Na entrada do Teatro de Sesc um cartaz anunciava “Estações”, ilustrado com a imagem de uma locomotiva. De cara mexeu com uma velha carência passo-fundense, pois acabaram com nosso trem de passageiros. Casa cheia para conhecer o trabalho de Wagner & Cia. O grupo é liderado por Cláudio Wagner, um médico psiquiatra fascinado por música e poesia. Estações é uma viagem de trem. Aborda os sentimentos e as condições do ser humano. Tristeza, Loucura, Amor, Sexo, Solidão e Esperança deram nome às placas das estações. A cada partida uma poesia dava um rumo aos nossos pensamentos. No percurso entre as estações seguíamos embalados pela música. A cada parada uma aulinha bem didática sobre cada tema. Literalmente, uma viagem. O trem era coletivo, mas permitiu que cada qual ficasse no seu vagão, pois não saiu dos trilhos e respeitou as individualidades.
Foram felizes na montagem da locomotiva e das estações. Wagner é o maquinista, cuidou dos textos e do roteiro, cantou e declamou. Dividiu o palco com o violonista Guilherme Gambetta da Silva, o tecladista Julian Teixeira, o baterista Matheus Moresco e nos contrabaixos - o verdadeiro (que agora rebatizaram de acústico) e o elétrico - Matheus Pasquali. Estavam primorosamente bem ensaiados, como exigem essas viagens ferroviárias, para não comprometer a dinâmica do espetáculo. Ao molde dos sentimentos, o ronco da locomotiva também oscilou. Foi em marcha lenta nos duos em cordas, para acelerar na marcação em embaladas interpretações. Bonitos arranjos, com destaque para a embalagem caribenha que deram à ‘Mania de Você’. Ficou mais picante, sem perder a sensualidade e, de acordo com a estação, com muita pegada.
A troca dos cenários nos colocou na janelinha observando as estações. O figurino é aquilo que os editoriais de moda classificariam como “black and white style traditional”. Não tem como errar e, assim,Wagner & Cia ficaram bem na foto. Emoldurando o grupo, no teto estavam 14 minicastiçais. E à luz de 14 velas a plateia murmurou ‘Felicidade’, de Lupicínio. Foi uma escapadinha da cabine para um momento de cumplicidade. O repertório teve uma agradável seleção musical e poesias conhecidas ou bem garimpadas. E os textos? Simples, objetivos e elucidativos. Cláudio Wagner, como psiquiatra, abordou e esclareceu sobre sentimentos humanos. Isso porque, não importa a área, o conhecimento deve ser difundido. Explicou que solidão não é apenas estar só. Passou uma definição teórica de loucura. Mas, na prática, a loucura foi explícita no palco por Guilherme Gambetta, que moeu com as cordas dos violões e da guitarra. A arte é uma medicação profilática para o corpo e para a psique, além de atuar como preventiva aos males da ignorância. Wagner exerceu a psiquiatria fora do consultório, pois as estações passaram deixando um efeito terapêutico. Mas, ao final, confessou que aquilo tudo era a sua própria terapia. Não importa quem estava no divã. Foi bom para todos. Vamos agendar uma nova sessão?