No caminho quaresmal rumo à Páscoa a liturgia dominical (1Samuel 16, 1-13; Salmo 22, Efésios 5,8-14 e João 9, 1-41) propõe o tema da luz. Cristo disse: “Eu sou a luz do mundo. Quem me segue, não caminha na escuridão, mas terá a luz da vida” (Jo 8,12). Jesus, ao passar, viu um homem cego de nascença e o cura. Este encontro e a cura se tornam uma oportunidade para Jesus dialogar com vários personagens, como também conduz seus interlocutores a verem a realidade com os olhos de Deus.
Os discípulos perguntam a Jesus se a cegueira daquele homem era fruto dos pecados “dele ou de seus pais”. A resposta é clara, “nem dele nem de seus pais”. A medicina atualmente afirma que há doenças que são consequências de hábitos alimentares e estilo de vida. Quem é conhecedor destas informações está ciente das possíveis consequências para a saúde. A ciência médica também reconhece que não conhece as causas de tantas outras doenças. O que fica evidente na resposta de Jesus que Deus não pune seus filhos com doenças. As doenças são parte da fragilidade do corpo humano e muitas delas não temos conhecimento das causas.
O texto bíblico fala dos “vizinhos e os que costumavam ver o cego”. Estes simplesmente constatam o acontecimento da cura, perguntam como aconteceu, mas não vão além. Este grupo representa aqueles que diante do mistério de Deus e das suas manifestações não se deixam interpelar, não fazem perguntas mais profundas. Se contentam com a curiosidade.
Depois entra em cena o grupo dos fariseus que interrogam o cego e seus pais, mas não creem em quem fez o milagre da cura. Eles representam os autossuficientes e se sentem autorizados a julgar e desprezar os outros. Creem que possuem a verdade e não tem mais nada a aprender, muito menos de um cego. A discussão com o cego curado termina com esta sentença: “Tu nasceste todo em pecado e estás nos ensinando?”
Os pais do cego também são interrogados sobre o filho e o acontecimento da cura. Eles creem em Jesus Cristo, mas não dão testemunho dele. Diante do medo imposto aos seguidores de Jesus, os pais do cego curado passam a responsabilidade para o filho porque “é maior de idade”. Eles representam tantas pessoas sensíveis, de bons sentimentos, mas sem coragem. As possíveis ameaças as fazem calar e recuar impedindo de fazer um bem maior.
Depois que o cego curado cumpriu o ritual prescrito, debater-se com vizinhos e conhecidos, passar pelo interrogatório dos fariseus, se reencontra com Jesus. No caminho penoso da cura sempre testemunhou quem o curou, mesmo não sabendo quem lhe tinha devolvido a vista. Afinal, um cego de nascença ver de novo, só pode ser milagre operado por quem vem de Deus. Ao final exclama: “Eu creio, Senhor!”
A cura da cegueira de nascimento se torna sinal para curar todas as formas de cegueira. “Eu vim a este mundo para exercer um julgamento, a fim de que os que não veem, vejam, e os que veem se tornem cegos”. Samuel foi alertado que na escolha do sucessor real deveria se orientar pelo critério divino, pois “o homem vê as aparências, mas o Senhor olha o coração”.
A carta aos Efésios torna ainda mais compreensível o tema. “Outrora éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor. Vivei como filhos da luz. E o fruto da luz chama-se: bondade, justiça, verdade. Discerni o que agrada ao Senhor. Não vos associeis às obras das trevas, que não levam a nada; antes, desmascarai-as”.