Quatro homens, quatro vozes, quatro idiomas. Quatro conceitos, quatro propostas, quatro formas de explorar a transformação social. Quatro interpretações e quatro visões de mundo. Um vem da Espanha. Pertinho dele, outro vem de Portugal. Ainda pela Europa, da Itália vem o terceiro. A representação brasileira vem da Bahia. Os sotaques, esforçados para atingir a compreensão do público, importaram pouco na noite de ontem. A conferência a quatro vozes trouxe Cesar Coll, José Furtado, Massimo Canevacci e Nelson Pretto para falar sobre a convergência das mídias. Estranhamente, quando assumiram o palco, os quatro assumiram, também, o mesmo tom.
Mais que bons estudantes, bons aprendiz
O primeiro a assumir o microfone foi o espanhol Cesar Coll. Professor de psicologia evolutiva e da educação na Universidade de Barcelona, Coll foi um dos principais coordenadores da reforma educacional espanhola. No palco da Jornada focou sua fala no impacto da convergência das mídias na educação. Para ele, o novo formato de entender e compreender as novas plataformas midiáticas influencia fortemente na sala de aula. No entanto, antes de enfrentar as mudanças, é preciso compreender o conceito de aprendizagem. “Mais que formar bons estudantes, é preciso formar bons aprendizes. O aprendiz, nesse novo formato, é o foco da educação. Os novos dispositivos tecnológicos são apenas objetos que possibilitam aprender em diferentes contextos,
Uma espécie de Renascimento Digital
Depois do espanhol, o português José Furtado explorou a ideia de que há novos formatos comunicacionais e midiáticos e que toda a transformação enfrentada possibilita um renascer – de época, de indivíduo e de relações – pautado, essencialmente, pelo digital. “Com o surgimento da internet, surgem novas formas de leitura e escrita. Há a multiplicação dos textos digitais ou digitalizados. Há uma progressiva indistinção de fronteiras.” Todas as mudanças que tornam a civilização, de fato, global contribuem, segundo Furtado, para o conceito de convergência das mídias: Acredito que o termo ‘convergência’ consegue definir e descrever as mudanças tecnológicas, sociais e econômicas e é graças a esse processo que estamos mudando. A convergência das mídias é um processo evolutivo e está em curso”, comenta.
Conceitos quebrados
O italiano Massimo Canevacci é conhecido por romper conceitos clássicos e criar novas visões do processo midiático atual. Sua fala, leve e tranquila, é capaz de quebrar paradigmas. Enfático, Canevacci acredita que é possível captar algo bom daquilo que o mundo enfrenta e vive, mas é preciso, antes disso, estabelecer novos conceitos. “O pensamento dialético está em crise. A dialética não funciona mais. A cultura digital favorece a queda de alguns conceitos e possibilita a dimensão sincrética.” O teórico rejeita qualquer contraposição e divisão de ideias ou formatos e propõe unir crenças que, a princípio, parecem opostas. “O conceito de ambiguidade é essencial. Não existem, mais, conceitos fixos. A sociedade é ambígua.” Além de entender a sociedade como ambígua, Canevacci explora o conceito de autorepresentação. “O domínio que a TV ou o cinema tinham sobre a representação da sociedade está morrendo. É uma morte feliz. As pessoas querem se autorepresentar através do novo formato de mídia que encontramos”, explica. Esse novo formato é, segundo o italiano, totalmente diferente e, talvez, o oposto daquilo que se conhece. “O conceito atual de mídia é do século passado. Está nascendo algo novo e precisamos encontrar formas de lidar com isso.”
O que quer nas ruas a geração Alt + Tab?
O brasileiro no meio dos europeus explorou o conceito de convergência das mídias no cenário do país – imerso em uma onda de manifestações que tomaram a rede e as ruas. Nelson Pretto jogou imagens para o público e o questionou: “O que os meninos e meninas, que eu nomeio de geração Alt + Tab querem nas ruas?”. O silêncio foi o impulso para continuar: “É preciso ter a capacidade de ouvir outras vozes. Se fala em falta de liderança e falta de objetividade. As lideranças, de fato, foram deixadas de lado. Surgiram novas formas de organização e a mídia tradicional não dá conta da cobertura. Todos se tornaram manifestantes e repórteres.” Diante da nova forma de comunicação, apresentada e vivida pela juventude do Brasil e do mundo, Nelson acredita que tudo merece um novo olhar. “São diferentes bandeiras levantadas e diferentes visões de mundo. Toda a diversidade corresponde, também, à diversidade da população”. No meio de uma onda de reinvindicações – por saúde, por educação, contra organizações e contra partidos – a juventude cresceu. Deixou de ser imatura e tornou-se a voz do país: “Essa é uma geração que pode ter mais reflexo do que reflexão, mas é uma juventude que escreve e opina, que põe o dedo na ferida de muitos problemas do mundo, Fazem a revolução e estão nas ruas sem deixar de estar no Twitter, no Facebook, no Instagram.”