Coluna: A Culpa do Sabiá

Por Pablo Morenno

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Esta crônica abordará simplesmente um canto de sabiá. Estou avisando desde o início. Assim você não perde tempo. Pode passar logo ao resumo das novelas, às notícias de futebol. Todos avisados. Quem não gosta de sabiá siga para a página policial.


Nesta altura, chame alguém num raio de dez passos, a quem dedicas amor ou afeto. Leia a crônica para ele ou para ela. Como amor e afeto não têm objeto determinado, pode chamar o cachorrinho ou o iguana. Apenas é necessário que a coisa ou a criatura seja capaz de convencer-lhe a assistir um show do Amado Batista ou a levantar-se às cinco da manhã pra acampar na Barragem de Ernestina.


Eu tinha muitos assuntos para esta crônica. Não consegui desenvolver nenhum. Culpa do sabiá.


O sabiá não me deixou escrever sobre as “pastinhas”. Talvez você não saiba que as pastinhas eram meio-modelos meio-prostitutas contratadas para seduzir prefeitos a investir os fundos de pensão municipal num esquema fraudulento que lesou os municípios em mais de cinquenta milhões. As modelos prometiam mundos e fundos aos prefeitos em troca de outros fundos. Os sabiás dos prefeitos ficavam assanhados e faziam os babões entregar o ouro à quadrilha.


O sabiá não me deixou escrever sobre a espionagem do Obama no Brasil e no mundo. Os americanos e todo mundo possuem esta tara de querer espiar, pelo buraco da fechadura, os pais fazendo amor. Freud já explicou essa fantasia infantil. O problema do Obama é que ele pode espiar a Dilma, mas duvido que deixasse a Dilma ver o sabiá dele. Dizem os jornais que a Dilma está pedindo à ONU o direito de ver o sabiá do Obama cantar. Isso pode ser o início da terceira guerra mundial.


O sabiá não me deixou escrever sobre o filme “O Tempo e o Vento” que teve estréia esta semana. Parece que a história do filme, e do Rio Grande do Sul, começou com o desejo de Ana Terra de querer ver o sabiá do índio Pedro Missioneiro. O sabiá, com seus poderes mágicos, engravidou Ana Terra e depois voltou para o céu dos passarinhos por causa de uma pedrada de bodoque dos irmãos da heroína.


Mas já que eu estou terminando a crônica sem falar do sabiá, vamos ao assunto. O sabiá é um sujeitinho pássaro que há mais de uma semana assovia na madrugada num pé de cerejeira. Tem um canto interessante, diferente. Entoa uma estrofe, faz uma pausa de colcheia, depois solfeja o arremate. Por culpa da primavera, o sabiá anda desesperado. Vai das cinco da manhã ao escurecer. Comecei achando bonito, agora enjoei com tanta insistência.


Googlei sobre sabiás. Sabiás cantam para atrair uma fêmea nestes tempos de primavera. Quando a fulana aparecer, deixará de cantar. Impossível assobiar e juntar com o bico ciscos para o ninho, ou, mais tarde, levar minhoca para os filhos...
O sabiá, como a gente, insiste dia após dia, e não se deixa abater porque se move pelo amor. Canta e olha ao redor para depois coletar ciscos para o ninho.


Entre boas e más notícias, entre novelas e jogos de futebol, vamos assoviando os dias. Falcatruas, poder, arte. Nada teria tanto encanto se não fossem os sabiás.


Tragédias e comédias, tudo são firulas da vida, tudo é cisco.

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