É na antiga Associação dos Moradores da Vila Colussi, em Passo Fundo, num espaço de chão batido e parede bruta que seu José Belém, técnico em agricultura orgânica, desenvolve cotidianamente um método inovador de compostagem aeróbica com umidade controlada de resíduos orgânicos domésticos. Criado por ele a partir de muito estudo, pesquisa e ensaios, o projeto transforma descartes de origem vegetal e animal em adubo universal que pode ser utilizado em hortas, pomares, gramados e jardins, devolvendo para a natureza um material reciclado.
Depois de 30 anos pesquisando e realizando testes, seu José mostra que o método não produz chorume, mau cheiro e não atrai insetos. Ele transforma o lixo orgânico em terra rica e adubada, “imitando a natureza” como diz. “O lixo seco fica 50% aproveitável e o orgânico 100% reaproveitado”, afirma. A novidade gerou curiosidade de gestores de outras cidades e estados e as visitas à propriedade são cada vez mais frequentes. Biólogos, agrônomos, secretários de serviços urbanos já foram ao local para levar o modelo para suas cidades.
O principal benefício do método é a capacidade de recuperar um solo degradado, restituindo o equilíbrio químico do solo, se aproximando ao máximo do papel que a natureza faz.
Seu José recupera 15 toneladas de lixo por mês, mas tem capacidade para muito mais. Um exemplo é o grande volume de matéria orgânica produzida somente nas escolas da cidade, que, segundo o técnico, passa de 60 toneladas por dia e que poderia ser transformada em adubo. “Menos lixo, menos cheiro e ainda adubo para as hortas, parques, praças e gramados da cidade. A importância desse processo para o meio ambiente é incalculável. A expectativa que tenho é que o poder público possa investir no projeto. Além de reutilizarmos o lixo, resolvemos o problema ambiental e criamos adubo orgânico de qualidade que pode ser utilizado inclusive como adubo”.
Educação ambiental
As décadas de estudo trouxeram uma extensa bagagem de conhecimento ao seu “José da Compostagem” como é conhecido. Além de técnico em agricultura orgânica pela Universidade de Viçosa (MG), ele estudou minhocultura (processo de reciclagem de resíduos orgânicos por meio da criação de minhocas), ampliou pesquisas e nunca parou de estudar, “Eu sempre fui curioso, fui vendo o que poderia ser aperfeiçoado e venho pesquisando e desenvolvendo o projeto, mas sempre baseado em conhecimentos trazidos por outros tantos profissionais, biólogos e agrônomos conhecidos. Cada um contribuiu um pouco para que eu chegasse até aqui”.
Há três anos ele mantém sua propriedade alugada, trabalhando com reciclagem do lixo orgânico e presta serviço para o Instituto Ambiental de Passo Fundo, que tem convênio com a Secretaria Municipal do Meio Ambiente. Por meio de palestras, o técnico ensina aos estudantes das escolas municipais sobre a qualificação dos resíduos sólidos. Já fez trabalhos nas escolas: Georgina Rosado, no bairro Lucas Araújo; Fredolino Chimango, bairro Jaboticabal e Senador Alberto Pasqualini, no bairro Vera Cruz. Começou por iniciativa própria implantar o projeto na Escola Municipal Senador Alberto Pasqualini e coleta os resíduos orgânicos do local. “Eu comecei reciclando lixo da minha empresa de massas, sempre tivemos cuidados de separar o lixo e o cuidado de transformar em adubo.
Em 30 dias o lixo orgânico vira adubo
O método que antes levava dois meses para se efetivar, hoje acontece em 30 dias. “É um processo feito depois de muita pesquisa e ensaios, é totalmente asséptico, mesmo trabalhando com o lixo orgânico mais fétido que existe. Não tem chorume, moscas, processo estudado que prova que a natureza tem razão porque reciclou a natureza sempre reciclou por ela mesma. Esse é apenas um exemplo do que pode e deve ser feito. “O adubo orgânico é o único adubo que alimentou toda a base da vida, carnívoros e herbívoros sempre dependeram de um solo rico e tudo o que é verde precisa de adubo orgânico e esse adubo produzido aqui é universal”, diz.
Agrocompostagem
Outra técnica desenvolvida é a agrocompostagem, método que leva o resíduo orgânico para a lavoura, sendo transformado em adubo com as plantas. “A natureza não tem composteira, vai fazendo o processo naturalmente, com plantas animais, descartes, decompositores. O que faço aqui é imitar e agilizar o processo que seria natural, mas que levaria mais tempo. Comprovamos a capacidade de recuperar o solo degradado para lavoura sem intervenção química. O nitrogênio e o potássio, por exemplo, deixam o solo ácido. Para restituir o solo precisamos nos aproximar ao máximo do que a natureza faz. Quando trazemos esses decompositores e matérias orgânicas variadas, imediatamente o solo vai sendo equilibrado e vai podendo abrigar qualquer tipo de planta”.
“Tenho a fórmula para reciclar todo o resíduo orgânico da cidade”
Seu José afirma que seu trabalho pode ‘resolver o problema do lixo orgânico da cidade’. “Passo Fundo produz 60 toneladas/dia de lixo orgânico. Tenho ciência de que se o poder público investisse, criasse condições de montar uma estrutura mínima para que isso fosse possível, teríamos aqui um local de educação ambiental e reciclagem, mas para isso precisamos vencer desvios culturais que fizeram com que nos afastássemos das leis da natureza. Com esse método poderíamos dar outro destino ao lixo e ainda criar adubo para a cidade toda. Não produziríamos lixo, mas sim adubo, esta é a causa da minha ação, pois entendo que a natureza quer de volta todos os resíduos da vida para que ela possa continuar alimentando a vida. Um solo vivo alimenta a vida e é isso que fizemos aqui”. Ele ressalta que além de poluir o ar, o lixo produzido e não reciclado gera chorume, polui o lençol freático e degrada o solo, trazendo diversos prejuízos ambientais, sociais e de saúde. “Enterramos o lixo orgânico que é a matéria-prima, poluindo o solo ao invés de utilizar para produzirmos adubo”.
Como funciona o método?
O resíduo orgânico urbano doméstico: sobras e comida, cascas, papel toalha, filtros de papel, tudo o que vem de plantas, madeira e animais é separado depois triturado por numa máquina. O próximo processo é o controle da umidade com serragem seca ou esterco de cavalo misturado com serragem, com o objetivo de obter umidade de 70%, formando uma espécie de farofa. Esse material é colocado em uma composteira, numa camada de 30cm por uma semana e depois coloca mais 30cm, até que encha o bag. O material fermenta numa temperatura de até 70 graus com seis grupos de bactérias. A primeira quente, outra no morno e a terceira no frio, a última etapa, quando trabalha em harmonia com as plantas e está pronto para o uso. Esse material é peneirado e visualmente é como uma terra de mato, com cheiro de cascas e folhas.