Renovar a política com qualidade ainda é o melhor caminho, diz Mateus Bandeira

Bandeira é pré-candidato a governador do Rio Grande do Sul pelo Novo

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Cientistas sociais apontam a eleição de 2018 como uma incógnita. Como reagirá o eleitor indignado com a política tradicional, depois de tantos escândalos de corrupção e má gestão do dinheiro público? Muitas são as análises, mas a grande maioria concorda que a depuração ética e a reconstrução do país que queremos passam, inevitavelmente, pela política. Essa também é a opinião de Mateus Bandeira, pré-candidato a governador do Rio Grande do Sul pelo Novo. 

Apesar de nunca ter concorrido a um cargo político, Bandeira tem credenciais de gestor que o distinguem dos novatos. Aos 48 anos, com 30 anos de experiência profissional na iniciativa privada e no setor público, Mateus Bandeira foi diretor do Tesouro Estadual, secretário de Estado do Planejamento e presidente do Banrisul, sem contar sua experiência no Ministério da Fazenda e Senado Federal. Entre 2011 e 2017, comandou a FALCONI – Consultores de Resultado, a maior consultoria de gestão do Brasil. Atualmente, integra os Conselhos de Administração do Banco Pan, da Terra Santa Agro e do Hospital Moinhos de Vento.

Confira a entrevista com Mateus Bandeira:

 

Como o senhor avalia o surgimento de candidatos de fora da política? O senhor se considera um outsider?

É importante que exista cada vez mais participação de cidadãos que vêm de fora da política tradicional. O sistema político tradicional faliu, os partidos políticos estão desacreditados. Assistimos a uma crise política e moral, de valores, e como consequência tivemos a maior recessão da nossa história, com 14 milhões de desempregados. Com tantos episódios de corrupção, todos os brasileiros passaram a conhecer os verdadeiros meandros da política. As pessoas estão indignadas, saturadas com o que conhecem hoje. Mas o pior que poderia acontecer seria a negação da política, pois qualquer solução para os problemas do país passa necessariamente pela política. Só vai haver renovação com novos candidatos, pessoas que venham de fora do sistema atual. Mas só isso não é suficiente: devem ter também trajetória, conhecimento, experiência comprovada e capacidade de realização.

 

O senhor foi presidente do Banrisul. Qual sua avaliação sobre o banco?

Se hoje o Estado não tivesse um banco e o governo falasse: “vamos abrir um banco”, quem seria o maluco para defender uma ideia como essa? Ninguém. Não seria razoável usar recursos de impostos para capitalizar uma empresa do sistema financeiro. Agora, já existe um banco. Tem 90 anos. Deu uma contribuição importante para a economia gaúcha, em diversos momentos da história. Quando houve pouca liquidez de recursos no sistema financeiro, foi importante para salvar empresas locais. A grande vantagem do Banrisul é que ele está próximo das empresas gaúchas e tem um conhecimento melhor da economia. Ainda assim, a pergunta que cabe é: “faz sentido o Estado manter um banco?”.

 

Você acha que a privatização do banco é um bom caminho?

Alguns contrários à privatização dizem que não vale a pena privatizar o Banrisul porque dá lucro. E como ele dá lucro, é melhor que a gente usufrua do fluxo de dividendos permanente que ele pode gerar. Pode ser um argumento válido. Mas vamos discutir: ele dá lucro o suficiente para remunerar o capital que está empregado lá? No passado, já deu lucro numa proporção maior que hoje. No mercado se mede o grau de eficiência de um banco pelo retorno que ele dá em proporção ao patrimônio. O banco, no passado, retornava algo cerca de 20% do patrimônio. Hoje, ele retorna 10%. O custo da nossa dívida é de mais 10%. Será que o retorno que ele dá hoje, que é menor do que o custo da dívida, justifica empregar esse capital lá? Ele pode dar um retorno maior? Pode, mas tem que ser eficiente, disputar espaço no mercado, e precisaria estar livre das amarras estatais – disputa permanente de espaço por partidos políticos e representações de empregados. O que é improvável enquanto o controle for estatal. Aliás, o banco só existe com o grau de eficiência que tem hoje porque é a única estatal que atua num mercado competitivo.

 

Na sua visão, então é diferente dos casos da CEEE, Sulgás e CRM, por exemplo?

