OPINIÃO

O poeta Luis Lopes de Souza

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Um poeta, para ser merecedor do epíteto gauchesco, não precisa ter nascido na emblemática região pampiana, que abrange territórios do Brasil, da Argentina e do Uruguai, e nem ter sido criado repontando gado e amanunciando cavalos. Sensibilidade, talento e estudo são ingredientes mais do que suficientes. A poesia gauchesca, tal qual conhecemos, não é, necessariamente, uma derivação desse “ideotipo”, um ser quase mitológico, que, pela literatura ficcional, convencionamos chamar de “gaúcho”.

O caráter urbano e a civilidade de Porto Alegre, por exemplo, não foram menos importantes do que a vivência rural para a criação de belas poesias gauchescas. Algo assim havia se passado na região do Prata, cujo modelo de poesia gauchesca local se atribui a Bartolomé Hidalgo, um barbeiro de Montevidéu, que, dizem, foi o descobridor da entonação do “gaucho”. O Movimento Tradicionalista Gaúcho, tal qual conhecemos atualmente, foi forjado pelo grupo de jovens que, capitaneados por Paixão Côrtes e Barbosa Lessa, fundaram, em 1948, na capital do Estado, o “35” Centro de Tradições Gaúchas. A criação do “35” foi uma espécie de “marco zero”. Tiveram de inventar quase tudo: a Semana Farroupilha, a Chama Crioula, canções regionalistas (o Carreteiro, o Negrinho do Pastoreio e o Quero-Quero, de Barbosa Lessa) e até palavras como “pilchado”, para designar o homem urbano vestido à gaúcha. E, como o repertório poético para as tertúlias semanais era mínimo, esses jovens, cansados de ver o “Chimarrão”, do companheiro Glaucus Saraiva, ficar lavado de tanto ser repetido – Amargo doce que eu sorvo / Num beijo em lábios de prata. / Tens o perfume da mata (...) – resolveram organizar uma antologia de poesia crioula. Foi esse “livrinho”, muito usado pelos noveis CTGs, que serviu de modelo, ao redor dos simbólicos fogos-de-chão, para desabrochar a nova geração de poetas gauchescos.

Luis Lopes de Souza é natural de Laranjeiras, distrito de Marau. Não é um pampiano por origem. Não foi criado em fazendas, mas, sim, lidando com a terra, em uma região típica de colonização italiana. E, não obstante, é um aclamado poeta gauchesco. Os seus poemas estão publicados em livros, próprios e antologias, e gravados em discos. É poeta premiado em festivais e em rodeios: bicampeão do Concurso de Poesias Inéditas do Rodeio Internacional de Vacaria. Além de ser avaliador dos principais festivais de poesia gauchesca do Rio Grande do Sul. E integrar a Estância da Poesia Crioula de Porto Alegre e ser membro da Academia Passo-Fundense de Letras.

Então, como entender um poeta gauchesco como Luis Lopes de Souza? Elementar, talento inato para poetizar e influência explícita de grandes mestres. Difícil não perceber que os versos desse poeta marauense, radicado em Passo Fundo desde 1990, guardam traços da pena de nomes como Aureliano de Figueiredo Pinto (1898-1959) – “Esse tobiano da Estância / foi o bicho mais maleva / que o Diabo inventou pra um peão!” (...) –, Apparício Silva Rillo (1931-1995) – “Naqueles tempos, sim / Naqueles tempos as casas já nasciam velhas / Eram umas casas cálidas, solenes / Sob as telhas portuguesas, maternais” (...), ou Jayme Caetano Braun (1924-1999) – “A um bochincho certa feita / Fui chegando de curioso / Que o vício é que nem sarnoso / Nunca para nem se ajeita” (...). E, na relação, quase filial, que manteve com Tenebro dos Santos Moura (1906-1994) – “Reuniram-se em ti os encantos / Das chinas todas que tive” (...), com quem, assumidamente, ele aprendeu muito.

Luis Lopes de Souza, poeta e advogado, é autor de quatro livros: Retorno (1989); Prece (1995); Do canto rude dos loucos (2015); e No sarau dos meus fantasmas (2022). Apesar da temática gauchesca, xucra ou crioula, que é comum a todos os seus poemas, há notória ascensão do poeta, acompanhando a evolução do ser humano, a cada nova obra.

Deleitem-se com os versos de Luís Lopes de Souza. Dos poemas, No sarau dos meus fantasmas, que dá título ao livro de 2022: “Voltei da boca do inferno / já nem sei se sou humano...!” (...); de Prólogo dos versos que ainda não fiz: “"Me gusta" de um verso livre... / Velhas primícias prosaicas / desprovidas de resumo” (...); de Casmurro: “Hoje a inquietude me perturba / numa ressaca de incertezas e medo...”; de Maria... A louca: “Todo o pago conhecia, / a louca, chamavam.../ mas seu nome, qual seria?” (...); e, confessadamente, os preferidos do poeta, de, Nos tempos em que eu escrevia: “Nos tempos em que eu escrevia.../ Meus versos cruzavam raros / por entre réstias e sombras / de um povoado imaginário.../ os lampiões esmaecidos / escondiam os gemidos / entre o mutismo e o medo, / se apagando nos segredos / dos romances proibidos....” (...).

Os poemas de Luis Lopes de Souza são para serem lidos e, acima de tudo, ouvidos. As reticências milimetricamente projetadas dão o ritmo das pausas ao declamador. Imagine os versos que dão forma a esse livro, “No sarau dos meus fantasmas”, na voz do saudoso Marco Aurélio Campos (1942-1997), “O Boca”, amadrinhados por solos de violão de Glênio Fagundes ou Lucio Yanel, e deixe que a emoção tome conta da sua alma de poeta.

Luis Lopes de Souza, eis o POETA, cujos versos gauchescos que escreveu, seguindo a magistral ironia de Jorge Luis Borges, diferente do que sói acontecer, NÃO nos deixam com a sensação de termos lido livros escritos por astrônomos que nunca olharam para as estrelas.

Odir Lopes de Souza (pai, in memoriam), Maria Almeida de Souza (mãe), José Ironi, Dirceu, Margarte, Lorizete e Marinês (irmãos), Carolina (filha) e Miriam (mulher), sintam-se orgulhosos desse POETA!

P.S.: originalmente publicado em 24/02/2022.

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