As flores que começam a colorir as ruas com a chegada de uma nova estação não devem ser a única característica marcante durante a primavera deste ano. A estação, que começa às 16h21min desta quarta-feira (22), vem acompanhada também da probabilidade de retorno do fenômeno La Niña, um evento climático causado pelo esfriamento anormal das águas superficiais do Oceano Pacífico Equatorial, que tende a causar a redução no volume de chuvas e o aumento das temperaturas no Sul do Brasil.
De acordo com o agrometeorologista e pesquisador da Embrapa Trigo, Gilberto Cunha, no Rio Grande do Sul, o La Niña deverá atuar com maior intensidade durante os meses de novembro e dezembro. “A maioria das instituições climáticas tem apresentado uma perspectiva de estação marcada por irregularidades na quantidade e na distribuição das chuvas durante a primavera. O La Niña também tem uma característica de aumento nas temperaturas, mas acredito que isso será menos evidente, podendo ficar ao redor do padrão climático comum para o período”, prevê.
O especialista também alerta sobre a probabilidade de eventos adversos típicos da chamada estação de transição, que marca o fim do inverno e o início do verão. “À parte do romantismo que se pinta a primavera como sendo a estação das flores, aqui no Sul, ela é a estação mais problemática para a Defesa Civil. É típico dela a recorrência de irregularidades como maiores vendavais e granizos, além de eventos extremos como tornados, por exemplo”, pontua. Além disso, historicamente, a primavera é também a estação que mais chove no Estado, tornando-se comum o registro de chuvas intensas, embora neste ano o La Niña ameace reduzir o volume de precipitações.
Setembro ainda deve ter chuvas dentro da média histórica
Enquanto a chegada Diferente de agosto, que fechou o mês com o registro menos de 40% da média histórica de chuva em Passo Fundo, o mês de setembro tem mostrado um comportamento mais positivo em relação às precipitações. Ainda sem sofrer as consequências da aproximação do La Niña, o mês já registrou 185mm de chuva em 21 dias, enquanto a média histórica é de 198mm. “A falta de chuva durante agosto afetou o potencial de rendimento das culturas de inverno em algumas regiões do Estado, mas na maior parte, não chegou a ser algo significativo. Com as chuvas de setembro, que vieram em muito boa hora e recuperaram a umidade do solo, a situação se manteve positiva”, Cunha analisa.
Ainda segundo ele, daqui para frente, o ideal é que as precipitações se mantenham, mas em menor volume e frequência. Portanto, a princípio, os indícios climatológicos disponíveis até o momento não apontam para um cenário negativo na agricultura. “A estação vai exigir atenção para a safra de verão que começa a ser plantada agora. Já para os cultivos de inverno que estão no campo no momento, deveremos ter condições climaticamente favoráveis, porque será uma estação menos úmida do que de costume e isso favorecerá nos ciclos seguintes das plantas”, esclarece.
Barragem da Fazenda continua em déficit hídrico
Por outro lado, quando o assunto é o abastecimento de água para a população, a perspectiva de chuva abaixo da média é um sinônimo de preocupação para os municípios gaúchos. Isto porque, desde novembro de 2019, o Estado tem vivido uma situação de estiagem prolongada com efeitos nos abastecimento de água. Em Passo Fundo, a Barragem da Fazenda, responsável por 40% do abastecimento de água do município, chegou a ficar mais de 4 metros abaixo do nível normal durante o mês de maio, cravando o período mais crítico da reserva. “A situação está melhorando. As chuvas de setembro ajudaram bastante na recuperação dos níveis das barragens. Na Barragem do Miranda, alcançamos a capacidade completa. Na da Fazenda, ainda estamos com 80cm abaixo do normal. A recuperação total ainda depende de mais chuva”, afirma o superintendente regional da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), Aldomir Santi.
Para garantir o abastecimento da população, desde o ano passado, a Corsan tem adotado um conjunto de medidas. A principal delas é a transposição de águas do rio Jacuí para a Barragem da Fazenda, que já dura cerca de onze meses, de forma ininterrupta. “É a maior transposição da história do município. Nós fechamos toda a barragem, não sai nada dela, e toda a água que está abastecendo o município hoje vem do Rio Jacuí, para que possamos manter aquele volume de água da reserva acumulado para o verão. Semana que vem, iniciaremos mais uma obra de transposição do rio Jacuí para termos uma capacidade maior, caso precisemos durante o verão”, explica o superintendente. Apesar dos esforços para aumentar a capacidade de transposição em caso de necessidade, Santi alerta que a medida não é uma solução final para o problema hídrico. Nas palavras dele, se a falta de chuva perdurar, a seca pode afetar até mesmo rio Jacuí.