Bem diferente. O banco não tem domínio de mercado. Tem a vantagem de operar com a folha dos servidores públicos, dos aposentados, dos municípios. Mas ele disputa o mercado de crédito com outros bancos. Tem outro argumento muito utilizado que é o da concentração bancária. É um problema, o sistema financeiro é muito concentrado, são três, quatro grandes bancos que têm 80% do crédito no país. É ruim, mas não é papel do Estado do RS resolver isso. É do Governo Federal, com mais estímulo à competição e com menos restrição à entrada de novos players no mercado. Num programa de privatização, o Banrisul não seria o primeiro da fila, porque existe espaço para melhorar o grau de eficiência do banco e o retorno que ele entrega hoje. Portanto, se ele vier a ser privatizado, quanto melhor for o resultado dele, maior será o resultado que o Estado poderá obter.

 

Qual é a sua posição sobre a proposta do governo Sartori de vender as ações do Banrisul?

É o pior dos mundos. De um lado, diz que não pode privatizar o banco porque ele dá lucro, entrega fluxos de dividendos. Por outro, quer vender as ações, que é justamente o que gera os dividendos. Quer colocar um terço à venda abaixo do valor patrimonial, dado o valor que hoje o banco está negociando na bolsa. Isto é um crime. Porque ele vai vender algo que poderia valer três ou quatro vezes mais numa outra situação. Quando a Yeda fez o processo de abertura de capital do banco, as ações foram vendidas a uma razão de quatro vezes o valor patrimonial. Hoje, o banco está numa situação em que vende a 80% do seu valor patrimonial. Portanto, se ele for vendido nos valores de hoje, será a um quinto do que foi em 2007, em termos relativos. É um péssimo negócio. Entre privatizar e não privatizar, o pior dos mundos é não privatizar e vender as ações.

 

O Novo se posiciona de maneira contrária ao fundo partidário. Então, o que partido faz com os recursos que recebe do fundo?

Nada. Está estudando uma forma de devolver os recursos à sociedade. Se o Novo devolvesse os recursos hoje, este valor seria redistribuído para os outros partidos. Eu gosto de fazer a relação com os clubes de futebol e igrejas. São organizações privadas como os partidos políticos. Eles precisam ser financiados por doações ou trabalho voluntário dos seus apoiadores, de quem acredita nas suas ideias. Porque imagine o seguinte: o torcedor do Internacional pode, voluntariamente, financiar o clube. Mas ele não vai querer dar dinheiro para financiar o Grêmio. Eu, que sou torcedor do Brasil de Pelotas, não quero financiar nem Grêmio ou Inter. Mas eu pago uma contribuição ao Brasil porque gosto, acredito no time. Hoje, em relação aos partidos, a gente paga para todo mundo, inclusive para os partidos que não representam ninguém e foram operadores dos grandes esquemas de corrupção. Todos nós, compulsoriamente. Veja o exemplo deste recente encontro nacional do PSDB, em Brasília, que custou R$ 1,5 milhão. Das passagens de avião ao hotel, do frigobar aos canapés, tudo fomos nós que pagamos, com recursos dos nossos impostos. Pouca gente sabe disso.

 

Dentro do espectro político, você se considera de esquerda, centro, direita?

Não gosto dessas definições, porque são completamente ultrapassadas. Prefiro acreditar em ideias, valores e princípios. O que eu acredito na economia me coloca no campo do liberalismo. O importante é: o Estado não produz nada e deve se restringir àquilo que é sua função indelegável, por exemplo a segurança pública. Quanto mais tiver foco nessas funções básicas, maior a probabilidade de conseguir fazê-las bem feito. Outro exemplo: saúde é um serviço fundamental e que exige intervenção do Estado, porque o mercado não resolve tudo. Não vai garantir acesso à saúde para quem precisa dela e não pode pagar. O Estado precisa garantir acesso à saúde para essas pessoas, mas isso não significa necessariamente construir hospitais ou postos de saúde. Os políticos tradicionais gostam disso, de inaugurar obras, que depois não funcionam adequadamente. Por que, ao invés disso, o Estado não pode oferecer um plano de saúde privado para quem não pode pagar? Mas obviamente que também tem muito espaço para melhorar a gestão dos hospitais e postos de atendimento que já existem hoje e das organizações que recebem recursos públicos.

