OPINIÃO

O nosso veranico de maio

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Quem nas plagas desse Rio Grande de São Pedro, outrora, ouviu falar nos chamados “veranicos de maio” pode achar estranho que, no centro do País, esse vocábulo seja usado com conotação diferente da nossa. Na atualidade, por influência das falas de meteorologistas nos veículos de comunicação e pela leitura de trabalhos de natureza técnica publicados, a expressão ganhou significado que não é o mesmo do originalmente usado no sul do Brasil.

O nosso veranico está estritamente ligado com temperatura. Nas regiões Sudeste e Centro-Oeste (e também do Nordeste, em menor escala), caracterizadas por possuírem uma estação seca e outra chuvosa (entre outubro e março, geralmente), a expressão veranico é usada para caracterizar períodos de dias sem chuva (10, 20 ou 30 dias) na época que, normalmente, deveria chover, podendo causar, com isso, impactos negativos especialmente na atividade agrícola.

No sul do Brasil, a partir do outono começam a entrar massas de ar frio sobre o continente, fazendo que, em algumas ocasiões, as temperaturas atinjam valores relativamente baixos, inclusive com formação e geadas. Acontece que, não raro, sucedendo a esses períodos de temperaturas baixas, observa-se um aumento gradativo da temperatura do ar, caracterizando uma condição de tempo peculiar para a época do ano. Nesses dias, quase sempre, predomina céu limpo e ventos fracos, que, com as temperaturas elevadas, constituem um arremedo de verão, embora fora de época. E, é bem provável, vem daí a denominação popular de veranico (um pequeno verão) para essa particular condição meteorológica.

Apesar de, nas regiões de maior altitude, no sul do País, os primeiros frios do ano, e até as primeiras geadas, acontecerem no começo do outono (final de março e abril), é a partir de maio que, efetivamente, entram as massas de ar polar mais intensas e o frio pode ser sentido mais intensivamente. Por isso, acredita-se que, com o aquecimento que ocorre após essas friagens, tenham sido popularizados esses períodos como “veranicos de maio”. De qualquer forma, por mais estranho que possa parecer, o “veranico de maio” pode acontecer também nos meses típicos de inverno. Por isso, não é nenhum sinal de loucura, alguém se referir ao “veranico de maio”, mesmo em pleno junho, julho ou agosto.

Também não somos originais no quesito veranico. Em alguns países europeus são comuns ocorrências similares, e que, por analogia, também acabam sendo chamados de veranicos ou de “Verão de São Martinho”. A referência a São Martinho decorre da sua observação mais frequente na primeira quinzena de novembro, próximo ao dia consagrado a esse santo (11 de novembro). Para nós, no Hemisfério Sul, essa época do ano na Europa, em termos de estão do ano, corresponderia ao meado de maio.

Nem todo aquecimento que ocorre entre maio e agosto é digno de merecer a denominação de veranico. O médico e meteorologista Floriano Peixoto Machado, no livro “Contribuição ao estudo do clima do Rio Grande do Sul”, publicado em 1950, apresentou alguns índices, gerados com base na série de observações meteorológicas de Porto Alegre, que devem ser considerados na caracterização de um veranico. São eles: (1) temperaturas máximas superiores a 25°C, (2) temperaturas mínimas superiores a 12°C, (3) duração mínima de quatro dias, (4) céu limpo ou com névoa e (5) calmaria ou ventos fracos.

Os tais veranicos sulinos são causados pelo domínio, nos citados meses, de massas de ar oriundas do centro de altas pressões do Oceano Atlântico. O Anticiclone do Atlântico, cuja posição média situa-se na latitude de 30° S, é o centro de origem de uma massa de ar tropical (quente e úmida) que invade o estado praticamente durante todo o ano. Todavia, nas outras épocas, em função do ar ambiente se encontrar normalmente aquecido, o seu efeito não é tão perceptível quanto o observado no período entre maio e agosto. A duração da atuação dessas massas sobre o continente, configurando períodos de veranico, pode variar de quatro a sete dias.

Ouso especular que, em anos de El Niño, por serem as temperaturas do ar, geralmente, mais elevadas, os nossos “veranicos de maio” são mais frequentes.

Em 2023, pelos critérios especificados por Floriano Peixoto Machado, não houve, ainda, “veranico de maio” em Passo Fundo, mas o ciclo de 4 dias, com mínimas superiores a 12 ºC e máximas acima de 25 ºC, pode ser completado nessa sexta-feira (26). E, assim, efetivamente, poderemos falar que vivemos o nosso primeiro “veranico de maio” do ano.

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