OPINIÃO

Jerônimo Coelho, 377

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Jerônimo Coelho, 377

Vinte e um anos depois, em julho de 2022, eis que me vejo repetindo a mesma cena, em frente do número 377, da Rua Jerônimo Coelho, no Centro Histórico de Porto Alegre. Tal qual fizera, em julho de 2001 (relato em O NACIONAL, página 10, edição de 23 de julho de 2001), no início da manhã, aciono a campainha da Livraria Erico Verissimo, loja especializada em livros novos, usados e raros. Uma senhora simpática, a mesma senhora de 2001, vem abrir a porta e pergunta se procuro algo especial. Como de costume, neste tipo de estabelecimento, informo que busco obras sobre meteorologia e climatologia.

A senhora se afasta, enquanto eu me distraio apreciando a coleção de relógios antigos que ornamentam o local. Instantes depois, ela reapareceu trazendo na mão o livro Meteorologia Brasileira, de Joaquim de Sampaio Ferraz, 2ª edição, 590 páginas, publicado em 1945 pela Companhia Editora Nacional. Até aqui, nada excepcional, não fosse pelo fato que, em 2001, a mesma senhora, ato continuo à cena reprisada em 2022, havia retornado com o volume 1 do livro “Instrucções Meteorologicas (Trabalho destinado aos estacionários da rêde meteorologica do Brazil)” (sic), de Joaquim de Sampaio Ferraz, que havia sido publicado, em 1914, em Bruxelas. Casualidade? Talvez. Mas não há como ignorar que, para um autor que, no formato de livro, escreveu apenas esses dois títulos, a probabilidade desse acontecimento, embora não sendo nula, não pode ser considerada elevada. Desnecessário dizer, mas, nas respectivas ocasiões, adquiri os dois títulos que me foram oferecidos.

Os dias foram passando e, enquanto lia partes do livro Meteorologia Brasileira, o acontecido me intrigava. Afinal, eu tinha noção quem fora Joaquim de Sampaio Ferraz. O pioneiro das cartas sinóticas e das previsões de tempo no Brasil. Inclusive, em 1998, durante estada no Rio de Janeiro, junto com o colega João Carlos Haas, fomos até a sede do Jornal do Commercio, na Rua do Livramento, 203, onde funcionou a revista O Cruzeiro, para tentar, em vão, resgatar uma cópia do artigo “Previsão do Tempo”, que Sampaio Ferraz havia publicado, em 1913, naquele periódico. Mas, será que eu sabia mesmo quem fora Joaquim de Sampaio Ferraz? Não, evidentemente que não. E isso eu fui tratar de descobrir.

A dissertação de mestrado da museóloga Solange de Sampaio Godoy, defendida pela PUC-Rio, em 2005, e compilada no livro O Avô do Tempo – Diário de um Meteorologista (edição da autora, Rio de Janeiro, 2009, 156 p.), é a melhor e mais completa fonte sobre o homem Joaquim de Sampaio Ferraz. Solange Godoy é neta de Joaquim e, para produzir este trabalho, se debruçou sobre os diários escritos por ele durante a maior parte da vida.

Na obra de Solange Godoy sobressai-se um Joaquim de Sampaio Ferraz algo diferente do renomado meteorologista brasileiro. Um homem reconstruído a partir das metódicas notas dos seus diários, escritas entre 1900 e 1966 (com destaque para o período 1900 a 1940). Foram 32 volumes (pela numeração), dos quais restaram 28, contabilizando mais de seis mil páginas manuscritas, preservados pela fila Haydée Marcondes Godoy, mãe de Solange. Ficou patente um Sampaio Ferraz lapidário de si mesmo e centralizador da vida familiar (aos 60 anos, pousou para fotografia, de terno e gravata, e deu cópias do retrato oficial do chefe da família para todos os filhos). O seu diário é esclarecedor, segundo Solange Godoy, não apenas pelo que narra, mas pelo que cala. Era conservador na política e simpatizante do Integralismo. Um homem que construiu um personagem que pretendia ver perpetuado. Escrevia, com cuidado e até com certa autocensura, pois queira ser lido, na posteridade, e sabia que seria.

Sampaio Ferraz foi o iniciador das primeiras cartas sinóticas brasileiras e das previsões do tempo para o Rio de Janeiro, em 1915, que, a partir de 1917, passariam a ser divulgadas diariamente. E reivindicava essa primazia, como atesta a nota de rodapé, página 27, do livro Meteorologia Brasileira, na qual corrige o eminente antropólogo E. Roquette Pinto que, em ensaio de 1941, atribuiu os méritos desse feito a Enrique Morize, ignorando o precursor Américo Silvado e, especialmente, ele próprio.

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