Com a generalização do SAMU192 em todos os estados, o Brasil tem hoje a maior rede de Serviço de Atendimento Móvel de Urgência do mundo, com mais de 190 unidades em todo o país. A implantação do projeto no país teve como um de seus principais atores o médico passo-fundense Paulo Ernani Rezende de Rezende, que tomou como inspiração o modelo francês de atendimento a casos de urgência. Em sua autobiografia, lançada recentemente no Brasil, Rezende, hoje com 80 anos e radicado na França, revela os bastidores deste grande projeto e detalhes de sua trajetória profissional, bem como sua atuação política – que o levou ao autoexílio na década de 60. O livro “Do Pinheiro Torto ao vasto mundo” está disponível nas livrarias e no site da Libretos Editora.
Na obra, Rezende afirma considerar a implantação do SAMU192 no Brasil, após o ano de 1995, como uma grande aventura. “Muitas vezes, eu me pergunto: como é que um brasileiro (depois também francês, a partir de 1979) que chegou à França como exilado político e terminou conselheiro de diferentes ministros da Saúde, tanto de esquerda quanto de direita, participou dessa jornada magnífica? Até hoje tenho muito orgulho dessa aventura”, compartilha.
Rezende obedecia o confinamento imposto durante a pandemia do coronavirus, em Strasbourg, na França, quando finalizou suas memórias. Ele viria ao Brasil para o lançamento do livro, tanto em Passo Fundo quanto na Feira do Livro de Porto Alegre, mas os planos precisaram ser adiados.
Grandes feitos pelo mundo afora
Rezende saiu de Passo Fundo, no interior do Rio Grande do Sul (de uma região chamada Pinheiro Torto, que deu nome à propriedade de seus antepassados), muito jovem, com 19 anos. Em 1960 partiu para Moscou, na Rússia, para cursar Medicina na Universidade da Amizade dos Povos Patrice Lumumba (UAPPL). Mais tarde se tornou membro da Comissão de Saúde Nacional e participou ativamente da construção do sistema francês de saúde.
Na África, foi um dos líderes do programa Esther para atender as pessoas vivendo com o HIV. Paulo Ernani Rezende de Rezende sempre teve um amor instintivo pelas viagens, tendo conhecido todos os continentes, exceto Antártica e Oceania. Nesta autobiografia registra sua trajetória e, revendo suas memórias, pôde comprovar que foi persistente na busca de unidade entre ação e pensamento, desde quando saiu do Pinheiro Torto para enfrentar e conhecer o mundo.
Na obra, o médico apresenta também a experiência dos sistemas de urgência franceses na ocasião dos atentados em Paris, em 2015, em material da revista The Lancet, e trata também da diáspora de brasileiros que fugiram para a França na década de 1960.
Uma trajetória de forte atuação política
Em tempos de Guerra Fria, corrida espacial e grandes tensões, Rezende sempre se manteve atuante, dentro e fora da universidade. Naqueles momentos de efervescência política internacional, especializou-se, na França, como médico anestesista reanimador e retornou a um Brasil diferente, no ano de 1967, em meio a uma ditadura militar. Rezende chegou a ser preso em Porto Alegre e em São Paulo, mas optou pelo autoexílio, tendo, inclusive, obtido a cidadania francesa. Na época, filiou-se ao PS (Partido Socialista).