Por um punhado de dólares
A morte do maestro Ennio Morricone, como o badalar dos sinos em suas trilhas sonoras, despertou os nossos ouvidos para a boa música. Soou para reascender neurônios outrora embalados por grandes orquestras. Mas, no mesmo arranjo western, surge um assovio característico de uma despedida no horizonte empoeirado. É a cena em que desaparece o bom gosto, engolido pelo deserto cultural. A vida é assim e assim é a música. Eu disse música. Favor não confundir com outros ruídos. Aos mais jovens, informo que já houve padrões de qualidade no rádio. Uma fatia considerável da programação musical era dedicada à música orquestrada. E hoje? Que fim levaram as grandes orquestras? Suas gravações desapareceram? Não existem mais os grandes instrumentistas? É óbvio que existem músicos, orquestras e excelentes gravações. Pena que não estejam mais acessíveis num simples radinho ou na televisão aberta. É indiscutível que vivemos um retrocesso cultural. Uma decadência que começou nos anos 1960, quando tecnocratas foram enxertados no sistema educacional e propuseram as famigeradas reformas do ensino. Depois, num salto oportunista, as concessões públicas chutaram o balde da difusão cultural e seguiram os caminhos do apelo imediatista. Foi uma explosão para a proliferação da porcaria. E a porcaria roubou o espaço da arte, contaminou o ambiente e corroeu o bom gosto. Nas últimas décadas, a predileção apurada evaporou. A quem interessa tamanho retrocesso cultural? Na prática, a ética foi engolida pela ganância. E, como na obra de Morricone, tudo isso per un pugno di dollari.
Bandeiradas
Em pandemia, mudança de bandeira não é motivo para comemorações. Nem quando aumenta, nem quando diminui. O método é um indicativo, um termômetro que serve para orientar neste delicado período. Amarela, laranja, vermelha ou preta, são apenas cores indicativas para definir as exigências sanitárias do momento. Mas, pouco importa a cor, o que necessitamos mesmo é de civilidade e educação. Se agora estamos sob a bandeira laranja, isso não representa um convite para sair às ruas. Na pandemia, as pessoas agem como crianças ao ouvir a sineta tocar para o recreio. E, crianças bem crescidinhas, ainda ficam colocando a culpa em governantes que, de fato e de direito, cumprem suas obrigações. Ora, antes de reclamar é necessário agir com muita educação e visão coletiva. Bom, é claro, seria se vivêssemos todos sob a bandeira cantada por Dalva de Oliveira. E eu também peço paz.
Desobediência
A desobediência civil está em alta na pandemia. Mesmo em bandeira vermelha, famílias circulavam pelo centro de Passo Fundo para saborear um sorvetinho. Além de circular em grupos, ainda se esfregavam em bancos públicos para facilitar o transbordo do vírus. No supermercado, observei uma senhora acompanhada de duas filhas já bem crescidinhas. Faziam mesas-redonda a cada corredor, obstruindo o fluxo e desrespeitando os cuidados necessários. Vi um casal com três filhos carregando sacolas de uma loja para a outra. Ora, porque cinco agentes com potencial para transporte do vírus se as compras poderiam ser feitas por apenas uma pessoa? Será que ainda não entenderam que o propósito das limitações não é diminuir as vendas. É diminuir a circulação de pessoas pela cidade. Será que é tão difícil assim manter a bunda numa cadeira em casa?
Iracélio
Iracélio até lembra um tropeiro, pois conhece o gado em todos os cantos da cidade. Então, sempre está carregado de histórias diferentes. Contou-me sobre um magrão que mora perto do hospital. “O pinta bem doidão andava fissurado e muito brabo. Magrão deu umas bandas na Cruzeiro e não tinha nem cloroquina. Bah, enlouqueceu”. Iracélio, Iracélio tropeiro contemporâneo.
Trilha sonora
Ennio Morricone e Dulce Pontes. Once Upon a Time in the West (Your Love)