OPINIÃO

LUZ NA CAVERNA Os livros iluminam nossa caverna e diminuem nossa cegueira.

Por
· 3 min de leitura
Você prefere ouvir essa matéria?
A- A+

CHINA (2) - um país pobre e um povo miserável

           A República Popular da China, fundada em 1949, nasceu como um dos países mais pobres do mundo. Naquele ano, quando Mao Tse-Tung chegou ao poder, o país estava dominado pela pobreza e devastado pela guerra. Embora a industrialização básica tenha sido alcançada na era de Mao (1949-1976), o povo chinês passou por terríveis privações e violência naquele período. Ao final da década de 1970, após a morte de Mao (1976), as elites políticas, lideradas por Deng Xiaoping, perceberam que, sem reformas que tirassem a China da estagnação econômica e o povo da miséria, a sociedade chinesa mergulhara no caos e na violência, e o governo perderia o apoio social necessário para permanecer no poder.

 

No Brasil, montadora de automóveis; na China, fábricas de bicicletas

           Ficou claro para as lideranças políticas, burocratas e profissionais que tinham de fazer reformas profundas para tirar o pais do atraso científico, tecnológico e da penúria econômica. Em 1960, por exemplo, enquanto a Volkswagen inaugurava uma montadora de automóveis no Brasil, a China produzia bicicletas. A propósito, o “Fusca” tornou-se um ícone para as gerações brasileiras de então. Não são poucos os jovens da época que, agora de cabelos brancos, tentam reviver as emoções passadas, comprando e reformando velhos Fuscas. O presidente Itamar Franco deveria fazer parte dessa geração saudosa. Entretanto, hoje, cerca de um terço dos automóveis fabricados no mundo são chineses.

 

Reformas na China: terapias de choque ou gradualismo experimental?

           As reformas eram inevitáveis. Mas, como fazê-las? Como promover crescimento e transformação preservando a coesão social? O passado histórico chinês mostra que o maior medo de suas elites e de seu povo sempre foi o caos e a desordem. Isabella Weber, economista alemã, no livro “Como a China escapou da terapia de choque: o debate da reforma de mercado”, publicado no Brasil em julho do ano passado, oferece uma análise das lutas intelectuais e políticas e do feroz debate sobre as reformas. As discussões giravam em torno das duas alternativas: aplicar uma terapia de choque ou promover reformas graduais. Venceram os que defendiam um “gradualismo experimental”. Ao mesmo tempo em que se liberavam determinados setores da economia, o Estado mantinha o controle dos preços estratégicos e das indústrias de base. Em síntese, os reformadores rejeitaram o que costumamos chamar de neoliberalismo, a ideia de que basta afastar o Estado para que o mercado regule o sistema produtivo e redistributivo.

 

Um jogo de Jenga

           Para entender o debate que se instalou na China, Isabella Weber usa uma metáfora: “enquanto a terapia de choque propunha derrubar toda a casa e construir uma nova do zero, a reforma chinesa procedia como um jogo de Jenga, em que foram removidos apenas aqueles blocos que podiam ser rearranjados sem comprometer a estabilidade do edifício como um todo”.

 

A mão visível do Estado introduziu a mão visível do mercado

           Enfim, o que aconteceu na China, dois séculos depois de Adam Smith publicar “A Riqueza das Nações”, demonstra que ele tinha razão quando escreveu que a melhor forma de promover a riqueza de uma nação é seguir “o sistema da liberdade natural”. E a lição dada pela China é a de que a mão invisível do mercado precisa da mão visível do Estado.

           O resultado desse processo reformista é impressionante. Desde 1980 o tamanho da economia chinesa foi multiplicado por impressionantes 42 vezes. O Banco Mundial estima que mais de 850 milhões de chineses saíram da pobreza. A China domina a fabricação de roupas, têxteis e eletrodomésticos. É também um gigante tecnológico. Enfim, a China tornou-se um notável exemplo histórico da genialidade de Adam Smth (1723-1790), “o escocês mais inteligente”. Escreveu ele, na obra fundadora da ciência econômica, “pouco se requer para levar um Estado da barbárie mais baixa para o mais alto grau de opulência, além da paz, impostos baixos e uma administração aceitável da justiça”.


Gostou? Compartilhe