Um patrono cheio de histórias

O historiador Paulo Monteiro foi o escolhido para representar a 27ª edição da Feira do Livro

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Nem jornalista, nem historiador. Paulo Monteiro, apesar de ser considerado um pouco de ambos, se vê, na realidade, como um publicista - aquele capaz de escrever o que precisa ser publicado, uma espécie de intelectual do povo. Através primeiras palavras publicadas, há 45 anos, Paulo deu vazão ao que sentia. Foi ali, no primeiro semestre de 1968, que nascia uma paixão. Seja pela escrita ou pela oralidade, Paulo se declara um apaixonado pela história e pela literatura.

Tudo começou com um poema sobre Passo Fundo. Entre rimas e abordagem indígena, a professora de português explicou sobre licença poética e sobre os índios. Para Paulo, não foi suficiente. Ele queria saber mais. A professora indicou a biblioteca da escola. “Lá me fui, um menino de 13 anos, lendo livros. Minha curiosidade aumentou. Passei a entender as coisas. Através dos poemas, comecei a me interessar por história. A minha curiosidade me levou pelos caminhos da pesquisa histórica e da literatura”, relembra.

Hoje, já reconhecido na cidade, autor de cinco livros, membro da Academia Passo Fundense de Letras e um eterno poeta, Paulo consegue ver com maturidade a sua produção. Vigora, acima de tudo, a rigorosidade com o conteúdo. Combates da Revolução Federalista em Passo Fundo, por exemplo, demorou seis anos para ser escrito. O pai e o avô contavam histórias de um bisavô que lutava nos campos de batalha de uma guerra. “Ele teria participado da Batalha do Pulador e alguns detalhes que contavam eu não encontrei em livros. A curiosidade aumentou. Havia uma série de informações que não fechavam e, a partir disso, eu fiz uma investigação e durante seis anos investiguei dados de combate e da guerra.”

Além da curiosidade, a pesquisa acontece porque há pedidos ou, também, porque há a necessidade de unir informações. “Eu escrevo para ver publicado, para ser lido e entendido. As pessoas me consideram um historiador porque são 45 anos estudando”. A dedicação é intensa. Mesmo sem formação acadêmica, Paulo jamais deixou o estudo de lado. O seu objetivo não é ensinar sobre data, mas sobre fatos. “Não basta somente dizer que o Brasil foi descoberto em tal data e que a Proclamação da República foi feita em tal dia. É preciso se atualizar, trocar informações, reler e reescrever”, destaca. Na vida de Paulo Monteiro, o aprendizado é constante. “Ainda que eu viva a idade do Matusalém, os 900 e tantos anos, eu estarei sempre aprendendo. Sou um eterno estudante”.

O mergulho no mundo literário possibilitou a politização. Na década de 70, foi um dos que estiveram na linha de combate contra a censura. Em Passo Fundo, a repressão era promovida pelo Exército ou pela Brigada Militar. Paulo não foi preso, mas foi seguido por agentes do Serviço Secreto do Exército por causa da posição que assumia diante da sociedade. “Eu usei a poesia para me comunicar. Alguns deles estão no “eu resisti também cantando”. Foi uma forma de me expressar e de resistir enquanto eu combatia pela liberdade lutando em uma organização clandestina”, conta.

Homenagem merecida
Toda a personalidade de Paulo Monteiro resultou na homenagem que a 27ª Feira do Livro de Passo Fundo - que acontece a partir de hoje e segue até o dia 10 de novembro - apresenta ao público. Ser Patrono do evento o surpreendeu. “Jamais esperei ser convidado para Patrono da Feira do Livro. Eu reúno todas as características de um anti-patrono. Eu não tenho medo de expressar o que eu penso. A minha ideia de Patrono sempre foi de um cidadão concorde, de acordo com tudo que haja de mais comum, normal e rotineiro”. De fato, Paulo não é assim.

O objetivo é deixar um pouco da sua essência no público. “Serei lá, na Feira do Livro, o que sempre fui. Inconformado com tudo aquilo que signifique escravidão. Manuel Bandeira tem um poema onde ele diz que, em outras palavras, não acredita em nenhuma poesia que não seja libertação. Eu não acredito em nada que se fale e escreva que não seja libertação”, explica. Nesse sentido, a Feira do Livro é, segundo Paulo, um espaço dedicado à libertação. “Lá coexistem sob a forma de livros todas as ideias, todos o sonhos, todas as vontades, todas as projeções dos mais diferentes seres humanos”, comenta.
Há 27 anos, a Praça Marechal Floriano se preenche, a cada novembro, com livros e ideias. Sorte de Passo Fundo. “A Feira do Livro cumpre a sua função. Não é a toa que é a 27ª Feira do Livro. Se ela não cumprisse sua missão social, ela não teria sobrevivido por tanto tempo”, destaca.

Simples e sincero, Paulo Monteiro é a representatividade de uma cidade. Na fala calma que carrega a história,tem um pouco de professor, um pouco de amigo. Em uma conversa, uma aula. Uma ironia: aquele que dispensou os bancos acadêmicos talvez seja o que mais tem para ensinar. A Feira do Livro está bem servida, obrigado.

*Este texto foi editado para o Segundo Caderno Especial Feira do Livro. Para conferir na íntegra clique aqui. 

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