Blaise Pascal, valendo-se da sua peculiar racionalidade e para a surpresa dos irmãos de fé, buscou convencer os seus contemporâneos que é melhor acreditar, mesmo sem qualquer prova, na existência de Deus do que não acreditar. Criou uma espécie de fideísmo, que, mais tarde, se convencionaria chamar de “aposta de Pascal”.
Os argumentos usados pelo gênio científico e filosófico do século XVII não foram simplistas, pois, para Pascal, estava claro que se há um Deus, ele estaria para além da nossa compreensão, e que as provas da sua existência não residiriam nas crenças do teísmo cristão expresso nas “sagradas escrituras”. O ponto de partida usado por Pascal foi que “não há provas de que Deus existe” e “nem de que Deus não existe”. E assim ele propôs (e convenceu em termos) que é irracional não acreditar em Deus, uma vez examinadas as alternativas: 1-Deus existe e acredito, ganho o infinito; 2- Deus existe e não acredito, perco o infinito; 3-Deus não existe e acredito, o que perco não é significativo; e 4-Deus não existe e não acredito, o que ganho não é significativo.
Qual é a melhor aposta? Excluída a possibilidade de “não acreditar que Deus existe, nem que não existe”, a confortável posição agnóstica, é melhor apostar na existência de Deus (a aposta 1). Não há dúvida que é a mais vantajosa das quatro alternativas dadas por Pascal. O ganho é infinito e a perda negligenciável, caso esteja errada. Entre ganhar o infinito ou perder o infinito, torna-se irrelevante ganhar ou perder ninharias. Mas, é evidente que a posição pascalina tem senões: quem pode garantir que acreditar na Divindade sem provas, exceto para um crente, seria uma boa e não sem consequências? Talvez buscar evidências que o crente vive melhor do que o não crente pareça mais adequado.
Mas, nem Pascal e seus pensamentos e nem acreditar ou não acreditar em Deus são preocupações do colunista por ora (Deus é tratado com mais conhecimento de causa pelo vizinho dessa página). O alvo é outro: mudança do clima global. Qual a melhor aposta? Insistir no negacionismo explícito ou aceitar como fato e fazer alguma coisa? A estrutura da aposta de Pascal se prestaria para esse tipo de análise?
Admitamos que, apesar dos recentes relatórios das Nações Unidas sobre a mudança do clima global e do atlas de mortalidade e prejuízos econômicos causados por eventos climáticos extremos no mundo desde 1970, que estão consubstanciados em milhares de artigos científicos e em evidências empíricas de toda ordem, ainda se possa considerar com alguma razoabilidade a dúvida sobre a necessidade de intervenção política e a tomada de medidas para atenuar os problemas de ordem climática que afligem a humanidade. Então que tal, ao estilo Pascal, colocar essa questão nos moldes da famosa aposta do século XVII? O que você acharia mais adequado: aceitar algo falso, pois mudança do clima não existe (como pregam os negacionisas)? Ou rejeitar a verdade, em caso de a mudança do clima estar em curso e ser causada pela atividade humana (como afirma a maioria dos cientistas)?
Parece-nos mais sensato, seguindo Pascal, aceitar a mudança do clima como causada pela atividade humana e fazer alguma coisa do que insistir em negar e correr o risco de perdas irreparáveis. Não há razão que nos pareça plausível para rejeitar algo que nos aponta que temos um problema e precisamos lidar com ele. Que aceitar, independente de questão de provas (há suficientes, mesmo que existam incertezas), os benefícios podem ser muitos (infinitos como diria Pascal), se verdadeiro. E ainda, que as alternativas, no caso de ser a mudança do clima um falso problema, podem, no máximo, acarretar poucos benefícios ou perdas pequenas, não sendo as mais atrativas.
Insistir para além da dúvida razoável, não nos parece a melhor escolha. Mudança do clima exige inteligência estratégica, inovação e abre caminhos para o empreendedorismo. Ainda que um dia venha ser provado que a mudança do clima nunca existiu (algo que não acredito, por ora), é melhor apostar nela!
Em tempo: Pascal era “terrivelmente” Cristão.