OPINIÃO

O dilema de Monty Hall e a estupidez humana

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O dilema (também referenciado como desafio, problema ou paradoxo) de Monty Hall, especialmente depois do episódio que envolveu Marilyn vos Savant, se presta para ilustrar tanto as nossas falhas de cognição para lidar com a matemática das probabilidades quanto para mostrar que preconceitos e arrogância machista podem levar pessoas, supostamente inteligentes e bem-tituladas, a protagonizar papeis ridículos.

O programa Let`s Make a Deal (Vamos Fazer um Trato), comandado pelo apresentador Monty Hall, marcou época na televisão dos EUA, entre 1963 e 1990. Chegou ao Brasil em versões adaptadas por Silvio Santos e seguidores. Era uma espécie de jogo que o participante é posto diante de três portas. Atrás de uma delas é colocado um carro. Nas outras, duas cabras. O participante escolhe uma porta. Digamos, a Porta número 1. Para aumentar o suspense, Monty Hall abre a Porta número 3 e aparece uma cabra. Para aumentar mais ainda o suspense, Monty oferece ao participante a chance de trocar a porta escolhida. E agora? O participante deve ficar com a Porta 1 ou aceitar a oferta de Monty e trocar para a Porta 2? Que você faria?

Essa questão foi posta, em 1990, para a escritora Marilyn vos Savant, que assinava a coluna Ask Marilyn (Pergunte a Marilyn) na revista Parade, encartada nas edições dominicais de centenas de jornais americanos. A resposta de Marilyn foi simples e direta: sim, o participante deveria trocar. A probabilidade de o carro estar atrás da Porta 2 era de duas em três, em vez de uma em três para a Porta 1. Mas, para surpresa geral, a resposta de Marilyn não foi aceita com naturalidade. A revista Parade recebeu 10 mil cartas. Cerca de mil delas assinadas por pessoas com titulações de PhD, em matemática e estatística, que diziam que ela estava errada. Falhas cognitivas ou preconceitos?

Impossível entender o caso, se dissociar do nome Marilyn vos Savant. A colunista, mulher bonita, comunicativa, bem-articulada, considerada a “pessoa mais inteligente do mundo”, por causa do seu QI (228), registrado no Guinness Book of World Records, celebridade da época, que escrevia numa revista de amenidades, despertou a ira de vetustos catedráticos com PhD, que, sem

piedade, não a pouparam. Doze deles (alguns membros da Sociedade Americana de Matemática), para infelicidade, tiveram as suas cartas publicadas nas edições de Parade de 2 de dezembro de 1990 e 17 de fevereiro de 1991. Nelas, coisas como: “Você errou feio! Quer você troque de escolha, quer não, a probabilidade é a mesma. Já existe analfabetismo em quantidade suficiente nesse pais, e não precisamos que o QI mais alto do mundo o propague ainda mais. Vergonha! ”; “Pode ser que as mulheres encarem os problemas de matemática de modo diferente dos homens. ”; “Você é a cabra! ”; e outras tantas desse mesmo naipe, carregadas de preconceitos machistas e academicismo elitista.

Houve também a dúvida se Marilyn vos Savant foi original ou conhecia a resposta? Questão similar, denominada de o problema dos Três Prisioneiros, havida sido elaborada pelo matemático recreativo Martin Gardner (1959), e, chamada, inclusive, de Monty Hall, pelo estatístico Steven Selvin (1975). Será que Marilyn conhecia o teorema de Thomas Bayes (usado para o cálculo da probabilidade de um evento dado que outro evento já ocorreu)?

A maioria das pessoas, para se poupar de frustração, tende a manter a escolha inicial. Mas, deveria trocar. As chances de ganhar o carro dobram, no caso de troca: saem de 1/3 (inicial) para 2/3 (depois da troca). Isso não significa que ganharão sempre que fizerem a troca. Mas ganharão mais vezes do que se não trocarem. Ao cabo, Marilyn venceu, os PhDs cederam e acataram a resposta dela. Inclusive, Paul Erdös, o famoso matemático húngaro, que, ao ser confrontado com a questão, em 1995, ficou irritado, dizendo que não fazia diferença trocar de porta, depois de analisar diversas simulações de Monte Carlo, reconheceu que a resposta de Marilyn era correta.

Não corra riscos desnecessários, quase sempre induzidos por preconceitos. Lembre-se de Richard Feynman, que dizia que a resposta para a maioria das perguntas é fácil: Eu não sei!


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