OPINIÃO

Fogo na mata

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O semblante exaurido e alquebrado dos combatentes que mantêm o trabalho para debelar o fogo infernal das grandes queimadas nas florestas e cerrado do país é comovente e perturbador. São membros da força oficial, bombeiros profissionais e voluntários, todos heróis. Chama atenção a angústia dos socorristas que sobem escarpas implacáveis entre densas fumaças, carregando nas costas um pouco de água e nas mãos apagadores artesanais. O calor é insuportável. Por mais que se imagine o treinamento recebido para apagar as labaredas da cortina lúgubre que avança sobre a vegetação seca, corre o temor de que a vontade de salvar a natureza possa aquecer a vontade de vencer a fúria do fogo levando ao desatino pela causa ao colocar em risco a própria integridade física. Em entrevistas à imprensa são várias as manifestações que apontam para uma das causas do sinistro: a atitude criminosa deliberadamente iniciada por pessoas. Eles vivem na região afetada e sabem que muitos focos de incêndio são provocados por devastadores invasores de terras. Mesmo em áreas destinadas rigorosamente para preservação, as provas de ações abjetas estão expostas. São tocos de árvores tombadas com motosserra. A seca facilita a obra fúnebre que consome as árvores, mata a fauna. São os grileiros ousados e quadrilheiros da exploração inominada das glebas de terra da Amazônia. As lágrimas dos combatentes não comovem o poder central que tem o dever indeclinável de agir contra o crime contra a cidadania. Mesmo assim são muitos os que lutam para vencer o desastre. O fogo nas matas é demais. As espécies nativas de animais restam incineradas.

Solo sedento

O calor exterminador devora a vegetação até às margens dos rios e riachos. A umidade do solo mantida pelas árvores sofre redução. Há um processo de agravamento da seca que se espalha pelas regiões do país. Se a água é fonte de vida, a seca semeia a morte, sufoca a respiração. A velocidade das chamas é desproporcionalmente à defesa dos homens.

Falta água

A distância dos focos de incêndio parece localizar a maior sensibilidade na conta de luz ou água. A sociedade afetada por pandemia gravíssima nem percebe o contexto terrível que envolve a triste ameaça à vida de todos. Um território tão vasto e generoso em matas, a água sofre demais. Falta água nas torneiras das cidades, nas fontes que regam áreas rurais. E o fornecimento de energia está perto do colapso. As glebas territoriais destinadas aos índios e as de reserva extrativista sofrem agudamente os efeitos de uma devastação evitável. Sem qualquer escrúpulo as atividades descontroladas de garimpo destroem o solo e envenenem os rios. Há necessidade urgente de socorro à nossa natureza que começa comprometendo essencialmente o direito de respirar e ter água em casa. Há sempre justificativa técnica para garantir a estrondosa diferença dos altos rendimentos oficiais pagos com custo altíssimo aos trabalhadores humildes e desempregados; e não há dinheiro para combater o crime contra a natureza, nem mesmo as causas naturais da devastação.

A farsa e o javali

O espectro furioso da meta pró-armamentos das camadas privilegiadas mostra a subterfúgios de pouca ética social. Além de ser questionável como prioridade, a promoção do poder central em facilitar a venda de armas mostra a permissividade de costumes. A liberação de armas certamente atende negócios e interesses financeiros indiscutíveis. A reportagem do Fantástico expôs a voracidade da mentalidade paramilitar ao revelar aumento da população de javali em regiões do país. A liberação da caça ao animal predador levou a uma incitação dos pretendentes à compra de armas. É claro que tudo foi uma farsa. Foram importadas matrizes de javali para se expandirem em nossas regiões. A caça, com armas especiais, agora permitidas com abundante munição atende o marcado também do turismo. Lembrando que o custo das armas e licenciamento enseja esta estranha confraria para quem tem dinheiro de sobra, apenas!

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