“Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão, porque eram como ovelhas sem pastor. Começou, pois, a ensinar-lhes muitas coisas” (Marcos 6,30-34). Jesus estava ocupado com os apóstolos, pois os havia convidado para descansar um pouco, mas com o aproximar-se de mais pessoas teve que direcionar para elas a atenção.
O primeiro passo foi ver a multidão. Revela a atenção de Jesus aos acontecimentos do contorno, à situação social, psicológica e existencial daqueles que o procuravam. Ver em profundidade e de forma ampla as situações é um exercício exigente. Nem um olhar otimista que desconsidera os problemas, nem um olhar pessimista cego ao que há de bom e que só amplifica os problemas é justo. É considerar o que há de bom e errado na medida justa. O correto discernimento permite ações adequadas.
O ver de Jesus não foi meramente teórico ou uma simples constatação para ter argumentos para um possível discurso posterior ou para fazer uma análise política, sociológica ou religiosa da situação. Aquilo que viu o atingiu profundamente, teve compaixão, isto é, “sofreu com a multidão”. Percebeu que também era um problema dele e que deveria dar a sua colaboração e não apenas achar culpados ou mandar os outros fazerem algo.
A primeira forma de ajuda que Jesus ofereceu foi “ensinar-lhes muitas coisas”. O evangelista Marcos nem registra o que ensinou, simplesmente diz que ensinou. Ele sabia que o ser humano é uma realidade complexa que tem muitas exigências. Junto com as necessidades primárias de comer, beber, descansar, morar existem outras vitais e de primeira necessidade. Se o corpo tem fome, também o espírito e a inteligência precisam ser alimentados. A harmonia e equilíbrio da pessoa dependem, em boa parte, do correto alimento dado ao corpo e ao espírito. Aos apóstolos que voltavam de uma missão Jesus os convidou para descansarem e às multidões ofereceu ensinamentos. Era o que mais necessitavam naquela hora.
Refletimos sobre a postura de Jesus não simplesmente para fazer um exercício teórico, uma análise de texto, mas com o desejo de aprender, deixar-se orientar e iluminar o agir a partir dele. A multidão continua caminhando agora e é preciso vê-la, envolver-se e dar a própria colaboração conforme as possibilidades. Sem sombra de dúvida, as pessoas individuais que compõem a multidão têm necessidades das mais variadas. Retomo a necessidade que Jesus percebeu imediatamente naquela multidão: ser ensinada.
A longa pandemia ampliou, e em muito, o número de perguntas e dúvidas em todas as dimensões humanas. A quantidade de incertezas coloca a humanidade numa situação de “ovelhas sem pastor”. As palavras do profeta Amós, anunciando o “dia do Senhor”, dizem que “dias virão ... quando hei de mandar à terra uma fome, que não será de pão e nem de sede de água, e sim de ouvir a Palavra do Senhor” (8,11). A multidão tem fome e sede de ensinamentos que façam compreender a verdade, que promovam a paz, que levem à reconciliação dos conflitos, que consolem, que animem, que afirmem que vida tem um sentido, que abram os olhos para ver o horizonte, os fatos de forma ampla e sob muitas óticas e não apenas de forma polarizada.