“El tipo puede cambiar de todo. De cara, de casa, de familia, de novia, de religión, de dios. Pero hay una cosa que no puede cambiar Benjamín.No puede cambiar de pasión.” (O homem pode mudar de tudo. De cara, de casa, de família, de namorada, de religião, de deus. Mas há uma coisa que não pode trocar Benjamín. Não pode trocar de paixão).
No filme argentino O Segredo dos Seus Olhos (Juan José Campanella, 2009. Se ainda não viu, por favor, assista), o personagem Pablo Sandoval, interpretado por Guillermo Francella, usa essa frase para definir o perfil de um assassino. E foi essa paixão que “no se puede cambiar” que levou aqueles 40 mil gremistas ao Estádio Olímpico naquele domingo (dentre eles, eu) para ver, mesmo que não se soubesse ainda, o jogo vida deles. Lembro como se fosse ontem, quando olhei aquele pedaço de papel, com a tabela de jogos do Brasileirão 2011 impressa, e disse para mim mesmo: “Dia 30/10 estarei no Estádio Olímpico. Esse Grêmio x Flamengo não perco por nada”. Lembro que fiz cálculos pra ver se estaria ou não de plantão naquele domingo, quanto de dinheiro teria de guardar, quem seria parceiro de ir junto. Mas, inexplicavelmente, a ideia morreu. Muita coisa aconteceu durante o ano, que fizeram os planos de ir para a Capital ficarem para trás. Só que uma série de fatores fizeram que, na manhã daquele domingo de outubro eu estivesse em um ônibus rumo a Porto Alegre. Após uma viagem demasiadamente demorada (quase seis horas de Passo Fundo até lá), cheguei ao Monumental que, naquela tarde, parecia uma praça de guerra. Um contingente enorme de policiais, além de um helicóptero (sim), esperavam os torcedores. Entrei pelo Portão 13 (o que sempre uso), e ao meu lado esquerdo havia um protesto veemente direcionado à figura de Ronaldo de Assis Moreira, o Ronaldinho, que voltava ao Olímpico após todo o imbróglio do início do ano envolvendo sua negociação. Sem dúvida a figura de Ronaldinho era o pivô daquela tarde. Os protestos verbais, as faixas com dizeres do tipo “Pilantra” e “Mercenário”, as notas de R$ 100, com o rosto do jogador do Flamengo eram lugar-comum dentro do estádio, que aguardava o momento que ele apareceri em campo. Quando o jogador rubro-negro apareceu rodeado de crianças, ouviu-se a maior vaia que o “Velho Casarão” (alguns gremistas na internet chamam o Olímpico assim, em virtude da construção da Arena. Uma alusão à música do Teixeirinha) já havia presenciado, mas ele parecia indiferente. Cumpriu o protocolo de início de jogo normalmente, parecia imune ao que acontecia nas arquibancadas. E assim foi no primeiro tempo todo, onde o Flamengo saiu com a vantagem e ele jogou da maneira que sabe. Mas, na segunda etapa, tudo mudou. As notas falsas começaram a voar para dentro do campo, o Flamengo teve de atacar para a goleira onde fica a Geral, e R10 se perdeu. As vaias a ele só aumentavam, e isso tornou-se combustível para o Grêmio, que empatou e virou a partida. Quando Ronaldinho tomou cartão amarelo por reclamação, parecia gol do Tricolor. O espetáculo já estava garantido, e a vitória serviu para dar um ânimo extra à torcida, que mostrou que segue apaixonada pelo Grêmio, mesmo que o Tricolor esteja passando por tempos difíceis. Já Ronaldinho saiu de campo desdenhando a torcida e o jogo. Mas uma coisa ele pôde constatar: paixão não se troca.
* Jornalista, acompanha os jogos do Grêmio no Olímpico sempre que pode