O colecionador de emoções
COLEÇÃO DE PALAVRAS, eis um título irretocável e aparentemente adequado para um livro de poemas. Friso o “aparentemente adequado” e faço um convite à reflexão: seria COLEÇÃO DE PALAVRAS uma boa definição de poema? Não, indubitavelmente não! Ainda assim, esse título do livro de Pedro Du Bois, em minha opinião, continua merecedor do epiteto irretocável e adequado. Por quê? Tentar responder a essa indagação é a intenção do colunista. Oxalá isso seja alcançado!
Um verdadeiro poema não é uma mera coleção de palavras, embora as palavras sejam a matéria-prima que os POETAS usam para tecer versos. As palavras são apenas símbolos. Nada mais que símbolos, não raros mortos, quando isoladas ou, em certos casos, até mesmo incrustradas em versos bem rimados. A revelação da poesia oculta nas palavras usadas em versos é o trabalho que compete ao POETA.
O POETA não é um colecionador de palavras. Talvez essa seja uma boa definição para um dicionarista. O POETA, antes de tudo, é um colecionador de emoções. O verdadeiro POETA consegue expressar de formar singular e cabal, ao tocar na emotividade do leitor, aquilo que muito tentaram por outros meios, inclusive usando palavras, mas não conseguiram. As emoções estão escondidas nas palavras. E o dever do POETA é encontrá-las e deixá-las a descoberto, disponíveis aos olhos do leitor. Quando isso acontece, a verdadeira poesia é produzida e não apenas mais um poema.
Ninguém consegue ser POETA o tempo todo e nem todos os versos que produz virarão necessariamente poesia. Até porque isso não depende apenas do POETA, por mais hábil que ele seja. Para cada poema produzido, é travada uma espécie de diálogo intimo entre o POETA e o LEITOR, cujos versos ganham sentido não pelo significado das palavras, mas pela imaginação e pelas emoções que suscitam. Assim, para alguns leitores um poema pode não passar de uma coleção de palavras e para outros ganhar o status de coleção de emoções.
Pedro Du Bois é um singular versejador e POETA profícuo, como bem atesta a sua vasta produção literária. É um menestrel do verso livre. E nesse livro, COLEÇÃO DE PALAVRAS, ele segue fiel à tradição de produzir boa poesia, ao transformar, majoritariamente, uma coleção de palavras (poemas) em uma coleção de emoções (poesia). Com isso, justifica que, se a um prosador ficcionista basta ter fidelidade com a imaginação, ao POETA cabe ser fiel com a emoção. E Pedro Du Bois, em COLEÇÃO DE PALAVRAS, não ignora e nem deixa de lado essa obrigação do POETA. Pelo contrário, leva-a a sério ao extremo.
Cumpre a esse colunista o dever de honestidade com os futuros leitores do livro COLEÇÃO DE PALAVRAS: há poemas (coleção de palavras) e muita poesia (coleção e emoções) nesse livro, como, aliás, frise-se isso, sói acontecer em todo livro de poemas. Cada leitor, assim como eu fui, será tocado de forma diferente na sua emotividade pelos versos de Pedro Du Bois. Eu, entre tantos, à guisa de exemplo apenas, destaco como os meus versos preferidos os do poema ERRO (página 27): Recebo a encomenda não solicitada: abro a embalagem e surpreso encontro o objeto sonhado/ Comunico a não devolução do fato e a sua apropriação indébita: sou indevido proprietário. Que cada leitor pegue o seu significado para esses versos, que certamente será diferente do meu. E isso é poesia! Isso é emoção!
Que você, prezado leitor, encontre mais emoções do que palavras, nessa coleção de poemas de Pedro Du Bois. É o meu desejo!
Os parágrafos anteriores integram (parte) o prefácio do livro COLEÇÃO DE PALAVRAS, do poeta passo-fundense Pedro Du Bois, publicado em 2016, que tive o privilégio de assinar. Lamentavelmente, Pedro Du Bois não habita mais esse plano terrestre. Vitimado pelo vírus SARS-CoV-2, morreu, em Balneário Camboriú, no dia 6 de abril de 2021 (4 dias antes, em 2 de abril, acometida do mesmo mal havia falecido a esposa Tânia Du Bois).
Tânia e Pedro Du Bois, apesar de radicados em Balneário Camboriú, SC, vivenciaram, como poucos, a cena literária em Passo Fundo, nos últimos anos. Foram assíduos frequentadores das Jornadas Nacionais de Literatura, das Feiras do Livro, geralmente com lançamento de obras, dos eventos na Academia Passo-Fundense de Letras e incansáveis colaboradores do Projeto Passo Fundo de Apoio à Cultura.
Hoje à noite, quando o “velho” casarão da Avenida Brasil Oeste, 792, sede da Academia Passo-Fundense de Letras, abrir “a mais alta porta do Brasil” para, em sessão solene, dar início, oficialmente, ao ano acadêmico 2024, comemorar os 86 anos do Sodalício das letras locais (07/04/1938) e entregar a sua principal distinção honorífica, a Comenda do Mérito Cultural Sante Uberto Barbieri 2024, ao Sr. Prefeito Pedro Almeida, simbolicamente, como em tantas outras ocasiões similares, dois lugares da plateia estarão ocupados por Tânia e Pedro.
Nossos respeitos à memória de Tânia e Pedro Du Bois.
SUGESTÃO DO COLUNISTA: O livro “Ah! Essa estranha instituição chamada ciência” está disponível em versão Kindle na Amazon: https://www.amazon.com.br/estranha-instituição-chamada-ciência-Borgelatria-ebook/dp/B09Q25Q8H8