Nos últimos dias tenho recebido por mensagens e nas redes sociais dezenas de imagens de amigos e familiares, com seus rostos envelhecidos, com mais ou menos cabelo, com barba, em outro gênero. Uma brincadeira inocente, que diverte e, aparentemente, não tem nada que possa nos preocupar. Só que este ambiente de simples diversão deixa passar um detalhe que tem relação direta com nossa privacidade e com o uso indiscriminado de nossos dados pessoais.
Quando instalamos o FaceApp, aplicativo de origem russa que permite variações nas imagens de nosso rosto através de Inteligência Artificial, aprovamos condições de uso que deixaria arrepiado o mais sereno usuário. Ao aceitarmos, autorizamos a empresa desenvolvedora a coletar e armazenar a nossa localização, pelo sistema de GPS, o endereço IP de nosso celular, nossos dados pessoais e a foto de nosso rosto, sem prazo de validade para este uso. Ou seja, para entrarmos na brincadeira do momento, cedemos todas estas informações, de forma irrestrita, não exclusiva, sem previsão de remuneração e por tempo indeterminado. Podem usar sua localização, seus dados e a foto de seu rosto como bem entenderem, pelo tempo que acharem necessário.
E o que chama a atenção nesta distribuição livre de dados e informações é que ela está ocorrendo no momento em que debatemos, no país, a regulamentação da Lei Geral de Proteção de Dados e o alcance da sua capacidade de proteção, em um cenário tomado pelo uso frequente das redes sociais, pelo contínuo desenvolvimento das tecnologias de vigilância e marketing comportamental e todos os demais avanços da revolução da informação. Ao que tudo indica, temos consciência de que precisamos proteger os nossos dados pessoais e de nossas empresas, mas não nos preocupamos nem um pouco quando somos solicitados a fornecê-los gratuitamente e sem restrições.
E nem entro no mérito do que uma empresa que possui um software de Inteligencia Artificial capaz de produzir, em segundos, imagens de nossos rostos envelhecidos com tanta qualidade e precisão poderia fazer com todas estas informações coletadas. E tampouco entrar na discussão da prática consolidada de comercialização indiscriminada de nossos dados no mercado, exigindo de nós paciência em lidar com as centenas de propagandas que recebemos diariamente por todos os meios possíveis.
A ideia é procurar refletir antes de cada novo download, se, de fato, concordamos com as condições de uso do produto, e se compensa correr o risco de ter mais dados expostos. Afinal, a zoação vale este preço?