Em 1993 e em 2005, os leitores de Passo Fundo tiveram a oportunidade de se encontrar com João Ubaldo Ribeiro. Nos anos 90, participou da 5ª edição da Jornada Nacional de Literatura e colaborou nos primeiros passos de um evento que mais tarde se consolidaria como uma iniciativa eficiente dentro da literatura. Em 2005, retornou para a 11ª edição do evento para discutir a diversidade cultural. Autor de clássicos da literatura nacional como "Viva o Povo Brasileiro" e membro da Academia Brasileira de Letras, o escritor baiano João Ubaldo Ribeiro morreu aos 73 anos no início da manhã desta sexta 18, vítima de uma embolia pulmonar, em sua residência no Leblon, no Rio de Janeiro. Clássicos, no entanto, nunca morrem, mas permanecem vivos nas memórias e nas de quem percorreu linhas escritas por eles.
Com João Ubaldo Ribeiro será assim. Suas obras ficarão marcadas na literatura brasileira, porque era assim que desejava que fosse. Pablo Morenno, escritor passo-fundense e colunista do Segundo Caderno, comenta que o estilo de João Ubaldo fará falta. “Era um dos poucos escritores ainda vivos que escrevia com brasilidade. Tinha no olhar, um jeito maroto, malandro, sempre pronto para uma piada. A geração de novos escritores carece de origem e deste bom humor, produzindo um texto insípido e metafísico, como se vivessem em uma aldeia esterilizada em autoclave”, explana. E é, justamente, o jeito malandro e o amor por aquilo que ganha vida no papel que fazem do autor um dos mais importantes nomes da literatura do país.
Quando falou ao público de Passo Fundo, em 2005, contou como foi o contato com o universo literário. Quando aprendeu a ler, ficou fascinado, angustiado, ansioso. Finalmente poderia ler as legendas das ilustrações de Gustavo Doré para Dom Quixote. Dali, João Ubaldo voou. Formou-se em direito, mas nunca exerceu a profissão. Preferiu escrever. Aos 21 anos, "Setembro Não Tem Sentido" ganhou as livrarias. O segundo livro foi "Sargento Getúlio", escrito em 1971, e que tornou-se uma de suas obras mais célebres, rendendo o primeiro prêmio Jabuti, no ano seguinte. O segundo prêmio seria por "Viva o Povo Brasileiro", romance que completa 30 anos em outubro deste ano. “João Ubaldo já ficaria na literatura brasileira se tivesse um único romance, “Sargento Getúlio”, ao meu ver, sua obra prima, mas ainda produziu um segundo, de grande valor literário “Viva o Povo Brasileiro””, opina Pablo.
Além do romance, João Ubaldo passou pela crônica e nela fez morada. Entre sarcasmo e ironia, colocou o bom humor e a leveza no gênero. “Sem dúvida, é um dos autores brasileiros de mais agradável leitura. No meio de tanta literatura chata que está sendo publicada, sentiremos falta de sua linguagem saborosa”, continua o colunista. Ao que tudo indica, a opinião não é apenas de Pablo, já que grande parte da obra de João Ubaldo foi traduzida para outros 15 idiomas. Chegou tão longe que, em 2008, foi o oitavo escritor condecorado com um Prêmio Camões, principal premiação da língua portuguesa. Na ocasião, disse estar feliz por acharem que cumpriu bem o seu papel. “É desta língua que vivo e nada mais me enaltece do que imaginar que esta língua me agradece", disse.
Fazia parte da Academia Brasileira de Letras desde 1993 e se tornou o sétimo ocupante da cadeira nº 34, na sucessão de Carlos Castello Branco.Há dois meses o escritor esteve internado por problemas pulmonares e ouviu de um de seus médicos o alerta de que deveria parar de fumar imediatamente. Não parou. Apesar das tentativas, o esforço resultou apenas na diminuição do vício. Quem perdeu, no fim das contas, foram os leitores que ficarão sem conhecer a obra na qual o escritor trabalhava há quase dez anos. Fica o sentimento de que há muito da sua obra que ainda precisa ser lido, conhecido e estudado. Ao lado dele, fica, também, o sentimento de tudo aquilo que poderia ter sido escrito e não foi. Adeus, João Ubaldo.