ele faleceu. E eu tive que enterrar meu pai naquela que deveria ser a melhor semana da minha vida, mas eu estava feliz por ele ter visto em vida aquela vitória e eu ter podido agradecê-lo antes que partisse”. Dessa vez não houve aplausos, mas um silêncio esmagador, mais intenso do que qualquer barulho.

E nesse ritmo eles foram até o fim da noite. Mais que escritores, na Jornight eles foram mesmo bons contadores de histórias, com um poder de convencimento sobrenatural. Confessando lembranças, respondendo a perguntas e realizando o que foi quem sabe a noite mais inspiradora da Jornada, em duas horas capazes de incentivar jovens não somente a ler, mas também a se tornarem escritores e viverem histórias tão fantásticas como aquelas para depois colocar no papel. 

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