 

E qual a sua visão sobre a educação?

É a principal ferramenta de ascensão social. No entanto, o Estado não precisa, necessariamente, construir escola ou universidade e contratar professor para garantir o acesso à educação. Vide, por exemplo, o ProUni, programa implementado pela esquerda que garante acesso à universidade para quem precisa e não tem como pagar. Isso pode ser feito, também, no Ensino Fundamental. O Estado brasileiro deveria ter foco muito claro nessa etapa, como fez a Coreia do Sul 50 anos atrás. É um erro o Estado investir muito mais per capita no Ensino Superior do que no Ensino Fundamental. O ensino público superior gratuito para todos é uma política de preservação das desigualdades, porque é o pobre pagando o estudo do rico.

 

Como foi sua passagem pelo governo Yeda?

Foi uma grande escola e uma grande oportunidade, porque foi o melhor governo da história do Rio Grande do Sul. Foi o governo que enfrentou corretamente o problema do desequilíbrio fiscal, e isso desde a eleição. Ela foi eleita falando que faria o ajuste fiscal, que adotaria um princípio básico de austeridade, com o Estado só gastando aquilo que arrecadava, e foi o que a gente fez. Eu assumi a liderança do Tesouro Estadual no início do ajuste. Entre 2007 e 2008, foi feito um grande esforço para redução das despesas de custeio, e de melhoria da eficiência do gasto público. Na sequência, depois de alcançado o reequilíbrio fiscal, assumi a Secretaria do Planejamento e Gestão. O Estado voltou a pensar em programas estruturantes, que pudessem contribuir para a retomada do crescimento. O planejamento teve um papel de protagonismo nisso, por conta do Programa de Parcerias Público-Privadas e da estruturação dos principais programas de investimento do Estado.

                                                                                      

 

 

Como o senhor avalia a crise de segurança pública em todo o país?

A escalada da criminalidade nos últimos anos é essencialmente um reflexo da incapacidade dos estados e do governo federal de proporem e implementarem políticas de segurança pública efetivas. A função mais básica do Estado é garantir as liberdades individuais e o direito à vida e à propriedade. Está falhando nisso. Segurança pública envolve pelo menos três pilares: policiamento ostensivo nas ruas; polícia judiciária e legislativa, responsável por realizar os inquéritos, identificar autoria dos crimes e propor o indiciamento; e política penitenciária, responsável por garantir que as pessoas condenadas pela Justiça possam cumprir suas penas. Os governos, de uma forma geral, estão falhando nos três pilares. Por décadas, não investimos adequadamente num sistema prisional que pudesse cumprir sua função. Ou seja, garantir que criminosos de alta periculosidade condenados cumpram sua pena, e que a sociedade esteja protegida de suas ações. E que os outros criminosos com chance de recuperação possam cumprir sua pena com um mínimo de capacidade de ressocialização. O nosso sistema penitenciário é falido. Temos uma série de pessoas que foram condenadas e não estão presas. E aqueles que estão presos estão condenados a viver em uma escola do crime. Se o Estado deixar de fazer o que não é seu papel, poderia e deveria priorizar a segurança pública. Segurança pública é importante para o bom funcionamento do ambiente de negócios e para que as pessoas possam andar livremente nas ruas e desenvolver plenamente seu potencial.

 

E como ter uma polícia estruturada, que consiga proteger as pessoas e inibir os crimes?

É possível melhorar bastante a eficiência do sistema com uso intensivo de tecnologia e com boa gestão. No entanto, temos um problema estrutural que precisa ser resolvido. Hoje temos um regime especial de aposentadoria para os policiais, que se aposentam com 25, 30 anos de serviço. Cada vez mais pessoas se aposentam precocemente, gerando cada vez mais pressão sobre o orçamento, o que impede que os governos consigam repor o efetivo das polícias no mesmo ritmo em que essas pessoas se aposentam. No caso da Brigada Militar, chegamos a ter 40 mil pessoas no efetivo. Hoje, são 17 mil. É evidente que, sem polícia na rua, o criminoso tem incentivo para cometer crimes. Isso vale para a Polícia Civil também. A criminalidade não é fruto de problema social. Basta ir a uma favela e ver que a grande maioria das pessoas vive corretamente, procura trabalho e não envereda para o crime. O ingresso na criminalidade é uma opção de cada pessoa.

