Muitos fatores têm determinado a evolução do pensamento humano para a sensibilidade mínima da igualdade racial. A luta de muitas gerações de descendentes africanos é o principal. É esperançoso constatar que o quadro de amargura que abalou nossa história, a maior catástrofe humana do Brasil, a escravidão que durou 300 anos, possa ser vencido perante o forte apelo que cruzou os tempos. Há fatos e indícios no comportamento social de nossa pátria que podem nos conduzir à mitigação dessa angústia. O caminho da reconstrução humana ainda é de sofrimento. A celebração do dia da Consciência Negra é menção aos maiores heróis, Zumbi dos Palmares e Dandara dos Palmares, símbolos inexcedíveis de virtude e força. A voz dos pesquisadores de nossa história começa a recompor o verdadeiro quadro narrativo. A liberdade é luta que exige a participação de todos os povos perante a imprescindível verdade dos acontecimentos.
Preferimos, hoje, confrontar os movimentos fundamentais de nossa sociedade diante do panorama perceptível no momento. Nem por isso é possível esquecer a mácula indelével das atrocidades praticadas contra os oriundos da África, especialmente os que aqui chegaram na condição cruel da escravidão. As memórias são as mais dolorosas que se possa imaginar. Isso não se apaga, mas há um esforço sobre-humano, uma compaixão em sentido inverso, capaz de empoderar cidadãos, irmãos negros, em gestos de grandeza e talento. Sim, o amor próprio também é parte de uma força e do talento. A geração atual apresenta-se mais redentora do que julgadora. O líder de nosso tempo, Nelson Mandela, falecido em 2003, é a referência que se apresenta como exemplo de luta pela igualdade racial. Comandou de dentro e fora da cadeia o movimento contra o Apartheid na África do Sul, acompanhado no mundo inteiro. Mostrou que a comunicação, a cultura e arte, são ferramentas eficientes para alcançar igualdade. Ensinou a comunidade negra oprimida que é possível grande conquista pacífica. Essa influência, aliada à luta histórica de tantos líderes e anônimos brasileiros, moldaram a forma de militância negra. Entendemos que a adoção de luta pacífica, pelos meios democráticos, tem enorme potencial de cooperação. É valiosa e ampla.
Contra o racismo
As manifestações de racismo estão em toda parte. A denúncia dos fatos cotidianos ofensivos e criminosos de discriminação racial são importantes. Os movimentos negacionistas dessas ofensas contra a humanidade hoje enfrentam o repúdio da sociedade. As revelações desse ódio longevo alojam-se em núcleos nazistas e fascistas. Mas a índole do bem ganha força, cada vez mais veloz. Queremos dizer que estamos evoluindo na democracia e estado de direito, mas a luta continua. Como diz a música, “com uma canção também se luta, irmão. Ouvi-me a voz...”
A literatura
As denúncias vigorosas dos heróis que brandiram a espada da cultura estão candentes em nossa memória, como Castro Alves em Navio Negreiro – Tragédia no Mar, em “Bandido Negro”, e tantos que profetizaram o fim do horror escravista. Falamos assim por que o acesso à cultura é sinal libertário para oprimidos brancos e negros.
Martin Fierro