OPINIÃO

Elo de compaixão

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Os terremotos, maremotos, furacões, enchentes, raios, incêndios indômitos, a seca, e o sol severamente causticante, são fenômenos que abalam a criação, os seres vivos, as civilizações desde os tempos mais remotos. Estamos vendo e sentindo tudo isso, de existência frágil e a morte inexorável que ronda cada segundo de todos nós. Somos seres impotentes individualmente. Há, no entanto, um sinal de vida, pelo tempo que nos couber a cada um, capaz de se tornar forma de resistência. É a compaixão, no sentido de partilha originária da mente humana, ou da alma, para os que creem na sua coexistência. Desde os primórdios da cooperação humana as pessoas se juntavam para temer o trovão e dele se protegerem. O imaginário humano dava seus primeiros passos que o diferenciavam dos animais ditos irracionais atribuindo fenômenos severos da natureza à manifestação divina. A catástrofe ainda é vista como ira divina; as bonanças e riquezas, resultado do bom humor do criador. A crença, religião, ou negação de tudo isso, acompanha a história humana, segundo a segundo. Então, com todas as agruras da vida, a humanidade acendeu centelhas de compaixão, a capacidade de criar elos solidários, que ressurgem do esmorecimento, quando o clamor da dor social agrava profundamente as relações de sobrevivência. É a grande utopia.   


Desastre da omissão

A apologia da ganância continua pautando as guerras entre nações. Mais do que a honradez que aparentava gerir os embates de gerações antigas, cada vez mais é a avidez da riqueza material que autoriza ódio alucinante. A guerra já não se fundamenta em valores, mas se concentra no único valor financeiro. Desprezo à vida. É o império monetário que dita o movimento de forças. Os formatos são os mais variados. O cotejo do poder afasta comportamento comunitário e ataca o meio ambiente. A pessoa humana como centro dos ideais de cooperação, sucumbe na hora da catástrofe, pela falta de cautelas perante a violência dos fenômenos naturais. Logicamente que nada se pode fazer para conter o atrito gigantesco entre placas tectônicas que produziram o abalo sísmico na Síria e Turquia. As políticas públicas, no entanto, devem ser geridas. Tanto é verdade que o governo turco está cobrando desdém de construtoras ou incorporadoras que não observaram recomendações às obras na região sujeita aos tremores. É lógico que a engenharia civil que investe e fatura em todos os mercados mundiais sabe que existem riscos maiores nos países abalados. O lucro exagerado desviou a qualidade das construções, que poderia reduzir o desastre e salvar vidas. Trata-se de omissão propositada para aumentar o lucros. É a ação hegemônica do pensamento oligárquico que fez da escravidão o terrível implante da exploração do trabalho e liberdade humana. Zygmunt Bauman comenta sobre os medos que nos afligem, “difíceis de compreender: porém mais aterradores ainda pelo sentimento de impotência que provocam”. A omissão de que falamos é o esquecimento premeditado de gestores no poder com a preferência às elites na prevenção. Sabem os donos do poder que o cuidados dos indivíduos da coletividade deveria obedecer a ordem de solidariedade. Mesmo arrecadando impostos elevados a relação redistributivas enxerga o segmento social que tem algumas condições. Então, as guerras, o negacionismo que exclui a vacinação em massa no combate à pandemia, a mesma omissão que está dizimando a população indígena em Roraima. A guerra civil da Síria drena recursos financeiros e de cooperação impedindo ações permanentes de salvamento de crianças, jovens e idosos, que permanecem por muito tempo sobre escombros do terremoto.


A missionária

No último dia 12 foi lembrado o covarde assassinato da missionária Dorothy Stang. Ela foi alvejada com seis tiros em Anapú, à queima-roupa, a 700 quilômetros de Belém. A missionária nascida nos EUA e naturalizada brasileira, religiosa da congregação do Notre Dame, atuava na organização das comunidades rurais pobres, defesa ambiental e resistência à opressão dos fazendeiros. No período bolsonarista, mais 111 pessoas foram mortas no conflito rural.

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