A Palavra de Deus, da liturgia deste domingo (Números 11,25-29, Tiago 5,1-6, Marcos 9,38-48), coloca em reflexão, avaliação e oração um tema muito importante e ao mesmo tempo delicado. O livro dos Números diz que foram designados setenta anciãos para ajudar Moisés na condução do povo. Eles foram convocados para a tenda de reunião, mas dois não foram, mesmo assim receberam o mesmo espírito que os capacitou como os outros. Os dois começaram a agir. Josué, ajudante direto de Moisés desde a juventude, disse: “Moisés, meu senhor, manda que eles se calem!” O evangelista Marcos, narra que João disse a Jesus: “Mestre, vimos um homem expulsar demônios em teu nome. Mas nós o proibimos, porque ele não nos segue”.
As atitudes de Josué e de João revelam seu modo de pensar. Um pensar de gueto, sectário, fechado, estreito pois somente o seu grupo tem o monopólio da verdade e os outros estão errados. Um olhar míope que só vê o próprio interesse. Convivemos com este modo de pensar e agir em muitos ambientes da sociedade e também na Igreja. Isto gera tantos conflitos, exclusões, preconceitos e violências. Dificulta a cooperação para a solução dos problemas e a tomada de decisões. Na avaliação de Cristo este modo de pensar e agir é um escândalo, uma pedra de bloqueio que faz tropeçar.
As respostas de Moisés e de Jesus são pura sabedoria. Moisés respondeu: “Tens ciúmes por mim? Quem dera que todo o povo de Deus fosse profeta, e que o Senhor lhe concedesse o seu espírito!” Moisés exalta a multiplicidade de carismas e deseja que todas as pessoas fossem inspiradas e iluminadas. Não tem ciúme por ter a seu lado mais pessoas comprometidas e com liderança. Tem a convicção que sua função não está ameaçada por causa de outras pessoas competentes. Respeita a capacidade dos outros por ajudarem a revelar a verdade que está um pouco presente em cada ideologia. Gandhi disse: “A verdade é uma só mas há muitas faces como um diamante”.
Jesus disse a João: “Não o proibais, pois ninguém faz milagres em meu nome para depois falar mal de mim. Quem não é contra nós é a nosso favor”. A resposta ajuda a ver mais longe, a curar a miopia dos próprios interesses e as medidas padronizadas de avaliação das pessoas, das raças ou crenças. Faz-se necessário abrir as janelas do coração para acolher quem é diferente de nós, quem não pertence oficialmente ao meu grupo, “aos nossos”, ou “não nos segue”. O bem deve ser reconhecido independentemente de quem o faça e da sua dimensão.
Para aprofundar e fazer compreender melhor o seu posicionamento Jesus constrói uma reflexão relacionando pequeninos-escândalo. Os pequeninos são os mais frágeis, inseguros e dependentes. Eles precisam de mais auxílio. Precisam de uma mão que os sustente, de olhos para serem guiados na escuridão e de pés para sustentá-los nos passos hesitantes.
A atitude dos apóstolos de proibir aquele que “não nos segue” se torna uma oportunidade para Jesus ensinar. Eles estavam se preparando para liderar, para dispor das suas mãos, olhos e pés aos pequeninos; mas a atitude tomada revelou um agir sectário, um olhar míope e um caminhar ao precipício, enfim um escândalo. A recomendação de Jesus é forte e disse que o mal deve ser “cortado pela raiz”. Pensamentos e atitudes que levam a escandalizar os pequeninos não podem ser tolerados.
A orientação de Jesus evitou que os apóstolos se tornassem um grupo sectário e intolerante. Realizaram depois a missão indo ao encontro de diferentes povos e regiões.