OPINIÃO

Hazards

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Têm palavras e expressões na língua inglesa que, apesar de terem um significado extremamente claro, são de difícil transposição para o português. Uma dessas é hazards, que mesmo pertencendo ao vocabulário técnico da meteorologia, pela sua importância e reflexos sociais e econômicos, deveria ser de domínio popular.

A dificuldade em encontrar a melhor tradução de hazards para o português não vem de hoje. Um dos mais importantes geógrafos brasileiros, o professor Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro, destacou, por exemplo, que um dos últimos seminários com os seus alunos de pós-graduação na USP, em 1985, terminou com uma grande discussão sobre qual o melhor termo para expressar climatic hazards no nosso idioma. O tema seria retomado por ele, em 1991, quando, dando por encerrada uma carreira de quatro décadas dedicadas à pesquisa e ao ensino universitário na Geografia, literalmente passou o bastão, sintetizando as suas contribuições no livro Clima e Excepcionalismo, publicado pela editora da UFSC.

Na categoria dos hazards incluem-se os chamados eventos naturais extremos. E esses vão desde os internos, caso dos sismos e vulcanismos, até os atmosféricos. Os últimos, pela maior frequência de ocorrência e a dimensão dos impactos, sem dúvida, são os mais importantes. Exemplos mais conhecidos: avalanchas (de neve), secas/estiagens, enchentes, geadas, granizadas, descargas elétricas, vendavais, tornados e ciclones tropicais (furacões, tufões etc.). Em comum, a interação natureza x sociedade. E as ações humanas, no que diz respeito às decisões e iniciativas que envolvem os riscos inerentes a esses fenômenos são fundamentais na caracterização dos hazards; mesmo que muitos deles tenham previsibilidade imperfeita, podendo ser antevistos apenas como probabilidades cujo tempo de ocorrência é desconhecido.

Retomando a questão inicial: melhor tradução em português para hazard. Talvez seja o caso de se buscar não a melhor palavra, mas a mais adequada ou a menos incompleta, considerando-se os aspectos fundamentais subjacentes a esses fenômenos e o comportamento humano diante deles. Uma das primeiras palavras que surge na mente da maioria das pessoas é azar. Mas essa não parece ser a melhor, embora além de caiporismo (má sorte ou infelicidade constante. A popular urucubaca) também tenha o significado de revés, fatalidade, desgraça, infortúnio, casualidade e acaso, que se enquadram bem com os fenômenos naturais anteriormente citados. E, sem esquecer ainda, o significado em linguagem de turfe, do azarão, aquele cavalo que vence uma corrida, porém não estava entre os favoritos.

Risco é uma outra palavra que contempla alguns aspectos dos hazards. É a preferida dos franceses. Não pode ser menosprezada, pois envolve uma forte componente antropogênica. E ainda mais se considerando que o mau uso da natureza aumenta a probabilidade de riscos. Este último aspecto está intimamente ligado ao conceito de hazard. Mas, também não é a melhor, pois contempla, além de perigo ou possibilidade de perigo, particularmente a questão de perda e a responsabilidade pelo dano (sentido jurídico).

Há quem, ouvindo falar em hazard, logo traduza dor desastre. Essa palavra, literalmente, implica em acidente calamitoso, especialmente o que ocorre de súbito e ocasionando grande dano ou prejuízo. Envolve ainda o aspecto funesto, de desgraça, de sinistro ou de fatalidade. A origem latina de desastre (des mais astrum), implicando em uma conjunção (des)favorável dos astros. Traz a ideia de malefício e implica em julgamento de valor, que nem sempre pode ser considerado totalmente verdadeiro. Todavia, é a partir de desastre que começa a surgir umas das melhores alternativas, entre as comumente usadas: acidente. Ela carrega implícito o significado de acontecimento casual, fortuito ou imprevisto. E, ainda, corresponde a acontecimento infeliz, casual ou não, e de que resulta ferimento, dano, estrago, prejuízo, avaria, ruína, destruição, mortes, podendo chegar até a categoria de desastre (calamidade, catástrofe ou cataclisma). Acidente, eis a tradução que nos aprece mais adequada.

Coluna originalmente publicada em 12/07/2007.

SUGESTÃO DO COLUNISTA: O livro “Ah! Essa estranha instituição chamada ciência” está disponível em versão Kindle na Amazon:

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