 

Em 2009, causou polêmica uma declaração sua de que “cada real gasto com um desembargador será um real a menos para um brigadiano ou professor”. O senhor mantém essa opinião?

Evidente, essa é a coisa mais óbvia do mundo. Cada real gasto em qualquer uma das áreas do governo será um real a menos para as outras, porque o dinheiro dos impostos é único. O orçamento é único. Se a gente gastar mais com infraestrutura ou com salários de determinada categoria, será menos recursos para investir em saúde, educação ou segurança pública. Isto é fato e só gera polêmica com aqueles que se veem ameaçados em seus recursos blindados, com seus privilégios. Mas cada vez mais as pessoas se conscientizam disso.

 

 

O senhor é favorável à flexibilização do Estatuto do Desarmamento?

Sim. Não vejo por que razão o Estado possa impedir que o cidadão tenha uma arma em sua casa para se defender. Principalmente no Rio Grande do Sul, que é um estado com um histórico, uma tradição de defesa da fronteira. E um estado onde o setor primário é muito importante. Existem muitos produtores rurais que estão afastados da cidade e não têm a proteção do policiamento ostensivo. O fato de o cidadão ter uma arma em sua casa para se defender é um direito que deve ser respeitado.

 

E quanto à redução da maioridade penal?

Também sou a favor. É uma incoerência que a gente considere uma pessoa apta a votar aos 16 anos, mas inimputável do ponto de vista criminal. Quer dizer, a pessoa pode votar e escolher o mandatário, mas se ela cometer um crime, não pode ser punida. Isso é um absurdo.

 

Como o senhor avalia o Bolsa-Família e políticas de assistência social e distribuição de renda?

Bolsa-Família talvez seja uma das políticas sociais mais efetivas que o Brasil já implementou. Por duas razões. Primeiro, porque é focado em quem realmente precisa: famílias com renda per capita menor que ¼ de salário mínimo recebem. Existe muita pobreza no nosso país, e é papel do estado retirar as pessoas dessa condição. Segundo, ao entregar o recurso para a pessoa, dá liberdade para gastar como ela bem entender. Esse é o melhor a fazer. Alguns gastam em alimentação, outros em remédio, outros no que é da sua necessidade. Além disso, gasta-se muito pouco com Bolsa-Família. São mais de 40 milhões de pessoas alcançadas, ao custo de 20 bilhões de reais. Para comparação: só o ganho real do reajuste para os servidores federais da União, este ano, será da ordem de R$ 20 bilhões. O Bolsa-Família é uma política que precisa ser preservada e aprimorada, em conjunto com estados e municípios, podendo haver complementação. A importância do programa deveria ser medida de acordo com o número de pessoas que saem, não que entram.

 

Em uma outra entrevista, o senhor disse que o Novo é o partido mais social do Brasil. Por quê?

Os valores e princípios em que acreditamos na economia, alguns até podem dizer, nos colocam no campo liberal. E o que significa isso? Defendemos um Estado menor, focado naquilo que é essencial, com menos burocracia, menos intervencionismo, menos regulamentos e normas. Menos intervenção desnecessária vai estimular o empreendedorismo, para que as empresas possam trabalhar mais livremente. Acreditamos em um Estado que defenda menos privilégios. Estado mínimo e cidadão máximo. Ao defender esses conceitos práticos, que geram emprego, renda e atenção a quem precisa, o Novo se torna o partido mais social do Brasil.

 

O Novo é um partido ligado a grandes empresários?

Esse é um equívoco. O Novo surgiu de pessoas e cidadãos comuns, indignados com os rumos do país, mas que acreditam que a política é o caminho para mudar. O Novo foi fundado em 2011, mas obteve o registro definitivo em 2015. Participam um conjunto de pessoas dos mais variados espectros da sociedade, pequenos e médios empresários, executivos, dentistas, advogados, médicos, contadores, estudantes. Tem de tudo. O Novo talvez seja o partido que melhor representa o estrato social brasileiro.  A maioria dos outros partidos não representa o conjunto da sociedade. E a maior prova disso é que o Novo se sustenta, exclusivamente, com as contribuições voluntárias dessas pessoas. São 15 mil filiados. Hoje, todos eles, indistintamente, pagam a contribuição mínima de R$ 28. Então, o Novo não é um partido de grandes empresários.

 

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