A política internacional na época em que a Organização das Nações Unidas (ONU) foi criada, mais precisamente em 1945 com a Carta das Nações Unidas, assinada em São Francisco, a configuração geopolítica era muito distinta da atual. Terminava a Segunda Guerra Mundial e havia algum tipo de esperança relativa e residual de que guerras em larga escala não eclodiriam nos próximos anos. O Artigo 103 da Carta anunciava que “no caso de conflito entre as obrigações dos membros das Nações Unidas, em virtude da presente Carta e as obrigações resultantes de qualquer outro acordo internacional, prevalecerão as obrigações assumidas em virtude da presente Carta”, demonstrando que ela tinha alguma força na conjuntura internacional. Hoje já não tem mais. A ONU, enquanto foro multilateral, faliu.
Os entraves
O sistema ONU (todas as suas instituições) tornou-se uma grande central burocrática. Não se pode negar que, pontualmente, algumas iniciativas em termos de cooperação técnica foram e são benfazejas. O que está a se falar aqui é justamente o contorno de efetividade da ONU em lidar a partir de uma liderança internacional com as questões da guerra e da paz. A falência da ONU e o déficit de líderes com brios para encarar a realpolitik, incentivou Putin, por exemplo, a embarcar em uma aventura na Ucrânia ou até mesmo um caminho livre para terroristas do Hamas e o seu barbarismo anti civilizacional. Outra grande problemática é o Conselho de Segurança da ONU e o poder de veto. Com a presença da China e da própria Rússia no conselho, tudo que possa indicar uma resolução efetiva no caminho da paz, torna-se um obstáculo. Enquanto pesar a contradição entre as potências ocidentais e as autocracias, o Conselho de Segurança será apenas um grande entrave.
O episódio dos “infiltrados”
Parte significativa da falência da ONU enquanto organismo multilateral, se deu na conjuntura belicosa no Oriente Médio. Funcionários da Agência que provê assistência a refugiados palestinos estavam entre os terroristas do Hamas, no dia do ataque à Israel. O potencial explosivo do fato foi amortizado pela grande mídia e hoje nem se fala mais sobre o assunto, que deveria favorecer uma verdadeira revolução interna na ONU.
Conjuntura atual
A política internacional está imersa em um grande desafio. A narrativa nuclear retornou à cena, agora com contornos ainda mais perigosos que o da Guerra Fria, também impulsionada pelas novas tecnologias militares. Putin está com o caminho livre na Ucrânia e tem três vezes mais munições que o Ocidente. A questão no Oriente Médio está tomando uma escala significativa, com transbordamentos perigosos, a depender dos interesses da ditadura iraniana e de seus proxies. A ONU não tem mais estofo moral e efetividade coercitiva para mudar a conjuntura, ainda mais se os seus próprios funcionários estão na linha de frente juntamente com os terroristas do Hamas, contra a civilização. Por outro turno, Trump pode reequilibrar no futuro a ideia de superpotência americana, a substituir a fraqueza da ONU e o déficit de líderes no Ocidente, sem brios para lidar com a realpolitik. Enquanto isso, Macron busca se aventurar com Putin, colocando a Europa em um cenário de alto risco. A OTAN segue o mesmo caminho. A ONU, por seu turno, faliu. Estamos mergulhados à sorte das volições de líderes autocráticos.