Sistema S: impacto no corte de gastos ainda é incerto

Segundo especialistas, é cedo para prever se a redução entre 30% e 50% no repasse de recursos para a manutenção das entidades que formam o Sistema S será benéfica

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Economista Julcemar ZilliEconomista Julcemar Zilli
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O anúncio do atual ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre a previsão de cortes entre 30% e 50% nos repasses de recursos feitos ao Sistema S tem dividido opiniões. Há menos de um mês, ao falar a respeito do fim da obrigatoriedade da taxa sindical, Guedes disse ser necessário “meter a faca no Sistema S”, para que este se adeque à redução de custos do atual governo. Para especialistas, se, por um lado, a medida é capaz de desonerar a folha de pagamento das empresas, por outro, ela prejudica o conjunto de organizações que formam o sistema. Presidente do Sistema Fecomércio/Sesc/Senac do Rio Grande do Sul, Luiz Carlos Bohn acredita que a mudança implicará na demissão de funcionários e na redução dos serviços oferecidos à classe trabalhadora.


O Sistema S é constituído por entidades corporativas voltadas para treinamento profissional, assistência social, consultoria, pesquisa e assistência técnica. Essas organizações são mantidas com recursos provenientes de uma contribuição compulsória paga pelas empresas sobre suas folhas de pagamento. A alíquota varia entre 0,2% e 2,5%. Após o pagamento da contribuição fiscal ao governo, os recursos são passados integralmente ao Sistema S e devem, em contrapartida, ser investidos na qualificação profissional e de vida dos trabalhadores. Em 2018, o repasse total ao sistema ultrapassou R$ 17 bilhões.


Embora ainda não seja claro sob quais moldes a proposta será aprovada, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), uma das entidades que integram o sistema, já estima que se a redução de 30% nos recursos oriundos da arrecadação se confirmar, serão extintas mais de 1 milhão das vagas para cursos profissionalizantes oferecidas anualmente. O presidente da Fecomércio-RS pondera que o sentimento é ambíguo. “Recebemos a notícia ao mesmo tempo com preocupação e responsabilidade. Somos favoráveis a desonerações da folha de pagamento, se a intenção é de fato essa, mas seríamos completamente contrários se o governo decidisse usar esse recurso para cobrir o déficit orçamentário, como chegou a ser comentado em informações truncadas, porque aarrecadação do Sistema S tem uma destinação específica e estaria sendo desvirtuado o motivo pelo qual ela foi paga pelo empresário”.

 

Ainda conforme Bohn, o governo deveria analisar a redução no custo da folha de pagamento para as empresas a partir de outros tributos. “Existem encargos bem maiores sobre a folha do que aqueles destinados ao Sistema S. Claro que somos contra a carga tributária, mas a gente tem que olhar onde a carga tributária dá menos resultado. É preciso ver o custo-benefício. Eu posso dizer que se o governo tirar esses recursos, milhares de trabalhadores, de todos os segmentos representados pelo Sistema S, vão perder um serviço eficiente e muito mais barato”. Na percepção do presidente, o futuro ainda é bastante incerto, mas a previsão de prejuízos é inegável. “O Sesc, por exemplo, se perder isso que foi falado, terá dificuldade para manter muitos teatros, festivais, jogos de verão. Somente no ano passado, no Rio Grande do Sul, nós tivemos cinco mil espetáculos culturais. Todas essas atividades, que atendem milhares de adultos e comerciários, sofreriam. E eu não descarto a redução da força de trabalho. Tem pessoas que a gente vai precisar dispensar”, lamenta.

 

“Você tem um ganho financeiro por um lado, mas perde por outro”
O economista e professor da Universidade de Passo Fundo (UPF), Julcemar Zilli, concorda que a medida precisa ser encarada sobre duas óticas e que “ainda não é possível saber se o ganho será maior que o prejuízo”. Nas palavras dele, perde-se por um lado e ganha-se de outro. Sob uma primeira perspectiva, o especialista analisa que a proposta de redução do valor que as empresas retiram do salário dos funcionários e repassam para o governo, a fim de encaminhar ao Sistema S, possibilitaria a sobra de mais recursos para as empresas privadas. “Isso, teoricamente, beneficia o trabalhador também. Se a empresa deixar de pagar a contribuição ao Sistema S, ela deixa de cobrar da folha de pagamento do trabalhador. Esse recurso poderia aumentar o valor do salário”, exemplifica.


Do outro lado da moeda está o fato de que, com o fechamento de vagas nos serviços oferecidos pelo Sistema S, o trabalhador não poderá mais contar com essas entidades para buscar qualificação, cultura, atividades artísticas e lazer. “Você tem um ganho financeiro por um lado, mas perde por outro. Aí entraria a questão do incentivo que o programa do governo prevê às empresas que investem na qualificação do trabalhador: elas pagam menos imposto”, observa. Assim, segundo Zilli, a alternativa para equilibrar os aspectos positivos e negativos seria que as empresas utilizassem recursos que deixariam de incidir sobre a folha de pagamento e repassassem para o próprio trabalhador na forma de atividades de capacitação e cursos de especialização. “É muito incerto. A gente realmente vai ter que esperar para ver como será essa proposta e como ela será implementada - se for realmente implementada”, finaliza.

 

Entidades que fazem parte do Sistema S
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai); Serviço Social do Comércio (Sesc); Serviço Social da Indústria (Sesi); Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio (Senac); Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar); Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop); Serviço Social de Transporte (Sest); Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Senat); e Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

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