Desde que precisou diminuir a frequência com que colocava o pé na estrada para poder cuidar da esposa, diagnosticada com Alzheimer há uma década, o compositor e violonista Lúcio Yanel tem enfrentado dificuldades financeiras. Argentino radicado em Caxias do Sul, Yanel é considerado um dos maiores expoentes da música folclórica latino-americana, sendo referência para o trabalho de grandes músicos gaúchos, como Yamandu Costa. Mas hoje, embora vez ou outra Yanel ainda suba aos palcos, é a companheira Sueli de Fátima quem mais presencia os poderosos acordes do músico de 73 anos. Comovidos com o fato, um time de músicos passo-fundenses realiza neste sábado (26) o show beneficente “Todos por Yanel”, no Rito Espaço Coletivo, a fim de levantar fundos para o artista.
A situação de Yanel se tornou conhecida em janeiro deste ano, quando o músico compartilhou em suas redes sociais uma foto em que aparece sentado em frente à esposa, segurando o instrumento que o acompanhou durante boa parte da vida. “Já faz alguns anos que o maldito Alzheimer vai me roubando a minha amada companheira. E para que me sinta ao seu lado, minhas serenatas diárias", escreveu Yanel na legenda que acompanha a imagem. Os dois se conheceram no início dos anos 90, em Porto Alegre, e desde então compartilham uma história de companheirismo que aos poucos é apagada da memória de Sueli à medida que a doença progride. Conforme o argentino relata quando fala sobre o assunto, as serenatas têm servido como uma forma de reafirmar o laço amoroso do casal em meios às dificuldades diárias enfrentadas por Sueli até mesmo para desenvolver tarefas simples – realidade que tem exigido a dedicação cada vez maior de Yanel para com a mulher.
Uma figura adorada no meio musical
Vivendo da música desde que chegou ao Brasil, tendo Passo Fundo como sua porta de entrada no início dos anos 80, Yanel tem observado sua renda diminuir à medida que a disponibilidade para se dedicar à carreira também reduz – embora ele deixe claro que não se arrepende da escolha. Desde que abriu o jogo sobre o sofrimento que vive ao assistir a esposa sofrer as consequências do Alzheimer, a solidariedade tem sido despertada em dezenas de artistas que têm Yanel entre suas principais referências. O resultado disso é uma série de shows coletivos e beneficentes que vêm sendo realizados em diversos cantos do Rio Grande do Sul em homenagem ao argentino.
“O Lúcio influenciou gerações de músicos. Ele é muito querido por todos, então a vontade de ajudar acabou partindo de muita gente. Aqui em Passo Fundo, eu comentei sobre a ideia de também montar um show e logo o Rito Espaço Coletivo abriu as portas para fazermos lá”, conta Ghadyego Carraro, que tem organizado a atividade no município. Ainda de acordo com o artista, a ação é uma maneira de retribuir a contribuição inestimável de Yanel. “Ele tem um papel fundamental na evolução da música sul-americana e gaúcha. A música gaúcha tem uma sonoridade compartilhada com o Brasil, o Uruguai e a Argentina – e o Lúcio teve uma contribuição enorme em expandir essa bagagem com a influência argentina que ele trouxe para nós. Ao se fixar no Rio Grande do Sul, ele influenciou o nosso som através de ritmos como a milonga e o chamamé. Ele é um marco fundador para que chegássemos nessa sonoridade e nos mostrou que é possível estabelecer uma mistura entre culturas, ao tocar folclore da sua terra enquanto dialoga com a música do mundo”.
Além de Ghadyego, se apresentam no show “Todos por Yanel”, neste sábado (27), os músicos Giú Sanderi, Júnior Sanderi, Ricardo Pacheco e Alisson Silva. “Esse time de música que montamos vão funcionar como a banda base. A ideia é começar com o time tocando obras sul-americanas em geral e depois deixar o palco aberto para quem quiser participar”, explica. Quem tiver interesse em assistir, basta comparecer ao Rito a partir das 20h. A contribuição para entrada é espontânea.