Dedicação, competência e cidadania

O ciclista Ricardo Machado completa 28 anos de carreira com muitas conquistas e lições de vida

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Natural de Lagoa Vermelha, o ciclista Ricardo Machado ao longo de seus 28 anos de carreira, traz no seu currículo muito mais que conquistas. O atleta de 48 anos é exemplo de dedicação, competência e cidadania, mostrando que o esporte vai muito além da prática.

Contando com uma parceria de 12 anos com a Universidade de Passo Fundo, Ricardo é formado em Educação Física e Pós-Graduado em Treinamento Esportivo, foi Campeão Brasileiro, além de muitos outros títulos e se orgulha de estar hoje no topo do ranking nacional da categoria Master Masculino. Sua mais recente conquista, foi o 5º lugar no Campeonato Mundial Master de Mountain Bike, realizado em Balneário Camboriú (SC) no fim de semana passado, foi o melhor resultado de toda sua a carreira.

E o seu talento foi passado a diante, a ciclista de 20 anos Luana Machado, filha do atleta, já é considerada a maior promessa olímpica para os jogos do Rio 2016. A ciclista tem conquistado importantes resultados na temporada, somando pontos para as Olimpíadas de Londres 2012 e também lidera o ranking nacional pela categoria Sub-23.

Em entrevista ao jornal O Nacional, Ricardo falou sobre os desafios superados em sua carreira, próximos objetivos e o papel do esporte na sociedade. Confira:

ON - Há quanto tempo você está no ciclismo?
Ricardo -
Há 28 anos. Eu iniciei praticando Cicloturismo, viajando pelas estradas do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Foi uma forma de mostrar meu potencial e conseguir reconhecimento. Eu consegui apoio através dessas viagens e assim pude praticar mais o ciclismo competitivo. Durante sete anos eu pratiquei a modalidade olímpica, que é disputada em estradas de asfalto e depois eu descobri o Mountain Bike e me adaptei muito bem, porque quando eu disputava o olímpico, vencia principalmente as provas de montanha e nas provas em lugares planos eu não conseguia ser um bom sprintista, porém nas provas de montanha eu sempre me destacava...

ON - O que é mais exigido do atleta nas provas de montanha?
Para conseguir bons resultados no ciclismo, o atleta precisa ter fibras rápidas, isso para ser um bom sprintista, e fibras lentas para quem pratica montanhismo, que é o meu caso. No montanhismo o atleta é mais magro e os atletas que disputam provas planas desenvolvem um corpo mais forte, com mais massa muscular. Porém ambos os esportes requerem força e resistência. Quando eu comecei no Mountain Bike, disputei provas de campeonato estadual, as quais eu venci, depois fui para campeonato brasileiro vencendo uma etapa, no início achava que não iria ficar nesta categoria, mas depois me adaptei bem, me encaixei nessas exigências e comecei a ganhar títulos.

Você ainda era independente quando começou a se dedicar mais ao Mountain Bike?
Eu não tinha tanto apoio como agora, mas eu sempre tive apoio de empresas e pessoas que acreditaram em mim. A parceria com a UPF começou quando eu iniciei o curso de Educação Física. Eu ganhei uma bolsa integral e apoio para as competições e depois também na pós-graduação, então ao todo são 12 anos com a Universidade.

E a tua filha, está no ciclismo por influência sua?
Quando eu viajava e a Luana era criança, ela sempre queria me acompanhar. Queria estar sempre junto, queria fazer as mesmas coisas que eu fazia. Então quando ela começou a viajar comigo, foi a realização da vida dela. Quando ela aprendeu a andar de bicicleta foi uma alegria muito grande, estava no sangue. Ela sempre foi muito competitiva, muito dedicada aos treinamentos. Hoje, com 20 anos, já é considerada a maior promessa olímpica do Brasil para o Rio 2016. Desde que entrou no esporte, ela evoluiu muito, e venceu uma das principais competições do Brasil, o Mountain Bike 12 horas 2009, que teve inicio ao meio dia e se encerrou a meia noite. E agora a vitória mais atual dela foi na segunda etapa do Campeonato Interestadual disputado em Vinhedos(SP), onde estiveram presentes as melhores ciclistas do Brasil e ela se tornou campeã.

