Tramita no STF a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 6.852. Com julgamento marcado originariamente para os dias 12 a 22 deste mês, o feito foi retirado de pauta, após pedido de vista pelo Min. Alexandre Moraes, não havendo previsão para a ação voltar à pauta. Nela, a Procuradoria Geral da República busca a declaração de inconstitucionalidade da Lei Complementar 80/94, que garante à Defensoria Pública o poder de requisitar de autoridade pública e de seus agentes exames, certidões perícias, vistorias, diligências, processos, documentos, informações, esclarecimentos e providências necessárias ao exercício de suas atribuições.
Poder-se-ia dizer que se trata de uma piada de mal gosto ou grande equívoco informativo. Infelizmente, não é.
A verdade é que, em meio a pior crise sanitária-econômica-política dos tempos modernos, a PGR, órgão máximo do Ministério Público, luta pelo enfraquecimento da Defensoria Pública.
Para a PGR, as prerrogativas da DP subtraem a apreciação judicial de determinados atos e ferem a paridade de armas com a advocacia privada.
Todavia, a LC 80/94 nem de longe pretendeu afastar a necessidade de judicializar determinados casos e tampouco intentou desiquilibrar a relação com a advocacia privada, quando o caso se dá no ambiente privado, em que defensores públicos e advogados particulares atuam representando as partes em polos opostos.
Evidente que, quando a atuação transitar no âmbito privado, a atuação da DP e da advocacia privada passará pelo crivo judicial e obedecerá a igualdade de condições.
O foco da LC 80/94 é outro. As prerrogativas nela estabelecidas dizem respeito a casos de ordem pública e a vulnerabilidades que extrapolam a mera questão econômica, atingindo o conceito de hipossuficiência no seu sentido mais amplo, em que os assistidos, no mais das vezes, sequer possuem uma certidão de nascimento ou demais documentos mínimos para o acesso à assistência jurídica.
Isto é, o poder de requisição questionado na ADI 6.852/DF nada mais é do que o instrumento pelo qual se efetivam as garantias básicas da pessoa humana, sobretudo daqueles que há muito ou desde sempre foram esquecidos pelo Estado.
Enquanto advogado, não pretendo a equiparação com a Defensoria Pública. Me preocupa, isso sim, o fortalecimento e o aparelhamento da Instituição que é a vez e a voz daqueles historicamente condenados à desigualdade e ao desamparo estatal.
É surreal imaginar que, em um País de tantas desigualdades, no qual as pessoas não possuem o acesso mínimo à educação, saúde, saneamento básico e ao trabalho, o Ministério Público, como fiscal da Lei, esteja preocupado em retirar poderes daquela Instituição que é a tábua de salvação dos vulneráveis.
Num País em que até os ossos, antes descartados, foram precificados e servem de alimento, o que tem tirado o sono da PGR é o poder da Defensoria em representar com eficiência os mais desprovidos. A quem interessa uma Defensoria apequenada e limitada?
É momento da advocacia, da comunidade jurídica e da sociedade geral dizer NÃO à ADI 6.852/DF! Diante de tanta tragédia, dor e miséria, o que não precisamos é a morte de uma das mais valiosas Instituições do Estado Democrático de Direito!
José Paulo Schneider
Mestre em Direito
Pós Graduado em Direito Penal e Processo Penal
Advogado Criminalista