Rotineiro e sem significado, um simples banho ganha uma conotação carregada de sentido no palco do Teatro do Sesc nessa sexta-feira, durante a VI Mostra Sesc de Teatro: O Banho, peça apresenta pela Cia do Abração, propõe descontruir a ideia do banho como uma atividade prática e cotidiana para carrega-la de potencial simbólico. Em cena, o banho adquire conotações rituais e metafóricas inesperadas. A proposta é usar o banho como um convite para um mergulho na própria intimidade. Enquanto atores conduzem a cena no palco, o público, em seu lugar, é convidado a olhar para dentro de si e do seu próprio mundo. O Banho será apresentado na noite de hoje, às 20h.
Um novo significado
A metáfora usada se propõe a olhar para a vida de quem está assistindo ao espetáculo. O ato de banhar-se pode ser, por exemplo, uma espécie de desejo irrefreável e inadiável de renovação, expressado por uma pele seca, rachada e suja, ansiando por se molhar, dissolver a sujeira e, através da água, descobrir a nova vida. Pode ser, ainda, um ato capaz de apresentar os planos para uma vida que, rápida e inconscientemente, se cruzam com os valores carregados por cada um. Entre um banho e outro, relatos da vida de qualquer um. “Esta obra se utiliza de muitos recursos para tratar deste assunto [a intimidade]. Quer estéticos, quer da própria narrativa. São relatos que abordam dramas humanos, que podem servir de espelho para a plateia. Como um espelho, dentro de um banheiro, onde geralmente nos lavamos sozinhos, com nossa intimidade, como um espelho da alma. Talvez consigamos espelhar a alma do espectador”, inicia a diretora da Cia do Abração, Letícia Guimarães.
Desafio para palco e plateia
A proposta de mergulhar na intimidade e propor o mergulho é um desafio tanto para quem está em cena quanto para o público, desafiado a olhar para dentro de si e ver suas moralidades, desejos e lembranças. “Não há sentido fazer arte se não nos colocamos desafios”, enfatiza Letícia que acrescenta, ainda, que o maior dos atores é tocar a plateia através da subjetividade da arte. “É um desafio tocá-la através da sensibilidade. Principalmente uma plateia de hoje que está acostumada a não se comprometer. Apenas consome a arte por pura diversão. Por isto a importância de um trabalho sério de política cultural de formação de plateias. Acredito que o SESC de Passo Fundo aponta um caminho bem sério e responsável com a cidade. Passo Fundo tem, sem dúvida, uma plateia diferenciada”, elogia.
Uma tonelada de água
O desafio do ator vai além: encenado em um cenário-instalação, O Banho é construído com quase uma tonelada de água, delicadamente armazenada em saquinhos de água que produzem um efeito cristalino; é nesse cenário que atores usam do gesto para conseguir dizer o que querem. “Além de lidar com o estado, a princípio seco e sujo de barro e depois molhado, o ator tem que lidar com as sensações físicas destes estados e apropriá-las para as emoções da narrativa. Do drama, propriamente dito. Além de ser uma exposição profunda das suas almas e corpos”, comenta. “Há, também, trabalhos de canto, ao vivo, de percussão com o elemento água e uma série de demandas técnicas que exigem muito do trabalho do ator”, acrescenta.
Reflexão cotidiana
Por fim, em meio ao drama e à água, O Banho é um convite para a intimidade e para a reflexão do cotidiano. Prazer, cansaço, dor, alegria, brincadeira, regeneração, revitalização são alguns dos estados do corpo e da mente presentes no espetáculo. Assim, o banho deixa de ser uma atividade rotineira para ser um ato de purificação, de prazer e de renovação e, também, de construção da nossa inserção no mundo. “É um trabalho de extrema beleza e delicadeza, mas apenas para aqueles que estão dispostos a embarcar verdadeiramente em uma experiência artística”, conclui Leticia.
Serviço
O Banho
8 de abril, 20h, Teatro do Sesc