Qual foi a sua maior vitória?
O campeonato que eu tenho como lição de vida, foi o Brasileiro de 1995, já faz bastante tempo, mas foi muito marcante. Foram três etapas na competição, na primeira, disputada no interior de São Paulo, eu fiquei em quarto lugar, na segunda, disputada no Rio de Janeiro, eu fiquei em sexto lugar. Para eu me tronar campeão brasileiro na última etapa, eu teria que vencer a prova e ainda ser favorecido por uma combinação de resultados. A última prova foi realizada em Barbacena (MG), então eu montei um aparelho de musculação em casa que imitava o exercício do remo, comecei a acordar 5h da manhã todos os dias, tomava café, treinava até as 9h30, trabalhava até o meio dia e treinava na parte da tarde novamente até as 16h, voltava a trabalhar até às 18h e fazia o último treino do dia até as 20h. Era uma maratona diária. Quando chegou a última etapa do Campeonato, eu não larguei muito bem na prova, mas fui recuperando aos poucos e no final ganhei a prova e também o Campeonato pela combinação de resultados. Muitos atletas achavam que a competição já estava ganha, outros achavam que estavam preparados o suficiente, mas não estavam, então, com a minha dedicação, eu acabei vencendo um campeonato muito difícil. Foi uma grande lição de vida, porque eu notei naquele momento, que realmente nós temos que acreditar muito no que nós queremos e quando a gente acredita e trabalha forte, parece que todas as energias fluem para o nosso lado e conseguimos alcançar o objetivo. Foi um momento que marcou bastante a minha carreira. Quando me falta energia, eu lembro daquele momento e passo isso para a Luana também. A nossa vida é baseada no exemplo, porque muitas pessoas nos vêem e elas querem também levar uma vida que seja mais regrada, querem uma qualidade de vida melhor, elas querem se sentir bem como a gente se sente através do esporte. Então esse exemplo que a gente passa para as outras pessoas, é fundamental, além de ser bastante satisfatório.

Quais são as perspectivas para uma possível classificação na próxima Olimpíada?
Nós participamos apenas de provas que valem pontos para o ranking nacional e para as Olimpíadas de Londres. A Luana está concorrendo e eu não, porque participo da categoria Master. Nós acreditamos que a Luana possa conseguir a vaga, mas se por acaso ela não conseguir neste ano, ela vai ficar entre as primeiras colocadas. A Luana é promessa Olímpica para 2016, ainda tem atletas muito fortes, mas ela está gradativamente evoluindo. Então nós acreditamos que ela possa ficar entre as primeiras colocadas.

Vocês são exemplos de atletas que buscaram e conseguiram apoio. Qual é a tua opinião a respeito dessa dificuldade que muitos atletas têm em conseguir um apoio efetivo para a prática esportiva?


Nesse tempo todo que eu estou competindo, já vi muitos atletas com um grande potencial e que abandonaram por falta de apoio. O problema é que muitos só pensam na parte física e não pensam na parte empresarial. Desde o início da minha carreira, eu dedico uma parte para organizar os nossos treinamentos e outra para fazer um bom trabalho de marketing e também uma boa visualização da nossa imagem perante a sociedade. Outra questão também é o nosso retorno para a comunidade, através de projetos sociais. Nós temos um projeto chamado Vivenciando o Ciclismo na Infância, em que orientamos crianças sobre leis de trânsito, sobre os direitos dos ciclistas e como evitar acidentes. Temos também um projeto de doação de bicicletas. Conseguimos bicicletas usadas da comunidade, reformamos e doamos para crianças carentes e também entidades assistenciais. Além do Sou Coração Puro Não Tenho Vícios, que consiste em palestras salientando a importância de se levar uma vida saudável, sem vícios, enfim... Eu acredito que o atleta precisa dar um retorno para a sociedade, não só como atleta, mas como um ser que interage junto à comunidade. A partir daí, o atleta consegue apoio. Eu acredito que o nosso diferencial é esse. Não somente trabalhar como atleta, mas trazer algo de bom para a sociedade.

Você é formado em Educação Física e tem Pós-Graduação em Treinamento Esportivo.  Qual é o peso de uma formação teórica na carreira de um atleta?

Eu acredito que é fundamental, porque o atleta sem o conhecimento científico que a universidade proporciona, não é um atleta completo. Existe muito conhecimento que é transmitido pelos mestres, que um atleta que apenas pratica o esporte não tem, e assim ele acaba tendo várias deficiências, não é um atleta completo. Por isso a importância do nível superior, mesmo sendo profissional ou não. A Luana, por exemplo, concluiu o Ensino Médio e agora está se dedicando aos treinamentos, para buscar a vaga nas Olimpíadas. Assim que se encerrar essa jornada, ela vai voltar a estudar.

Você considera o ciclismo sua profissão?  Você dedica sua vida totalmente ao esporte?

Sim, além da prática do esporte, eu tenho uma escolinha de esportes e recreação em Lagoa Vermelha. O nosso principal objetivo é o desenvolvimento físico e motor das crianças e a integração delas junto aos colegas e junto à sociedade. É um trabalho em primeiro lugar educativo. A gente faz com que o esporte sirva como um meio, para que a criança venha se tornar uma pessoa de bem.

E os próximos compromissos?

Agora nós vamos participar de várias provas, quase todos os finais de semana. No dia 07 de agosto estaremos na etapa do Campeonato Interestadual, que será novamente realizado em Vinhedos (SP), depois iremos para São Marcos (RS), em uma prova válida pelo ranking nacional, os dois disputam. No dia 21 de agosto, nós estaremos em Congonhas (MG), para a terceira etapa da Copa Internacional de Mountain Bike, uma disputa com atletas de toda a América Latina e essa prova é válida também para a pontuação das Olimpíadas de Londres 2012, em que a Luana é uma das primeiras colocadas no Brasil. Depois nós vamos nos organizar para ir a Suíça, onde nós vamos disputar o Campeonato Mundial em Champery. Ela vai disputar e eu vou como técnico.

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