Lançado em 1985, o livro O Quatrilho, de José Clemente Pozenato, tornou-se filme em 1995 sob a direção de Fábio Barreto e concorreu, no ano seguinte, ao Oscar de melhor filme estrangeiro. A exposição no cinema fez ainda mais conhecida a história dos dois casais de descendentes italianos que constroem suas vidas no interior do Rio Grande do Sul no início do século XX. A obra também já foi adaptada para os teatros e, em 2018, ganhou ainda uma versão em ópera, que reuniu um público de mais de seis mil pessoas em sua primeira turnê. Agora, rodando pela segunda vez com o espetáculo, a trupe chega aos palcos de Passo Fundo neste sábado (15), às 20h, no Teatro Notre Dame.
A apresentação já cativou o público passo-fundense na primeira turnê, no entanto, neste ano, chega com algumas novidades. Dividida em dois atos, com música de Vagner Cunha e libreto de José Clemente Pozenato, a peça ganhou mais quinze minutos de repertório com a inclusão de três novas músicas: uma ária de Flávio Leite, uma ária de Ricardo Barpp, além de um coro que será encenado por Barpp junto com Luciane Bottona e Pedro Spohr. Somadas às outras 29 canções que já faziam parte da apresentação, as músicas trazem uma nova costura para a obra. "Ao ver o resultado final da ópera, pronta, eu senti que precisávamos humanizar um pouco mais os personagens. O Pozenato já havia feito o trabalho de síntese do livro de forma brilhante, mas sentimos que algumas costuras precisavam ser feitas para conectar os casais de forma mais humanizada, então nos reunimos para adicionar algumas árias", explica Vagner. A regência é do maestro Antonio Carlos Borges-Cunha e a direção cênica de Luís Artur Nunes.
Unindo elementos musicais à arte teatral, a versão em ópera de O Quatrilho é fiel ao romance publicado em 1985, cujo enredo, baseado em fatos reais, retrata o cotidiano e a realidade dos imigrantes no Sul do Brasil no início no século XX, deixando claro o poder da mulher nas decisões de família e também de negócios. A história acontece em 1910, numa comunidade rural de imigrantes italianos, quando dois casais se unem para sobreviver e decidem morar na mesma casa. Com o tempo, a esposa de um passa a se interessar pelo marido da outra, sendo correspondida. Os dois amantes decidem fugir e recomeçar outra vida, deixando para trás seus parceiros, que viverão uma experiência dramática e constrangedora, mas nem por isso desprovida de amor. O título faz analogia ao jogo do quatrilho: jogo de cartas onde os parceiros se trocam ao longo da partida. Tudo pode acontecer nesse jogo.
Ópera acessível
Produzida inteiramente no Rio Grande do Sul, a ópera O Quatrilho tem elementos cênicos que remetem ao estilo de vida dos imigrantes italianos que viveram na área rural do Estado no início do século XX. Os figurinos, assinados pela porto-alegrense Malu Rocha, são compostos por cerca de 30 peças produzidas em cores frias e terrosas, retratando as personalidades dos protagonistas da trama. O cenário, desenhado pelo cenógrafo Rodrigo Lopes, mostra o interior e ao mesmo tempo o exterior de uma casa colonial italiana. O uso de lambrequins, adorno arquitetônico de madeira recortada muito utilizado nas residências dos imigrantes italianos, e de pintura de madeira junto com um céu formam o espaço cênico.
À essa produção, junta-se uma equipe igualmente grandiosa, composta por 12 músicos e sete cantores, que passaram cinco semanas ensaiando antes de entrar em cena pela primeira vez. Uma experiência um tanto desafiadora, segundo a soprano Carla Maffioletti, responsável por interpretar a personagem protagonista Teresa. “Essa é uma peça muito complexa porque une música e teatro. Nós, cantores de ópera, precisamos fazer as encenações como em uma peça de teatro. É um espetáculo completo. Para isso, nós fizemos um trabalho com o diretor de teatro Luís Arthur Nunes. Essa é a primeira ópera dele, então ele trouxe para a gente uma experiência de trabalho que foi muito positiva. Nós estudamos o romance original e começamos a fazer laboratórios teatrais para realmente incorporarmos os personagens, pensando, sentindo e agindo de uma maneira super orgânica em relação a eles”, comenta Carla.
Embora o termo “ópera” possa, de certa forma, espantar o público que não está acostumado a consumir este conteúdo, Carla garante que não há restrições para assisti-lo. “A música é muito bonita e muito acessível, até para o pessoal que pensa que a ópera é difícil e complicada. Ela vai ser cantada em italiano, mas passam legendas em texto com a tradução simultânea, e toda a parte de diálogos do espetáculo será feita em português. Então é uma peça muito dinâmica. Tem momentos mais alegres, uns muito românticos, outros de muita energia. Para nós, é uma satisfação muito grande levar uma obra tão linda e tão coesa para o interior do estado, em teatros que muitas vezes só estão acostumados a receber consertos”.
A cantora e atriz faz questão, também, de lembrar que não se trata de uma narrativa negativa, mesmo que a troca de casais remeta a discussões sobre traição. “A minha personagem, Teresa, é aquela que simboliza o coração. Ela acaba se encantando pelo marido de sua prima Fiorina, o Mássimo, que é uma pessoa muito culta, diferente do marido de Teresa, Ângelo, que só pensa em negócios e que viaja muito. Na verdade, eles têm muita afinidade porque a Teresa é uma pessoa muito curiosa sobre a vida, ela quer voar e se libertar dessa vida no campo porque tem outras aspirações. E ele também. São duas almas que se encontram, mas não tinha como enfrentar a situação. Não tinha divórcio naquela época. Como você vai resolver um amor impossível, que não vai ser compreendido? Então eles fogem e deixando os outros companheiros na colônia, mas a ópera é muito positiva porque a Fiorina e o Ângelo acabam ficando juntos também. Na verdade, eles até combinam mais”, adianta.
Serviço
O que: O Quatrilho
Quando: 15 de junho, às 20h
Onde: Teatro Notre Dame
Classificação: Livre
Ingressos: entre R$ 35 e R$ 70, no site blueticket