OPINIÃO

Estamos preparados para esperar El Niño?

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Sobre o fenômeno El Niño Oscilação Sul (ENOS), sobressaem-se certezas e incertezas. Não obstante, pelo que é sabido, atualmente, sobre o ENOS, o que não se justifica, seja em agricultura, defesa civil ou nas mais diversas atividades econômicas influenciadas pelo clima, é que, sob a proteção do manto das incertezas dos impactos, prevaleça, acima de qualquer outra atitude, a INAÇÃO.

Depois de 40 anos de convivência (desde o El Niño de 1982/83), conscientes pelo menos, com a variabilidade climática associada às fases (El Niño e La Niña) do fenômeno El Niño Oscilação Sul, não nos cabe mais alegar surpresas, ainda que não dissociadas de incertezas, do que podemos esperar, em termos de variabilidade climática extrema no sul do Brasil, em anos de La Niña e em anos de El Niño.

Indiscutível que, nos anos de La Niña chove menos no sul do Brasil (2021 e 2022 são bons exemplos) e nos anos de El Niño (1982, 1997 e 2015 corroboram essa assertiva) chove mais, especialmente na primavera (ainda que as outras estações do ano não estejam isentas desses mesmos impactos). Associados a esses tipos de variabilidade climática, consolidou-se, a partir da experiência, vivenciada ou não, no imaginário de muitos atores interessados, que, para a agricultura regional, os anos de La Niña são bons para o trigo (incluam-se os outros cultivos de inverno) e ruins para soja (idem para os outros cultivos de verão). E, os anos de El Niño não são bons (quando não prenúncios de quase trágicos) para o trigo, mas são excelentes para a soja. Situações que, pela interferência humana consciente, podem ser modificadas, uma vez que não devem, nunca, serem assumidas como definitivas (são probabilidades e gerenciáveis, desde que entendidas como riscos).

Entenda-se, vez por todas, que, saber lidar com as fases extremas do fenômeno ENOS, no caso da agricultura, envolve tanto estar preparado para a mitigação de efeitos adversos causados pelo clima, quanto saber aproveitar as condições ambientes favoráveis para os cultivos. As lições deixadas pelos eventos ENOS passados, nesse caso, não podem ser ignoradas, devendo, especialmente, no que diz respeito a lidar com adversidades, serem usadas para manter estado de atenção e vigilância sobre obstáculos que por ventura possam surgir durante a estação de crescimento dos cultivos. Não podemos mais aceitar, passivamente, a inabilidade para lidar com impactos adversos ou a incapacidade para capitalizar benefícios potenciais, quando uma condição ambiente favorável se avizinha.

Há padrões de variabilidade climática extrema no sul do Brasil que, apesar da variação interanual em magnitude, se reproduzem a cada El Niño e a cada La Niña. São eles: chove mais em anos de El Niño e chove menos em anos de La Niña. A nebulosidade tende a ser maior em anos de El Niño e menor em anos de La Niña. A densidade de fluxo de radiação solar e a duração do brilho solar costumam serem maiores nos anos de La Niña e menores nos anos de El Niño. As temperaturas do ar, em geral, podem ser consideradas amenas nos anos de La Niña, quando comparadas aos anos de El Niño. Os eventos de chuvas intensas são mais frequentes nos anos de El Niño do que nos de La Niña.

O fenômeno ENOS, caracterizado pela recorrência (ainda que aperiódica, alternando fases, quente/El Niño e fria/La Niña, em ciclos que podem variar de 2 a 7 anos) e pelo alto nível de incerteza dos impactos, possibilita que, a partir dos eventos passados, sejam extraídas lições que nos permitem lidar melhor com a variabilidade climática inerente às suas fases extremas (El Niño e La Niña). Atualmente, não cabe dúvidas, sabemos mais sobre o fenômeno ENOS, tanto em capacidade preditiva quanto sobre impactos, do que sabíamos nos anos 1980, quando, boa parte do mundo, tomada de surpresa, ouviu falar pela primeira vez em El Niño, diante da repercussão midiática que alcançou o evento ENOS de 1982/83 (o El Niño do século, cuja denominação, pela magnitude dos impactos globais, também seria dada ao El Niño de 1997/98).

El Niño, tudo indica, deverá dar o ar da sua graça no segundo semestre de 2023. Que estejamos preparados para esperá-lo!

SUGESTÃO DO COLUNISTA: O livro “Ah! Essa estranha instituição chamada ciência” está disponível em versão Kindle na Amazon: https://www.amazon.com.br/estranha-instituição-chamada-ciência-Borgelatria-ebook/dp/B09Q25Q8H8

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