A tensão entre Washington e Pequim foi abordada inúmeras vezes pela nossa coluna. São dois projetos de expansão global que se chocam, uma democracia e uma autocracia. Do ponto de vista econômico, a China tem se debruçado em seu programa de projeção global, denominado Belt and Road Initiative, no qual vem praticamente “comprando” os países do terceiro mundo, incluindo os latino-americanos. Do ponto de vista militar, a China tem investido muito nas suas forças armadas, já possuindo uma marinha de guerra maior que a americana. Desenvolve um projeto nuclear acelerado, com a construção rápida de silos de armazenamento. No aspecto do Mar do Sul da China, ela vem projetando a sua marinha para águas internacionais, reivindicando a totalidade do mar, em conflito com os países ribeirinhos. Não bastasse isso, ainda há a incógnita de Taiwan, onde Pequim tem realizado grandes exercícios militares, em um possível prenúncio de anexação. No campo tecnológico, há uma verdadeira “Guerra Fria” entre Washington e Pequim, principalmente no 5G. Do ponto de vista diplomático, há uma tensão considerável, visto o Secretário de Estado, Antony Blinken, ter cancelado a visita oficial que faria à China, devido ao balão espião chinês. Recentemente, como trouxemos aqui, outro escândalo de espionagem surgiu com a descoberta de que a China estaria usando empresas de fachada para espionagem de seus cidadãos residentes nos EUA.
O balão chinês
No meio de toda essa tensão, surgiu o balão espião chinês, que adentrou no espaço aéreo americano no dia 28 de janeiro até 4 de fevereiro, quando foi abatido por um míssil de um caça F-22, na Carolina do Sul, no Oceano Atlântico. Há uma forte crítica na demora em que Biden levou para tomar a decisão de abater o balão, permitindo que ele sobrevoasse longamente o território americano, passando inclusive por armamentos nucleares estratégicos, muito provavelmente coletando inteligência. A narrativa de Pequim dava conta de que se tratava de um balão meteorológico desgovernado, em que pese as autoridades da inteligência americana acreditassem que ele estava sendo deliberadamente dirigido, pelo curso que seguiu.
Um teste político-militar
A reação chinesa foi de protesto e insatisfação, pela derrubada do equipamento. Todavia, Pequim empreendeu uma espécie de teste político-militar, justamente para se verificar qual seria a resposta americana e o tempo de ação. Henry Kissinger costumava salientar que em jogos de tabuleiro, os EUA estão acostumados com o xadrez, que visa xeque-mate e a China, com o Wei Qi, o jogo das peças circundantes. E o balão era uma dessas peças, capaz de testar os ânimos de Biden. O recado que o balão trouxe está ligado diretamente com Taiwan e até mesmo as Filipinas (onde os EUA irão instalar novas bases militares). Pequim, simbolicamente, deu o recado para que os EUA não se aproximem do seu entorno estratégico, por mais que isso seja inevitável. Um balão certamente não fará uma guerra, mas foi o suficiente para aumentar, ainda mais, as tensões entre as potências. Tudo dependerá do desdobramento em Taiwan e, também, no Mar do Sul da China, dois assets estratégicos para a projeção global chinesa, dos quais os EUA não permanecerão distantes, como provam as suas últimas ações.